Crônicas dos Campos Gerais: ‘Contemplação’
O texto de hoje é de autoria de Dionezine de Fátima Navarro
Publicado: 18/06/2020, 12:20
O texto de hoje é de autoria de Dionezine de Fátima Navarro
Num atalho pelo Parque Ambiental da Princesa dos Campos, a singeleza me obrigou a parar e me encantar! E me fez balançar nas malhas do bucolismo. Lá no fundo, de uma Maria Fumaça parada no tempo da nostalgia pareciam descer passageiros que se recusavam a fazer parte do passado diante de tantos risos de crianças que brincavam em festa nas balanças e gangorras do parquinho. Como um arremate da moldura de uma obra de arte, um arco de flores cor-de-rosa às pencas, como uma cascata (chamam de sete léguas), parecia sondar um quero-quero...
Pássaro ora assustado, ora alçando voos rasantes em passantes distraídos. Ou ora pendurado numa perna só a admirar homens e mulheres, que, como caminhantes do agora, transitavam quase embriagados com os compromissos do cotidiano. Esses não tinham tempo ou talvez nem retinas para perceber o pequeno pássaro que ficava alguns minutos estático, parecendo observar o futuro. Dava alguns passinhos e trocava de perna. E lá se pendurava no outro pé e de novo contemplava o verde que o abraçava, como se fosse o manto do final de tarde. Parecia não querer ir embora e, se alguém conseguisse chegar perto dele, poderia até descobrir que estava de olhos fechados a sorver o vento que brincava com pétalas bailantes, que, num final de ciclo, se desprendiam das árvores a brindar o início do outono.
Tão quieto, parecia compreender que ali se iniciava uma festa da nova estação. E ele continuaria a fazer parte desse espetáculo. O manto verde do gramado em vitalidade era quase engolido pelo azul do céu que também desejava ser um cobertor para a noite que se aproximava. Pensei: será que, como eu, ele fica a imaginar a história de vida de cada um que passava por ali?
Histórias únicas e intransferíveis. Como ele, eu também não queria ir embora. A correria do cotidiano no final do dia boicotou meu nostálgico enlevo. Mas ainda dediquei alguns minutos a registrar uma foto com o pássaro intrigante, imaginando o que ele poderia “querer mais”, uma vez que ele já tinha o maior dos dons... O dom da contemplação”. Mesmo que seja... Contemplar numa perna só.
Texto escrito no âmbito do projeto Crônicas dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais.