Debates
Dividir para dominar
Da Redação | 08 de abril de 2025 - 02:13

Por Mário Sérgio de Melo
Ao longo da história da humanidade vê-se a eficácia dessa
ancestral estratégia de dominação: dividir os povos a serem dominados, lançando
tribos contra tribos, povos contra povos, etnias contra etnias, religiões
contra religiões, culturas contra culturas, homens contra mulheres... Hoje, nações
contra nações, classes sociais contra classes sociais, ideologias contra
ideologias, até o clímax da cizânia, irmãos contra irmãos.
Há na índole humana teimosos resquícios do instinto de
competição e dominação, inerente à nossa natureza animal e ao princípio da
seleção natural. Mas desde que tomamos ciência de que somos competitivos, esse
traço primitivo é manipulado para dominar-nos. É assim para assanhar a ânsia de
consumo da civilização atual. Possuir é sobressair-se, faz íntima ligação entre
a posse de bens e a ostentação da supremacia dos dominadores. Tornamo-nos
consumidores compulsivos, à mercê de quem lucra com nossa compulsão. E, vítimas
da guerra cognitiva, competimos com nosso conterrâneo, nosso vizinho, nosso
irmão. Um instinto tão forte que nos cega para a compreensão de que, alhures,
alguém nos manipula – dividindo-nos, enfraquecendo-nos – enquanto nos controla
e nos explora.
A fraqueza que nos é incutida manifesta-se também na tibieza
do caráter. A guerra cognitiva é vitoriosa quando subjuga a mente do inimigo.
Implanta nela desinformação, negacionismo, segregação, medo, ódio, inaptidão
para refletir, discernir, dialogar, ter sensibilidade e empatia. Os subjugados
reagem como animais acuados.
Seremos capazes de quebrar esse ancestral arquétipo? De
perceber quantos fantasmas nos são imputados para que, amedrontados,
transformemos nosso próximo num inimigo visceral? Desde a cuca que vem pegar a
criança inquieta, monstro fictício inventado para assustá-la e controlá-la, até
o apregoado perigo, não menos fictício, da outra ideologia, da outra religião,
da outra cultura, são muitas maldosas criações para nos provocar medo, nos
dividir e dominar.
Dominação não é só de um país sobre outros, como temos visto
hoje com a ânsia estadunidense de submeter todo o mundo. Tão perversa e tão
global quanto ela é a dominação econômica, num arranjo onde uma elite usufrui
dos benefícios da riqueza produzida pelo trabalho de uma imensa maioria
excluída e empobrecida.
Todas as formas de dominação – territorial, cognitiva,
econômica, racial, de gênero – estão ligadas. São expressão do impulso
primitivo, agora manipulado por moderníssima tecnologia, com apurados métodos
científicos. Se quisermos escapar da dominação de quem nos divide, para alcançar
a emancipação e a liberdade pessoal, e a soberania de nosso País, é essencial
que deixemos de ter nossos instintos manipulados. Isso é possível, se
cultivarmos nossos princípios e convicções – nossa cultura – com mais força que
o nosso inimigo da guerra cognitiva que já nos foi declarada.
Nossa consciência é muito mais poderosa que esse inimigo estranho que quer nos dominar.
Mário Sérgio de Melo é Geólogo, professor aposentado do
Departamento de Geociências da UEPG