Debates
Não há futuro sem ferrovias
Da Redação | 11 de julho de 2025 - 01:14

Por Neivor Canton
Só um alienado não percebe o risco que paira sobre o grande
oeste catarinense. A cada ano, as agroindústrias locais – verdadeiros motores
do desenvolvimento regional – são obrigadas a buscar 6 milhões de toneladas de
milho no Brasil central para manter suas gigantescas cadeias produtivas de aves
e suínos. Essa operação logística, quase toda rodoviária, representa mais de
150 mil viagens de caminhões em um percurso de 2.200 quilômetros, com
custos que superam bilhões de reais anuais. Um fardo que ameaça a competitividade,
a sustentabilidade e até a permanência dessas indústrias em solo barriga-verde.
Enquanto o Brasil insiste em ser refém do rodoviarismo, o
mundo desenvolvido mostra o caminho: a multimodalidade. Lá, o transporte
rodoviário é utilizado para trajetos de até 500 quilômetros; para
distâncias maiores, prevalece o ferroviário. A diferença de custos entre os
dois modais chega a 50%. Em Santa Catarina, o quadro atual é ainda mais
dramático. Rodovias sobrecarregadas agravam o custo logístico e, na ponta,
reduzem margens, desestimulam investimentos e ameaçam empregos.
É preciso coragem para romper esse ciclo vicioso. Por isso,
a decisão do governador Jorginho Mello de articular lideranças dos quatro
Estados – Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – em
favor da Ferrovia Norte-Sul (Ferrosul) merece aplausos. A iniciativa é
estratégica e visionária. Trata-se de um projeto capaz de ligar polos de
produção e consumo, assegurando o abastecimento do imenso parque agroindustrial
do oeste catarinense com milho e soja, ao mesmo tempo em que escoa alimentos
industrializados para grandes centros urbanos e portos.
Não se trata de um capricho regional, mas de uma necessidade
nacional. O agronegócio brasileiro, responsável por cerca de 25% do PIB, não
pode ficar à mercê de uma matriz logística arcaica. A ausência de ferrovias não
só eleva os custos em 40% como também retira a competitividade das empresas do
oeste catarinense, forçando algumas a migrarem para o centro-oeste.
A Ferrovia Norte-Sul é a resposta. Com ela, o transporte de
milho, soja, farelo, fertilizantes e calcário será mais barato, mais ágil e
mais sustentável. A agroindústria catarinense deixará de temer o avanço da
fronteira agrícola para o centro-oeste, preservando a pujança de suas
cooperativas e empresas. Além disso, a ferrovia representará uma revolução
ambiental, com redução significativa de emissões de CO₂ e menor desgaste
das rodovias.
O Brasil precisa, urgentemente, repensar sua matriz de
transporte. Países com grandes extensões territoriais, como Estados Unidos e
China, já fizeram isso há décadas, priorizando as ferrovias e hidrovias. Aqui,
seguimos presos a um modelo rodoviário que, além de caro, é insustentável a
longo prazo.
Por outro lado, a “Ferrovia do Frango”, como foi apelidada a
ligação do oeste catarinense aos portos, é outra frente essencial. Aqui também
tem a mão do Governo do Estado que contratou o projeto do trecho Lages-Chapecó.
Custos elevados de transporte até o litoral significam redução de ganhos ou até
perda de mercados no exterior. Com a ferrovia, os alimentos produzidos no oeste
chegariam aos portos a custos até 5% menores, aumentando a competitividade e
abrindo novas oportunidades de negócios.
Transporte ágil e barato é fator de atração de
investimentos. É fator de desenvolvimento regional. É garantia de que o oeste
catarinense continuará a ser referência em produção de alimentos para o Brasil
e o mundo.
O governador Jorginho Mello acerta ao levantar essa
bandeira. Cabe agora às lideranças políticas, empresariais e cooperativistas
dos quatro Estados transformar essa visão em realidade. A
Ferrovia Norte-Sul não é apenas possível. É necessária. É estratégica. É
uma questão de sobrevivência para a agroindústria catarinense e para a
segurança alimentar do País.
O futuro nos cobra ação. E ele começa com trilhos.
Neivor Canton é presidente da Aurora Coop