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Maternidade e pejotização

Imagem ilustrativa da imagem Maternidade e pejotização

Por Willian Jasinski

Nos últimos anos, o mercado de trabalho tem assistido a uma transformação silenciosa, mas profunda, a substituição de contratos formais (CLT) por contratos como pessoa jurídica (PJ), especialmente na modalidade Microempreendedora Individual (MEI).
Essa tendência, chamada de pejotização, é muitas vezes apresentada como sinônimo de autonomia e liberdade para o trabalhador. Mas, quando olhamos sob a lente da maternidade, o cenário muda drasticamente, a suposta liberdade se revela, em muitos casos, como vulnerabilidade.

Na teoria, o contrato PJ é um pacto entre iguais, duas empresas negociando condições livremente. Na prática, a disparidade de forças é gritante. Empresas impõem horários, exclusividade, subordinação e até controle de produtividade, mas sem conceder qualquer direito trabalhista. É o que se chama de “CLT disfarçada”.

O drama se agrava quando a trabalhadora engravida. No regime CLT, a gestante tem estabilidade desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, além de licença-maternidade remunerada e outras garantias. Já no contrato PJ, a regra é simples, não há estabilidade, não há aviso-prévio, não há FGTS, não há férias.
O único benefício possível, o salário-maternidade pago pelo INSS, exige contribuição mínima de 10 meses antes do parto e, mesmo assim, é limitado a um salário mínimo.

O resultado é a repetição de uma prática recorrente, ao informar a gestação, muitas mulheres são desligadas sob justificativas que soam como cuidado, mas carregam a velha concepção de que maternidade e desempenho profissional não podem coexistir.

A questão hoje está no Supremo Tribunal Federal, que discute se a pejotização pode ser considerada fraude trabalhista quando encobre uma relação de emprego típica. O julgamento é complexo e envolve impactos econômicos significativos, mas não podemos ignorar um ponto central, a pejotização não é neutra. Ela afeta de forma desigual grupos já vulneráveis no mercado de trabalho.

Ao desobrigar empresas de observar garantias trabalhistas, o modelo cria um terreno fértil para a discriminação silenciosa. Afinal, sem vínculo formal, não há fiscalização, não há estabilidade, e denúncias de assédio ou discriminação se tornam mais arriscadas.
É o retorno de velhos fantasmas que, por décadas, tentamos afastar com leis protetivas, a escolha entre ser mãe ou manter o emprego.

Não se trata de desqualificar o contrato PJ, ele é legítimo quando há efetiva autonomia, possibilidade de atender diversos clientes e liberdade para organizar o próprio trabalho. O que preocupa é seu uso como fachada para driblar obrigações e compromissos trabalhistas.

A discussão no STF, portanto, não é apenas jurídica. É também social, econômica e de gênero. Ignorar que a pejotização atinge mães de forma desproporcional é fechar os olhos para uma realidade que salta aos olhos de quem vive o dia a dia do trabalho no Brasil.

Se queremos um mercado verdadeiramente moderno e justo, não basta flexibilizar. É preciso equilibrar a balança, garantindo que flexibilidade não seja sinônimo de abandono e que maternidade não seja tratada como empecilho, mas como parte legítima da vida profissional de milhões de mulheres.

* O Autor é advogado, formado em Direito pela Universidade Norte do Paraná, com especialização em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná

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