Alguns textos adaptados de escritores que marcaram a história
Publicado: 22/06/2014, 04:01
Kafka: a porta da lei
Um homem que procura a justiça caminha até o Palácio da Lei. Diante da porta do palácio, um soldado monta a guarda.
Como o sentinela não lhe dirige uma palavra, o homem resolve esperar. Espera um dia, mas o guarda continua mudo.
“Se eu ficar por aqui, ele perceberá que eu quero entrar” pensa o homem. E ali permanece.
Passam-se dias, semanas, e anos inteiros. O homem continua diante da porta, e o sentinela continua montando guarda.
As décadas passam, o homem envelhece, e já não consegue mover-se. Finalmente, quando nota que a morte se aproxima, reúne suas últimas forças e pergunta ao guarda:
- Eu vim até aqui em busca de justiça. Por que você não me deixou entrar?
- Eu não lhe deixei? – responde surpreso, o sentinela. - Você nunca me disse o que estava fazendo aí! A porta estava aberta, bastava empurrá-la. Por que você não entrou?
Jorge Luis Borges: o grande mapa
Certo rei encomendou aos geógrafos um mapa do país. Mas exigiu que tal mapa fosse perfeito, com todos os detalhes.
Os geógrafos mediram todos os locais, e fizeram um rascunho. Um deles comentou que ainda faltavam detalhes de rios.
Resolveram refazer o desenho numa escala bem maior. Quando ficou pronto, o mapa estava do tamanho do primeiro andar de um edifício; mesmo assim, alguns conselheiros do rei argumentaram:
- Não dá para ver os caminhos nos bosques.
E os sábios geógrafos foram desenhando mapas cada vez maiores, com detalhes e mais detalhes do país.
Quando, finalmente, conseguiram o mapa perfeito, chamaram o rei e o levaram a um imenso deserto. Ali chegando, mostraram uma estranha tenda, que se estendia até o horizonte.
- O que é isso?
- O mapa do país – responderam os geógrafos. – Como quisemos fazê-lo o mais próximo da realidade, ele ficou tão grande que ocupa o deserto inteiro.
- O medo de errar, na maior parte das vezes, termina nos conduzindo ao próprio erro – comentou o rei. – O mapa é tão detalhado, que não serve para nada.
E mandou enforcar os geógrafos.
Machado de Assis: a linha e a agulha
A agulha passa por vários estágios de sofrimento até aprender sua função: o forno abrasador da metalúrgica, o frio intenso da água em que é temperada, o peso esmagador da prensa que a faz atingir sua forma ideal.
A partir daí, precisa estar sempre dura, brilhante, e afiada. Depois de todo este aprendizado, ela encontra sua razão de viver: a linha.
E faz o possível para ajudá-la: enfrenta os tecidos mais resistentes, abre os buracos nos locais certos. Mas, quando termina seu trabalho, a misteriosa mão da costureira torna a colocá-la em uma caixa escura; depois de tanto esforço, sua recompensa é a solidão.
Com a linha, entretanto, a história é diferente: a partir deste momento, passa a ir a todos os bailes e festas.