Debates
Conservação do solo garante segurança alimentar e sustentabilidade da agropecuária
Da Redação | 17 de abril de 2025 - 03:14

Por Alberto Bernardi
Nas últimas décadas, o mundo tem passado por grandes
desafios, como as emergências climáticas e a necessidade de garantir a
segurança alimentar, a produção de fibras e energia com o menor impacto
ambiental. Nesse cenário, manter os solos saudáveis e com qualidade passa a ser
uma grande responsabilidade. Sem a aplicação dos conhecimentos para o bom
manejo dos solos, sérios problemas ambientais podem surgir, como a sua
degradação e dos recursos hídricos.
O solo é muito mais do que apenas o substrato para
crescimento dos vegetais. É um sistema complexo vivo que para garantir o
sucesso da agricultura, deve ser compreendido e trabalhado da melhor maneira. A
ciência do solo mostra que não é simplesmente um material, mas um corpo natural
em camadas, com uma organização física de minerais e matéria orgânica, que
resultou de processos químicos e biológicos. E que o solo é um componente
fundamental dos ecossistemas terrestres, exercendo um papel crítico em seu funcionamento
e na sustentabilidade da vida humana. Sua localização, composição e processos
que acontecem ali têm um influenciam o funcionamento dos ecossistemas e para a
existência humana.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e
Agricultura (FAO-ONU) estima que um terço dos solos do mundo estão degradados
pelo uso inadequado. Entre os principais problemas estão a erosão, compactação,
acidificação, salinização e contaminação.
A erosão hídrica é considerada como o maior problema de
degradação do solo no ambiente tropical. Esse processo inicia-se com o impacto
direto das gotas de chuva sobre a superfície não protegida por vegetação ou
cobertura morta. O impacto da gota desencadeia uma série de eventos de
desagregação, remoção e transporte de partículas, nutrientes e matéria
orgânica. É considerada uma das principais causas de degradação dos solos
agrícolas no Brasil. A intensidade da chuva, o tipo de solo e a cobertura
vegetal influenciam esse processo. A cobertura vegetal é um elemento chave para
sua prevenção, pois protege o solo reduzindo a energia erosiva das gotas de
chuva ao minimizar o processo de desagregação e de selamento superficial, além
de contribuir para o aumento da infiltração de água.
Lembrando que a biomassa que cresce e protege o solo age na
superfície, com a cobertura e na subsuperfície com o crescimento das raízes.
As consequências da erosão hídrica vão desde a perda de
recursos essenciais como solo, água e nutrientes, resultando em custos
significativos. A erosão representa um desafio global e urgente, comprometendo
a produção de alimentos, fibras e energia, a disponibilidade de terras
agrícolas e a qualidade e disponibilidade da água.
Um solo degradado é incapaz de sustentar ecossistemas
complexos, compromete a regulação climática, interrompe os fluxos hídricos e
inviabiliza a produção de alimentos. Em contrapartida, um solo saudável é o
alicerce da segurança alimentar e da sustentabilidade agropecuária, garantindo
a vitalidade dos sistemas produtivos e a perenidade dos recursos naturais. Solo
saudável e de qualidade tem maior estoque de carbono, reduz a emissão de gases
de efeito estufa para a atmosfera e os efeitos do aquecimento global, aumenta
da infiltração e retenção de água, regula a temperatura, estimula da atividade
biológica e aumenta da ciclagem de nutrientes.
A perda das camadas superficiais no processo erosivo pode
tornar os solos improdutivos. E os efeitos da erosão vão além da perda de
terras férteis, podendo levar ao aumento da sedimentação, eutrofização e
assoreamento em cursos d’água, rios e reservatórios, obstruindo vias
navegáveis, causando declínios na vida aquática e reduzindo a disponibilidade
de água. As terras degradadas frequentemente têm menor capacidade de retenção
de água, o que pode piorar as inundações e a recarga dos aquíferos. Além da perda
de nutrientes, perde-se carbono, a estrutura do solo e a biodiversidade.
Há também perdas econômicas com a aplicação de insumos em
uma safra e que podem ser carregados pela chuva. São perdas significativas e
impactam a receita dos agricultores, já que os gastos com fertilizantes podem
representar até 40% dos custos de produção das culturas como soja, milho,
cana-de-açúcar ou café. Além disso, há despesas com o replantio das lavouras e
a manutenção de terraços demandando mais horas de trabalho e de máquinas.
Ainda, há o desequilíbrio ambiental causado pelas perdas de
carbono. O solo armazena esse elemento como matéria orgânica. O reservatório de
carbono orgânico do solo é o dobro do carbono presente na atmosfera e cerca de
duas a três vezes maior do que o carbono acumulado em organismos vivos em todos
os ecossistemas terrestres da Terra. Em virtude de seu potencial de sequestro
de C, a agricultura e os solos agrícolas, a partir do Acordo de Paris (2015),
ganharam mais destaque e passaram a integrar a agenda global de C para a
mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
No dia 15 de abril celebra-se o Dia Nacional da Conservação
do Solo. A data é importante para mostrar à sociedade que a conservação do solo
é essencial para a manutenção da vida e alertar para a ameaça do uso
irracional.
O solo não é apenas um recurso natural, é um legado que foi
confiado à humanidade. A maneira como ele é gerenciado hoje definirá o que
caberá às futuras gerações.
Há algumas décadas, preservar e produzir eram vistas como
atividades conflitantes, sendo impossível acontecer ao mesmo tempo na
agropecuária brasileira. Com o avanço da ciência e da boa agricultura, essa
ideia foi deixada de lado. Hoje, agricultores e técnicos sabem que preservar e
produzir é possível, como também pode ser muito vantajoso e fundamental para
garantir a sustentabilidade do setor agropecuário, a segurança alimentar e a
preservação do meio ambiente para as futuras gerações. É uma mudança de paradigma
na forma de produzir, buscando um equilíbrio entre a produtividade, a
rentabilidade, a responsabilidade social e a conservação ambiental.
A conservação do solo e seu manejo correto contribuem diretamente com três Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU): ODS 2 (Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável), ODS 13 (Adotar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos) e ODS 15 (Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade).
Alberto Bernardi é Pesquisador Embrapa Pecuária Sudeste