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Taxa das blusinhas significa igualdade tributária, mais empregos e estabilidade
Da Redação | 10 de dezembro de 2025 - 02:11
Por Fernando Valente Pimentel
A chamada “taxa das blusinhas” tem sido alvo de narrativas
equivocadas, que desconsideram a realidade da economia brasileira e a
importância estratégica de preservar a produção e os empregos nacionais da
indústria e do varejo e de atender às necessidades legítimas dos consumidores.
Na evolução do comércio cross border, a partir principalmente da pandemia,
as importações de pequeno valor via plataformas estrangeiras desfrutaram de
tratamento tributário privilegiado até agosto de 2024, quando passaram a recolher
Imposto de Importação de 20%. Mesmo considerando essa alíquota, a taxação total
que recai sobre esses sites estrangeiros de e-commerce ainda é
bastante inferior à imposta a quem gera trabalho, investe e produz no Brasil.
A tributação vigente não busca criar protecionismo, mas assegurar algo tão
básico quanto justo: concorrência com regras iguais para todos. Sugerir que
prejudica os consumidores de menor renda é uma falácia. O que realmente os lesa
é a desindustrialização, a quebra de negócios locais e a eliminação de postos
de trabalho.
A indústria têxtil e de confecção brasileira segue gerando
empregos formais, contrariando uma retórica que tenta negar o impacto positivo
da igualdade tributária. São mais de 1,3 milhão de trabalhadores diretos, com
forte presença em cidades onde a manufatura é o motor do desenvolvimento e da
mobilidade social. Em 2025, de janeiro a setembro, o setor já criou 29,6 mil
postos formais de trabalho. Nos 12 meses anteriores, foram 6,1 mil. Isso só é
possível porque essa atividade, mais do que centenária, sempre esteve e
continua alinhada às necessidades do consumidor e da sociedade, oferecendo
produtos em todas as faixas de preço, estilos e perfis socioeconômicos.
Há outro dado relevante sobre a consciência da indústria
têxtil e de confecção quanto à sua responsabilidade como provedora de um
produto de primeira necessidade, que é a roupa: desde o início do Plano Real,
em julho de 1994, até setembro de 2025, o grupo “Vestuário” foi o que
apresentou a menor inflação acumulada (483%) entre os nove que compõem o IPCA,
cujo índice geral avançou 803% no período.
Ou seja, o setor é o que mais contribuiu para a estabilidade
dos preços no Brasil ao longo de mais de 30 anos. Prova atual disso encontra-se
em dois produtos presentes no guarda-roupa de todos os brasileiros: nas faixas
populares de consumo, encontram-se facilmente, em qualquer pesquisa no mercado
varejista nacional, calças jeans entre 50 e 120 reais (9,3 e 22,4 dólares) e
camisetas de algodão de 20 a 50 reais (3,7 a 9,3 dólares - câmbio de 3 de
novembro). Aprofundando a pesquisa, encontram-se preços ainda menores. São
valores muito competitivos em relação a qualquer comércio eletrônico
internacional.
Cabe considerar, também, que, levantamento do Instituto
Fecomércio-RS de Pesquisa (IFEP-RS) reitera que o Programa Remessa Conforme
(PRC), mesmo com o estabelecimento da “taxa das blusinhas” (Imposto de
Importação de 20%) em agosto de 2024, mantém diferencial de tributação
significativo em favor das remessas oriundas do exterior para o consumidor
final, na comparação com operações da indústria e varejo dentro do Brasil.
Desde a implementação do tributo até junho de 2025, entraram 126 milhões de
encomendas no País, somando R$ 12 bilhões líquidos de impostos em compras.
Também é importante notar que, segundo relatório da Receita
Federal sobre o PRC, as remessas internacionais continuaram crescendo após a
taxação do Imposto de Importação. Saltaram de 11,44 milhões, em janeiro, para
um pico de 15,02 milhões em julho de 2025.
Por outro lado, pesquisa da Confederação Nacional da
Indústria (CNI) e da Nexus, intitulada “Retratos do Brasil (outubro/2025),
aponta que a principal causa para os consumidores desistirem das compras nas
plataformas internacionais é o custo do frete (45% dos compradores) e não a
tributação. Foram ouvidas 2.008 pessoas, a partir de 16 anos, nas 27 unidades
da federação.
Para que se tenha uma ideia mais clara dos impactos de um
eventual e impensável fim da taxação das encomendas de pequeno valor, só na
linha feminina 77% do que é vendido estão abaixo de 50 dólares; na íntima e
meias, 90% e, no total, incluindo todos os segmentos de roupas, 80% estão aquém
desse valor. Isso representa um mercado de 294,85 bilhões de reais por ano, o
equivalente à atividade de 141,94 mil empresas da indústria e varejo e 1,27
milhão de empregos, conforme dados do IEMI. Ou seja, subsidiar o produto
importado com renúncia fiscal significa importar desemprego.
Considerando todas as razões aqui expostas, não é razoável
aceitar que sites de e-commerce estrangeiros vendam diretamente ao
nosso consumidor com benefícios fiscais e regulatórios em seus países de origem
inexistentes para os produtores nacionais, que cumprem leis trabalhistas,
ambientais, tributárias e de segurança em território brasileiro. Também compete
ressaltar que os preceitos da economia circular e sustentabilidade, com
políticas públicas em curso no Brasil e no mundo, seguem sendo desconsiderados
pelos fabricantes que vendem por meio das plataformas eletrônicas
internacionais, nas quais há, ainda, problemas de produtos falsificados.
Defender a igualdade tributária não é ser contra a abertura
econômica, mas sim permitir que todos participem do comércio global sem
distorções. Países desenvolvidos, como os Estados Unidos, e emergentes, como o
México, tributam, sim, importações de pequeno valor. Os norte-americanos,
aliás, extinguiram o de minimis, tornando o mercado brasileiro ainda
mais atraente para os exportadores, ou seja, gerando um risco adicional para
nossa indústria e varejo. Por que então o Brasil deveria agir de modo
diferente, justamente quando luta para elevar produtividade, renda e
prosperidade interna?
Nesse contexto, os defensores da isenção das pequenas
encomendas internacionais fariam melhor se estivessem lutando por projetos que
reduzissem a carga tributária da indústria e do varejo do Brasil, de maneira a
diminuir os preços de nossos produtos, estimulando a produção nacional e
gerando mais bem-estar e desenvolvimento. A decisão diante de nós é simples:
queremos ser um país que apenas consome o que vem de fora ou uma nação que gera
riqueza com sua própria produção? Queremos estimular empregos aqui ou além das
nossas fronteiras? A resposta correta é evidente e converge para uma
prioridade: igualdade de regras. É isto que o setor produtivo brasileiro
reivindica. Queremos a garantia de isonomia fiscal, princípio essencial de
qualquer economia de mercado saudável.
A “taxa das blusinhas” não é contra o consumidor. É a favor
do emprego, da renda, da legalidade, da justiça tributária e do desenvolvimento
nacional. Liberdade de compra não pode significar concorrência desleal.
Desenvolvimento e bem-estar social não se importam, mas se constroem aqui, com
o trabalho de milhões de brasileiras e brasileiros. Quando escolhe o que é
feito no Brasil, o consumidor veste orgulho, gera empregos e ajuda a costurar o
futuro do País.
*Fernando Valente Pimentel é o diretor-superintendente
e presidente emérito da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de
Confecção (Abit).