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Coluna MSN: Cara de Escritor

“Ser fotografado é aceitar ser quem nós somos para os outros”

Miguel Sanches Neto é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa
Miguel Sanches Neto é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa -

Publicado por Camila Souza.

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Não tenho diploma de escritor. Não frequentei oficinas. Não pertenci a nenhum movimento literário. Então, o que encorajou o menino de origem rural a assumir estas credenciais? Lembro-me de um depoimento de Zélia Gattai em que ela diz que aprendeu tal arte datilografando os originais do marido, o baiano Jorge Amado. Quando ela apresentou o primeiro livro, foi automático. Esposa de escritor só podia ser escritora.

Publicar, no entanto, não faz ninguém escritor, e sim autor de livros. Esta é uma categoria à parte, própria daquele(a)s para quem ler e escrever são uma forma de existir. Um político, uma atriz ou um desportista podem assinar muitos títulos que nunca serão escritores, porque isso não é a essência deles.

Um dos processos que transforma socialmente um autor de livros em escritor se dá pela fotografia. O fotógrafo, quando bom, nos revela a nós mesmos e cria uma crença interior.

Venho da época das máquinas analógicas, quando era preciso gastar rolos de filme para chegar a uma imagem que, ao ser vista por uma pessoa desavisada, denunciava a função sem o auxílio de legendas. Muitas vezes, exagerávamos nas poses e nos cenários para não deixar dúvida de que, sim, pertencíamos a esse grupo. E com isso não se desperdiçava filme.

Mas as melhores fotos, tanto antes como hoje, são aquelas em que o modelo não se revela de cara. Assim que batemos o olho nelas já descobrimos a desorientação, a introspecção e certo desamparo, coisas que comumente se manifestam em quem se dedica à infinita tarefa de ler e escrever.

É possível afirmar que um conjunto de fotógrafos, ao longo de minha carreira, mostrou em mim o escritor.

Isso aconteceu pela primeira vez no jornal Gazeta do Povo, em 27 de janeiro de 1997. Apareço em um blazer cinza de lã, com remendo de cotovelo, calça jeans desbotada e larga, tênis Adidas branco, o pé direito e as costas apoiados contra uma parede velha do centro de Curitiba. O próprio estereótipo do intelectual. Hoje me componho de forma menos óbvia, mas sou grato àquele profissional anônimo (a foto não estava assinada) que me confirmou como escriba.

O autor é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa. No Instagram: sanchesnetomiguel; no Facebook (clique aqui) e no Twitter: @miguelsanchesnt.

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