Debates
Quando as fábricas forem operadas por robôs: o que acontece com a economia?
Da Redação | 28 de novembro de 2025 - 01:13
Por Jânyo Diniz
A indústria global acaba de cruzar um marco simbólico e
inquietante. Uma empresa chinesa realizou recentemente a primeira entrega em
massa de robôs humanoides para atuarem diretamente em linhas de produção,
substituindo tarefas que até ontem dependiam exclusivamente de trabalhadores
humanos. Não se trata mais de experimentação, mas de implantação real, em
escala crescente, em ambientes industriais onde a precisão, a repetição e a
força física sempre foram parâmetros determinantes. Para alguns, trata-se de um
avanço natural da tecnologia, uma vitória da eficiência e da produtividade.
Para outros, como eu, esse é o momento de fazer a pergunta que realmente
importa: o que acontece com a economia quando máquinas passam a ocupar, de
forma ampla e permanente, o lugar do trabalho humano?
O avanço recente dos robôs humanoides mostra que já não
estamos discutindo cenários distantes: estamos observando os primeiros sinais
de uma transformação estrutural. O ponto central é que a automação está
deixando de ser complementar para se tornar substitutiva. Robôs humanoides
capazes de operar máquinas, mover cargas, realizar montagens e interagir com
ambientes projetados para humanos inauguram um novo patamar de eficiência. Isso
pressiona diretamente o mercado de trabalho, reduzindo a necessidade de contratações,
comprimindo salários e alterando a estrutura da renda.
Em um primeiro momento, empresas capturam ganhos de
produtividade. Em um segundo, a economia sofre os efeitos da diminuição da
renda disponível: menos consumo, menos circulação de capital e risco de
estagnação em setores dependentes do poder de compra das famílias. A história
econômica mostra que grandes saltos de produtividade só se convertem em
prosperidade quando seus benefícios são distribuídos. Caso contrário, ampliam
desigualdades.
Há ainda um componente social delicado. A automação em larga
escala tende a afetar primeiro os trabalhadores menos qualificados, aqueles
mais expostos a tarefas repetitivas e rotineiras. Isso aprofunda desigualdades
e cria bolsões de exclusão, sobretudo em países de renda média, como o Brasil,
onde a formação profissional não acompanha a velocidade da inovação
tecnológica. O risco não é apenas econômico: é também social e territorial.
Regiões inteiras podem perder dinamismo se não houver políticas robustas de
transição, requalificação e suporte à reinserção produtiva.
O caminho para enfrentar esse desafio começa pela educação
superior. Precisamos formar profissionais capazes de trabalhar com a
inteligência artificial, e não apesar dela. Isso significa desenvolver
competências analíticas, criativas e tecnológicas que permitam ao trabalhador
supervisar processos automatizados, solucionar problemas complexos e inovar em
áreas onde a IA ainda não alcança. É a essência da trabalhabilidade: a
capacidade de continuar relevante em um mundo em constante mudança.
No entanto, a educação sozinha não dá conta do desafio. É
preciso alinhar políticas públicas, financiamento estudantil contingente à
renda e mecanismos de proteção social que garantam requalificação permanente.
Da mesma forma, a regulação da automação deve ser inteligente: não pode frear a
tecnologia, mas precisa garantir que os ganhos de produtividade sejam
acompanhados de estratégias de inclusão e preservação da coesão social.
A verdade incômoda é que, se a automação avançar de maneira
desordenada, poderemos ver o enfraquecimento estrutural da renda do trabalho,
que é o alicerce do consumo, da previdência e da estabilidade econômica. O
risco não é o fim do trabalho, mas o fim do trabalho como fundamento da renda.
A prosperidade gerada pela automação só será legítima se também for humana. Estamos diante de uma encruzilhada histórica: ou orientamos a tecnologia para promover desenvolvimento inclusivo, ou permitimos que ela aprofunde desigualdades e fragilize o tecido social. O futuro não será definido apenas pelos robôs que construímos, mas pelas escolhas que fazemos agora para garantir que ninguém seja deixado para trás.
Jânyo Diniz, CEO da Ser Educacional