Imigrantes venezuelanos recomeçam a vida em PG
Fome e falta de emprego são motivos que levam os venezuelanos a buscarem refúgio.
Publicado: 01/01/2022, 08:00
Fome e falta de emprego são motivos que levam os venezuelanos a buscarem refúgio
A Venezuela vive uma duradoura crise econômica, política e social. Três em cada quatro venezuelanos vivem em situação de extrema pobreza e a Pesquisa Nacional de Condições de Vida 2021, realizada pela Universidade Católica Andrés Bello (UCAB) mostrou que 94,5% da população é pobre, sendo que destes, 76,6% estão abaixo da linha da extrema pobreza, vivendo com menos de 1,2 dólares por dia (R$ 6,84 reais).
Por conta desta realidade de fome, escassez e falta de emprego, milhares de venezuelanos deixam seu país de origem em busca de melhor qualidade de vida e oportunidades de trabalho. Atualmente, a Venezuela é o segundo país com mais refugiados no mundo, ficando atrás apenas da Síria. A Polícia Federal do Brasil estima que aproximadamente 264 mil venezuelanos vivam do lado de cá, porém, uma média de 500 pessoas continuam a atravessar a fronteira diariamente.
Apesar da maior concentração de refugiados acontecer em Roraima, que faz divisa com o país vizinho, existem venezuelanos por todo país. Em Ponta Grossa, segundo o levantamento realizado pela Fundação Municipal de Assistência Social, existem 367 famílias venezuelanas cadastradas na associação Cáritas e que residem na cidade.
Estelia Castro, de 37 anos, graduada em Administração, deixou a Venezuela grávida, para procurar melhores condições de acompanhamento médico. Estava instalada em Manaus e veio para Ponta Grossa. “Não havia condições de ter um bebê lá (Venezuela). Me falaram que no Sul tinham condições de vida muito melhores em tudo”, comenta a Estelia.
Outro que veio para Ponta Grossa, foi o Anderson Vasquez, que é estilista e que trabalha com alta costura. Porém, diferente de Estelia, ele não conseguiu se estabelecer em Ponta Grossa e hoje mora em São Paulo, onde encontrou possibilidades de trabalho e consegue se manter economicamente.
Segundo Anderson Vasquez, quando ele esteve em Ponta Grossa não recebeu nenhum apoio do poder público, mas recorreu a uma Organização Não Governamental (ONG) que o auxiliou. “Eu nunca recebi assistência da prefeitura. Conheci uma organização que socorria imigrantes, consegui com eles uma caixa de comida e roupas para o inverno”, lamentou.
Ajuda que vem da igreja
A Cáritas Diocesana, ligada à Igreja Católica, é uma das entidades que ajuda venezuelanos que desembarcam em Ponta Grossa, muitas vezes sem um rumo para recomeçar a vida. A organização é hoje a instituição referência no apoio aos imigrantes.
A assistente social Erica Francine Pilarski Clarindo, conta que os moradores locais podem contribuir com a instituição através de doações, sendo voluntários, engajando-se nas redes sociais da entidade e sendo receptivos, sem qualquer preconceito contra quem está chegando. “Temos alguns relatos de xenofobia. São pessoas que saíram de seu país porque foram forçadas, seja por guerra, fome, perseguição política, religiosa ou grave e generalizada violação de direitos. E quando chegam aqui querem apenas seguir sua vida”, explica.
Recomeçando a vida
Os imigrantes encontram no Brasil a esperança de um novo recomeço. Ankys Andreina, 40 anos, administradora, diz que vê no país muitos pontos positivos. “Documentação rápida e certinha, temos direitos à educação, trabalho justo, saúde e muitas coisas mais”, compara.
Traumatizada com experiência socialista venezuelana, Estelia Castro está de olho no cenário político brasileiro. “Eu não quero que aqui fique igual ao meu país. Eu sei como é horrível uma ditadura. As pessoas aqui não imaginam como é de verdade. Tudo o que a gente vê no jornal, não se compara com a realidade”, afirma.
No entanto, o professor Aknaton Toczek de Souza, doutor em Sociologia, explica que não é bem assim e que o socialismo é uma corrente de pensamento e que não tem ligação com a ditadura. “Isso não é uma realidade em absoluto, não tem uma relação, até porque o socialismo não é uma coisa só, são vertentes de ideias e pensamentos com resultados práticos. Alguns muito positivos e outros negativos, tal qual o capitalismo, o cristianismo ou qualquer ideia de pensamento que seja baseada na violência”, defende.
Especificamente sobre a Venezuela, o professor comenta que aquela nação passa por um período de autoritarismo muito forte. Usando dados de que dizem respeito à desigualdade, mortalidade, letalidade policial e violação de direitos humanos, Aknaton elenca o Brasil e a Arábia Saudita, como países capitalistas que também apresentam falhas em suas estruturas sociais e que, portanto, também são considerados preocupantes quanto ao respeito aos direitos humanos, conforme apontou a Organização das Nações Unidas em 2019. Na época, o Governo Federal do Brasil contestou as declarações.
Saudades
Apesar de o Brasil representar um novo recomeço, é um recomeço doloroso pelos que ficaram para trás. Ankys Andreina comenta que sente muita saudade da comida, das tradições e, principalmente da família e dos amigos que ficaram para trás. “Eu deixei minha mãe, irmãos, sobrinhos, avós. Que grande dor sinto por não estar com eles!”, relembra.
O Anderson Vasquez conseguiu trazer parte de sua família para o Brasil. Segundo ele, mantendo o foco no trabalho, mesmo em meio a pandemia, o irmão mais novo, a cunhada e quatro sobrinhos conseguiram um novo lar no Brasil. “De certo modo, sinto muito alívio, mas, a luta segue sendo forte, pelo menos até que eles se acostumem com o idioma e possam ser independentes economicamente. Por outro lado, estou muito feliz de ter eles por perto, compartilhando uma comida, alguma piada, aproveitando o tempo de ajudar com a educação dos meus sobrinhos, ver eles se alimentarem melhor e pensar todos os dias que agora eles crescerão com novas e melhores oportunidades”, comenta Anderson.
A Venezuela é um país situado na costa norte da América do Sul com diversas atrações naturais banhado pela costa do Caribe, mas além das praias que impressionam pela beleza natural há o visual urbano da capital, planícies e ainda um pedaço das Cordilheiras dos Andes. E é desses atrativos, que Estelia Castro sente falta, além de sentir saudade da sua família. “Agora no natal dá muita saudade, eu tenho muitas lembranças. Eu amo meu país, eu peço a Deus que um dia possa dar liberdade ao meu país”, diz Estelia.
Por Izabelle Antunes, sob supervisão de Helton Costa. Esta notícia faz parte do projeto de fortalecimento do Jornalismo Regional, do curso de Jornalismo da UniSecal em parceria com o Portal aRede/Jornal da Manhã.