Coluna Fragmentos: Caminhos, estradas, rodovias... a história do Paraná
A coluna ‘Fragmentos’, assinada pelo historiador Niltonci Batista Chaves, publicada entre 2007 e 2011, retorna como parte do projeto '200 Vezes PG', sendo publicada diariamente entre os dias 28 de fevereiro e 15 de setembro
Publicado: 08/09/2023, 00:04
Desde muito antes da presença dos europeus no território que hoje forma o estado do Paraná, essa região era cortada por estradas e caminhos abertos e utilizados pelas populações que originariamente ocuparam esta terra.
O Caminho do Peabiru (que liga o litoral Atlântico aos Andes peruanos), o Caminho do Itupava (aberto no século XVII ligando o litoral ao primeiro planalto), a Estrada da Mata (que conectava os Campos Gerais a São Paulo) e o Caminho do Arraial (outra via entre litoral e primeiro planalto), são algumas das passagens que já estavam constituídas em 1853, ano em que a província do Paraná foi criada a partir do seu desmembramento da província de São Paulo.
Quando nasceu, o Paraná possuía uma inexpressiva relevância política, contava com uma economia periférica baseada na extração da erva-mate e continha um território esparsamente povoado. Nesse cenário desalentador, coube ao baiano Zacarias de Góis e Vanconcelos, escolhido como primeiro presidente da província, criar a estrutura administrativa do Paraná e inseri-lo de forma efetiva na vida política e econômica nacional.
No breve período de dois anos em que esteve à frente do executivo paranaense, Góis e Vasconcelos implantou efetivamente o governo, organizou a criação e a abertura do legislativo paranaense e deu início (em 1854) àquela que parece ter sido a sua principal contribuição administrativa: o começo efetivo da construção da Estrada da Graciosa.
Concebida sobre o trajeto originalmente utilizado pelos indígenas do litoral (que a percorriam para coletar pinhão), até meados do século XX a Graciosa foi a única estrada inteiramente pavimentada do Paraná (cerca de quarenta quilômetros), sendo uma via fundamental para o escoamento de produtos como a madeira, o café e a erva-mate exportados pelo porto de Paranaguá. Esse dado expõe um problema que, por décadas, perdurou no estado: a falta de qualidade de suas estradas.
Região de passagem e ligação entre o extremo sul e o centro do Brasil, o território paranaense contou originalmente com os caminhos pré-colombianos e coloniais, depois foi beneficiado pelas ferrovias (que chegaram na última década do século XIX), mas, pelo menos, até meados dos Novecentos viveu um drama com relação a integração de seu território por conta da má qualidade de suas estradas de rodagem.
De acordo com o Anuário Estatístico 1939/1940, produzido pelo IBGE, em 1937 o Paraná possuía 15.461,4 quilômetros de estradas de rodagem. Desse total, 14.945,1 quilômetros foram classificados como sendo de “estradas de terra não melhoradas”; 412,6 quilômetros eram cobertas por pedras britadas; 97 quilômetros identificadas como de terra melhorada; espantosos, 4,2 quilômetros recobertos por asfalto e, por fim, 2,5 quilômetros eram de concreto! Ou seja, até o final da década de 1930, mais 96,5% das estradas paranaenses não possuíam nenhum tipo de cuidado, atenção ou infraestrutura por parte do estado.
Na década de 1950, momento de retração dos investimentos no sistema ferroviário e no qual Moysés Lupion governou o Paraná, o estado vivia o desafio de efetivamente promover uma integração por meio de seu sistema rodoviário. A abertura e a ocupação efetiva de regiões (como o norte e o oeste paranaenses), novas demandas econômicas e a necessidade de escoamento de safras agrícolas e de derivados animais, obrigou o poder público paranaense a investir de modo efetivo na ampliação e melhoria da malha rodoviária no estado, o que ocorreu, de fato, entre as décadas de 1950 e 1980.
Considerando que até a década de 1950 sequer a ligação entre Ponta Grossa e Curitiba era feita por estrada asfaltada é possível perceber o desafio enfrentado por Lupion, assim como por Bento Munhoz da Rocha, seu antecessor, e pelos governadores que o sucederam. Isso tudo, há pouco mais de meio século!
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Conteúdo inédito.
Coluna assinada por Niltonci Batista Chaves. Historiador. Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná.