Golpe de 1964: conservadorismo e autoritarismo X movimentos populares
Publicado: 08/04/2014, 10:52

Prof. Ms. José Roberto de Vasconcelos Galdino
Professor Assistente do Depto. de História/UEPG
Ideias conservadoras e fascistas estão no cerne de passeatas e nas redes eletrônicas defendendo um golpe militar hoje no Brasil. Na percepção destas pessoas, o golpe civil/militar teria sido uma “revolução democrática”. Então vejamos:
No contexto da “guerra fria”, os EUA (“Bem”) combatiam o avanço do “socialismo” (“Mal”) em todo lugar, usando seu poder militar pelo mundo afora (como no Vietnã) e/ou disseminando os seus valores culturais. Para isto usaram o cinema hollywoodiano; a música; os quadrinhos de super-heróis e da Disney (inclusive criando o Zé Carioca); as revistas (como a Seleções Reader’s Digest) e a mídia pró-EUA; a língua inglesa nos Centros Culturais Brasil-EUA; a criação de clubes sociais; a criação de alguns programas como o da “Aliança para o Progresso”; a promoção da vinda de estudantes norte-americanos para fazer “trabalhos sociais” nas favelas. E, ainda mais explicitamente, os governos dos EUA, Kennedy e Johnson, colaboraram com os militares e civis na organização do golpe para derrubar o governo Goulart, inclusive com o envio de armas e porta-aviões (Operação “Brother Sam”).
Em nome da “liberdade” e da “democracia” os EUA apoiaram inúmeras ditaduras militares antidemocráticas, além do Brasil, no Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai, entre outras (destituindo governos eleitos pelo voto).
Aqui, os militares, apoiados pelas elites latifundiárias e empresariais, Igreja Católica, TFP, a mídia e políticos conservadores, como Lacerda, tramavam assumir o poder, usando o discurso demagógico anticomunista. Era uma época de ascensão de movimentos sociais: sindicatos urbanos (CGT) e rurais (ULTAB, Ligas Camponesas), estudantis (UNE, UBES); e de movimentos culturais: Cinema Novo, Teatro Popular, Música, Literatura, Artes, Movimentos de Cultura Popular e de alfabetização.
Quando Goulart propôs as reformas de base mexeu com a parte conservadora da sociedade. A Reforma Agrária visava distribuir terras aos pequenos proprietários; a Tributária – limitar as remessas de lucros para o exterior e cobrar mais impostos dos mais ricos; a Urbana – justa utilização das áreas urbanas e combate a especulação imobiliária; a Estudantil – ampliação e valorização do ensino público; a Bancária – ampliação do acesso ao crédito; a Política – voto para os analfabetos. Tudo isto, aliado à organização dos marinheiros, cabos e sargentos, serviu de justificativa para o golpe.
Então, tivemos um brutal regime autoritário que praticou terrorismo de estado com torturas, assassinatos, “suicídios”, “desaparecimentos”, estupros, prisões, exílios, censura, corrupção, eleições indiretas, cassações, fechamento do Congresso, demissões e aposentadorias (professores, militares). Ao mesmo tempo, este regime repressor e monstruoso promovia discursos ufanistas e dissimuladores: “Prá frente Brasil” ou “Brasil: Ame-o ou deixe-o” (cópia do lema da Itália fascista).
Com a crise do petróleo e fim do “milagre”, o regime foi desmoronando. Os movimentos sociais ressurgiram em todo lugar. A OAB e a ABI defenderam o “Estado de Direito, Já”; se organizaram as Comunidades Eclesiais de Base, da Igreja Católica, pelos bairros pobres, além das Pastorais; o movimento estudantil (recriação da UNE) e o sindical retornaram com força (greves do ABC). Foram criados movimentos pela anistia, feminista, negro, indígena, ambiental, homossexual, ocupações urbanas, custo de vida e, depois, as campanhas pelas Eleições Diretas e pela Constituinte.
Foram mais de 20 anos de autoritarismo e de atraso cultural, político, social e moral, que devemos conhecer e repelir para que nunca mais aconteçam. Para isto devemos repudiar ideias conservadoras, autoritárias e preconceituosas, como as que permanecem hoje no discurso da bancada ruralista, que prega o combate feroz aos povos indígenas, quilombolas e homossexuais. Este é o discurso e, infelizmente, a prática das elites conservadoras do país indo contra a inclusão, o protagonismo e os direitos populares. Portanto, somente o ingênuo desconhecimento histórico ou o reacionarismo permitem uma exaltação do golpe de 1964 ou de quaisquer outros golpes!