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Copa do Mundo: como fica o trabalho durante os jogos? Tire agora suas dúvidas!
Da Redação | 19 de novembro de 2022 - 00:08

Por Rodolfo Carlos Weigand Neto e Gleice Domingues de Souza
Brasil, o país do futebol! Alguém tem dúvida disso? Pois
bem... Mesmo após um período eleitoral bastante conturbado, com a proximidade
do início dos jogos da Copa do Mundo, todos começam a entrar nesse espírito e
ansiar pelo festejo promovido nas reuniões com amigos e familiares para
acompanhamento dos jogos da seleção.
Ocorre que muitos destes jogos são realizados durante a
jornada de trabalho, sendo comum em nosso país que as empresas flexibilizem
seus horários para permitir que os empregados acompanhem os mesmos.
A Copa do Mundo no Catar não será diferente. O primeiro jogo
do Brasil (contra a Sérvia) ocorrerá no dia 24 de novembro, às 16h00. E o mesmo
ocorrerá com os demais jogos da primeira fase, que também serão transmitidos
nos horários considerados “comerciais”.
Com isso, surgem diversos questionamentos: como, por
exemplo, se os empregados devem ser liberados para assistirem os jogos, ou se
após o fim da partida são obrigados a retornar imediatamente ao trabalho e as
possíveis consequências para os colaboradores que descumprirem eventuais
determinações de seu empregador.
Para responder essas perguntas, precisamos partir do
princípio que a legislação trabalhista brasileira nada disciplina quanto ao
tema, ficando ao crivo das empresas ajustarem tais regras com os seus
colaboradores, observando as diretrizes gerais das normas trabalhistas.
Nesse contexto, não há nenhuma normativa que obrigue as
empresas a permitirem que seus colaboradores deixem seus postos de serviço para
assistirem aos jogos da seleção, ou que não retornem mais ao trabalho para
esticarem no "happy hour", uma vez que é considerado feriado
apenas os dias definidos como tal por meio de lei ou decreto.
Por outro lado, considerando o aspecto cultural envolvendo a
questão, é de vital importância que o empregador deixe claro aos empregados
quais serão as regras que permearão o trabalho em tais dias, ou seja, os
horários permitidos de paralização das atividades, horários de retorno ao
trabalho, eventuais limites de tolerância, se será permitido retornar ao seu
posto após o consumo moderado de bebida alcoólica, etc.
Tudo isso deve ficar claro pelos canais já utilizados pelo
empregador para comunicação com seus empregados, devendo a empresa sempre se
acautelar de arquivar tais documentos para apresentação em eventuais
questionamentos futuros.
Definidas as diretrizes de comportamentais dos empregados, é
necessário lembrar que eventuais punições devem seguir as normas definidas na
legislação trabalhista, a serem avaliadas “caso a caso”. Para tanto, como toda
punição, deve observar-se o bom senso, a proporcionalidade e a sua
razoabilidade. Porém, deve-se levar em consideração também a excepcionalidade
do momento.
Em linhas gerais, eventuais infrações seriam enquadradas
como desídia, o que possui previsão legal no artigo 482, “e” da CLT.
Todavia, diferentemente do abandono de emprego (em que o empregador pode
demitir de imediato o empregado por justa causa), o entendimento
jurisprudencial é que a desídia é considerada infração de menor potencial
ofensivo, sendo necessário infrações reiteradas da mesma natureza, desde que
devidamente advertidas pelo empregador, para assim se caracterizar e ser
passível de demissão por justa causa.
Nada impede que, ao analisar o caso concreto, e dependendo
da natureza da atividade ocupada ou do próprio histórico documentado de
“insubordinação” do empregado, o empregador se veja diante também de um quadro
em que seja possível a aplicação de uma punição mais severa. Há de se ter
cautela também com a aplicação de punições excessivas e que podem trazer riscos
de questionamentos futuros.
Apenas para exemplificar, o abandono do posto de serviço em
virtude dos jogos da Copa do Mundo não se caracteriza como abandono de emprego
propriamente dito, visto que juridicamente tal enquadramento somente é possível
para faltas injustificadas e consecutivas por mais de 30 dias (e ainda assim,
só pode ser considerada após o não atendimento do empregado quanto a
comunicação da empresa para que retome suas atividades, conforme disposto na
Súmula 32 do TST).
Ponto importante e que merece destaque diz respeito a
possibilidade de a empresa ajustar com os empregados eventual compensação das
horas destinadas aos jogos e seus respectivos “afters” diretamente no banco de
horas. Neste caso, pode o acordo ser formalizado individualmente com o
empregado, observando-se os requisitos exigidos pelo artigo 59, § 5º
da CLT.
Outra alternativa interessante, e que se tornou bastante
comum após o período pandêmico havido nos últimos anos, seria a opção do “home
office” nos dias dos jogos. Vale, contudo, salientar a necessidade de ajuste
formal entre empresa e empregado, estabelecendo as regras para tal
flexibilização, respeitados os critérios previstos para tal modalidade de
trabalho na legislação trabalhista (Art. 75-B da CLT).
Ressalta-se que mesmo para os casos de “home office”, as
diretrizes para o desempenho do trabalho nos dias de jogos devem também estar
previamente estabelecidos, como por exemplo, para os empregados sujeitos a
controle de jornada, se a empresa permitirá que o empregado se ausente do
trabalho remoto no momento da transmissão dos jogos ou em período posterior.
Destarte, restando tudo ajustado, o empregado poderá evitar
incorrer em punições indesejadas, enquanto que o empregador terá mitigado os
riscos de passivo trabalhista, podendo ambos com tranquilidade vestir a camisa
da seleção e cair na torcida!
Rodolfo Carlos Weigand Neto, sócio do
escritório Weigand & Silva Advogados
Gleice Domingues de Souza, advogada na Weigand & Silva
Advogados