Debates
O campo é convergente
Da Redação | 28 de agosto de 2020 - 03:32

Por Coriolano Xavier
De acordo com o Panorama Agrícola 2020-2029, desenvolvido
pela Organização para Alimentação e Agricultura (FAO/ONU) e pela Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o número de pessoas que
passam fome no fundo elevou-se em 60 milhões nos últimos anos, alcançando 690
milhões de pessoas, em 2019. Com a pandemia, estimam que esse número possa
aumentar de 80 a 130 milhões em 2020, chegando, portanto, a 820 milhões de
famintos no mundo. Algo como quatro vezes a população do Brasil, ou seis vezes
a do México, ou dez a da Argentina. É muita gente. Sinal de que vai ser preciso
robustecer a segurança alimentar mundial, nos próximos anos.
Para isso, se diz que o mundo vai precisar de melhores
políticas agrícolas, mais inovação e investimentos para construir sistemas de
agricultura mais produtivos e dinâmicos. Tudo isso o Brasil já tem ou está em
boa posição para conseguir, justo na faixa tropical do planeta, de onde deve
sair grande parte dos alimentos para a segurança alimentar mundial. E, se o
futuro está nos trópicos, há outra oportunidade para o país na difusão e venda
de tecnologias agrícolas. Isto porque o Brasil fez verdadeira revolução
agrícola a partir dos anos 1970/80, criando tecnologias de produção para o
ambiente tropical, que estão na raiz da explosão agrícola brasileira: de 1977 a
2020, por exemplo, nossa produtividade de grãos mais que triplicou, enquanto a
área plantada nem chegou a dobrar.
São vantagens comparativas sólidas para o país, que
fortaleceu ainda mais o seu conceito como fornecedor de alimentos estratégico e
confiável durante a pandemia, inclusive atendendo protocolos sanitários de
exigentes clientes internacionais. A essa altura, é até bom se perguntar: o que
ganha o mercado nacional, o consumidor brasileiro, com todo esse protagonismo
do país na produção alimentar internacional? Ganha, por exemplo, em qualidade,
pois o país vende alimentos para os mercados mais exigentes do mundo e, hoje,
já é uma realidade agricultores avançados adotarem certificações de produtos e
processos, ou seja, estão atuando com padrões produtivos acima da legislação.
A hegemonia internacional do nosso agro também foi favorável
ao orçamento das famílias. No início dos anos 1990, os alimentos representavam
cerca de 40% das despesas de famílias com orçamento domiciliar de dois a três
salários mínimos e, em 2018, essa proporção havia caído para 21%, de acordo com
a Pesquisa de Orçamentos Familiares, do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). O crescimento da produção e da produtividade da
agropecuária brasileira tornou o alimento mais barato, liberando recursos das
famílias para outros tipos de consumo, com reflexos positivos em outros setores
da economia.
Agronegócio é convergência. Um mercado interno de mais de 200 milhões de pessoas é base de confiança para desenvolver um agro robusto e investir continuamente em sua evolução. Hoje, o campo brasileiro está passando às mãos da terceira ou quarta geração dos ousados agricultores que fizeram aquela revolução agrícola 40, 50 anos atrás. E tudo indica que estão repetindo aquela onda inovadora, só que agora com 4G, sensores, internet das coisas e bioeconomia, unindo produtividade, tecnologias de vanguarda, planejamento ousado e um instinto de competitividade herdado de pais e avós. A revolução agrícola dos trópicos continua.