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Bosquímanos! Kung e o Equilíbrio

Imagem ilustrativa da imagem Bosquímanos! Kung e o Equilíbrio

Por Giovani Marino Favero

Os !Kung, povo antigo do deserto do Kalahari, levam uma vida que, à primeira vista, nos parece simples. Na vastidão arenosa da África, esses guardiões das savanas e arbustos secos vivem em um silêncio cheio de vida, em uma dança harmônica com a natureza. Sem as tecnologias que cercam a nossa vida, os !Kung parecem nos observar do passado, como figuras de uma pintura que há muito tempo esquecemos de apreciar.

Para nós, filhos da ciência, a vida dos !Kung levanta questões desconfortáveis. Como conseguem viver tão bem, sem os avanços e as seguranças que a ciência nos promete? “Vivem felizes, são ignorantes, e o conhecimento não é melhor que a ignorância?”, poderia alguém dizer. “O que há de tão especial no conhecimento?” De fato, para os !Kung, o que chamamos de ciência é desnecessário. Seus “laboratórios” são o céu aberto e as areias douradas, e seus “doutores” são os anciãos que, em noites frias, compartilham histórias à beira do fogo, onde a experiência é repassada de boca em boca, numa sabedoria que não depende de microscópios ou fórmulas.

A ciência nos trouxe longe. Desde as invenções mais primitivas, até as tecnologias que exploram os confins do universo, o conhecimento tem sido nossa tocha. Mas ele também é uma lâmina afiada, que corta e molda o mundo conforme nossas vontades, e nem sempre isso leva à paz. Em contrapartida, os !Kung têm uma compreensão instintiva do que significa o suficiente. Caçam apenas o necessário, respeitam as migalhas da vida. Não se preocupam em acumular riqueza, nem em competir por status. Para eles, cada dia que nasce é um ciclo a ser vivido em plena aceitação, uma sabedoria que não se encontra nos livros, mas no pulsar das veias e na batida dos corações.

Ao longo dos séculos, quantas civilizações não se despedaçaram em busca de respostas e poder? Em nossa ânsia pelo novo, pelo desconhecido, esquecemos muitas vezes de viver no presente. A ciência trouxe remédios, é verdade. Mas trouxe também o veneno que polui rios e a pressa que nos rouba o tempo. Os !Kung, por outro lado, parecem entender algo que nós, na corrida pelo progresso, deixamos para trás: a beleza de estar onde se está, sem querer mais do que o agora.

De fato, os !Kung não são “ignorantes”, mas sim, sábios de uma sabedoria que renega a ânsia por controle. Talvez, no fundo, o que nos incomoda neles é a ideia de que o conhecimento, apesar de todo o seu brilho, não é o único caminho para a realização. Afinal, quem é mais feliz: aquele que descobre como prolongar a vida, mas passa seus dias inquieto, ou aquele que vive o tempo que tem em plena harmonia, sem pressa ou medo?

Em algum ponto, esquecemos que a felicidade e o conhecimento não precisam andar juntos. Os !Kung nos mostram que talvez a maior ciência seja justamente a que não está escrita em fórmulas ou guardada em laboratórios. Eles nos lembram que a vida, em sua essência, é um ciclo de dar e receber, de ser e estar, sem que se precise entender todas as engrenagens que movem o universo.

No fim, o que há de tão especial no conhecimento?

Giovani Marino Favero é professor associado do Departamento de Biologia Geral da UEPG.

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