Coluna Fragmentos: Aos 50 anos a bossa continua nova
A coluna ‘Fragmentos’, assinada pelo historiador Niltonci Batista Chaves, publicada entre 2007 e 2011, retorna como parte do projeto '200 Vezes PG', sendo publicada diariamente entre os dias 28 de fevereiro e 15 de setembro
Publicado: 28/04/2023, 09:00

O ano de 1955 marcou, para o Brasil, a chegada de Juscelino Kubitschek à presidência da República. Político conciliador, JK era bem visto tanto pelos setores conservadores como pelos progressistas da sociedade brasileira. Seu projeto desenvolvimentista fez o Brasil vislumbrar um futuro marcado pelo progresso econômico e pelo avanço social.
Foi nesse cenário, caracterizado por um otimismo generalizado e por uma liberdade de expressão nunca antes experimentada no país, que o Brasil viu nascer um dos seus mais ricos, importantes e conhecidos movimentos culturais: a Bossa Nova!
A expressão “bossa” apareceu pela primeira vez na música brasileira em 1932, no samba Coisas Nossas, de Noel Rosa (“o samba, a prontidão/e outras bossas/são nossas coisas”), e, desde então, essa palavra tornou-se uma gíria carioca que significa jeito ou maneira.
Se toda produção cultural reproduz a realidade social na qual é gerada, naqueles rápidos meados da década de 1950 havia um claro descompasso entre o ritmo cotidiano do Brasil, país que, no dizer de JK, pretendia “crescer 50 anos em 5” e os lentos boleros e sambas-canção que dominavam o nosso cancioneiro.
Foi nesse momento que jovens músicos cariocas, a maioria de classe média, passaram a se reunir para ouvir, discutir e produzir música. Desse grupo faziam parte figuras como Carlos Lyra, Roberto Menescal, Nara Leão, Billy Blanco, Ronaldo Bôscoli entre outros. Como a maioria era estudante universitário, foi nesse ambiente que começaram a ser tocadas as primeiras músicas produzidas por eles e denominadas, inicialmente, como “samba sessions”, uma referência à fusão entre o samba e o jazz, ritmos que se fundiram e deram origem ao que, pouco depois, recebeu a denominação de Bossa Nova.
Em 1958, um compacto (disco de vinil que trazia apenas uma música de cada lado) gravado pelo baiano João Gilberto e contendo Chega de Saudade, uma composição de Vinicius de Moraes e Tom Jobim, ganhou as paradas de sucesso no país e fez nascer a Bossa Nova como um movimento da Música Popular Brasileira.
Após ganhar o mundo e seduzir artistas como Sarah Vaughan, Frank Sinatra, Stan Getz e Ella Fitzgerald, nos anos 60 a Bossa Nova atingiu seu auge. Em meados daquela mesma década e já sentindo os impactos da política cultural da ditadura militar, a Bossa Nova ganhou novos contornos. Músicos como Francis Hime, Marcos Valle e Edu Lobo, influenciados pelo Centro Popular de Cultura da UNE, deram ao movimento uma roupagem popular e nacionalista e se aproximaram dos compositores do morro como Zé Keti, Cartola e Nelson Cavaquinho. Em 1966 Vinicius e Baden Powell lançaram o LP “Afro-Sambas”, um dos álbuns mais importantes não só da Bossa Nova, mas de toda história da Música Popular Brasileira.
Nesse mesmo período, com as novas condições históricas impostas pelos militares, outros movimentos, como a Jovem Guarda, ganharam espaço na produção cultural brasileira. A partir de então a Bossa Nova perdeu terreno. Contudo, não desapareceu enquanto proposta musical e continua influenciando a música brasileira até os dias atuais.
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O material original, com mais de 170 colunas, será republicado na íntegra e sem sofrer alterações. Por isso, buscando respeitar o teor histórico das publicações, o material apresentará elementos e discussões datadas por tratarem-se de produções com mais de uma década de lançamento. Além das republicações, mais de 20 colunas inéditas serão publicadas. Completando assim 200 publicações.
Publicada originalmente no dia 19 de outubro de 2008.
Coluna assinada por Niltonci Batista Chaves. Historiador. Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná.