Crônicas dos Campos Gerais: 'Tamancos imigrantes' | aRede
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Crônicas dos Campos Gerais: 'Tamancos imigrantes'

O texto de hoje é de autoria da professora Rosicler Antoniácomi Alves Gomes

Rosicler Antoniácomi formou-se em Letras pela UEPG, e lecionou Português e Inglês, após ter se aposentado do Banco do Brasil
Rosicler Antoniácomi formou-se em Letras pela UEPG, e lecionou Português e Inglês, após ter se aposentado do Banco do Brasil -

Da Redação

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O texto de hoje é de autoria da professora Rosicler Antoniácomi Alves Gomes

Nos tempos de meus avós, aprendemos a tirar os chinelos ao sair para o quintal (quando havia chinelos nos pés para tirar...), e colocar tamancos. Aqueles tamancos que os imigrantes italianos costumavam deixar ao lado de fora da porta, perto do raspapé. A sola era uma placa de madeira malemar talhada no formato do pé, com um naco de couro cru com as extremidades pregadas nas laterais, onde o metatarso se acomodava, ficando os dedos espremidos, às vezes, pois não eram confortáveis. Eram para o trabalho no quintal.  Antes de entrar em casa, o tamanco era trocado pelas alpargatas, que eram de lona, com solado de cordinhas trançadas e costuradas em caracol. Duravam a vida inteira. As pessoas compravam maior que o pé dois números. Para não ficar escapando do calcanhar, viravam pra dentro a carcanha (alguns chamavam assim a parte de trás do calçado) e as alpargatas viravam chinelos para sempre, pois ninguém se lembrava de desvirar a carcanha quando o pé crescia. Quando viam, já era o calcanhar que estava sobrando para fora da carcanha.

Eu lembro que tive um par de tamancos, quando criança. Foi um presente que eu... (pasmem!) havia pedido. Eu usava para fazer barulho na calçada de tijolos que circundava a casa. Não me lembro onde foi parar. Passou o interesse, eu não era requisitada para o trabalho no quintal... Sumiu! Devo ter perdido em algum atoleiro, na rua, quando a patrola passava para alisar os buracos, e ... batata! Chovia em cima. Quando cresci, algumas vezes ajudei no quintal. Passava os pés no primeiro par de tamancos estacionado perto do raspapé, e lá eu ia “morrer” de trabalhar no quintal. Ah! Raspapé é uma lâmina de ferro enfiada na terra, na qual as solas dos calçados eram esfregadas, para tirar a crosta de barro que o quintal perdia para elas. Sem quintal para virar a terra e plantar, sem tamancos, a vida se modernizando, perdi o hábito de trocar calçados de fora por chinelos de dentro.

Em tempos de Covid19 me atrapalho um pouco, mas estou me acostumando com a volta desse hábito antigo, para evitar de convidá-lo a entrar grudado nas solas dos sapatos de fora. Estou também usando tiara para não ter que ajeitar com a mão a franja teimosa (cabelo pode ser a mais próxima superfície para pouso do vírus, principalmente cabelo de baixinhos), que a todo o momento quer se fazer de importante, caindo na testa. Perdão. C-a-i-n-d-o na testa parece ser um toque de charme – tendo uma cãibra capilar, que creme de pentear nenhum ajeita.

Texto escrito no âmbito do projeto Crônicas dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais 

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