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Como começou a luta dos povos indígenas no Brasil
Da Redação | 09 de fevereiro de 2024 - 00:54
Por Viktor Waewell
Se eu disser para você que nós tivemos décadas de grandes
batalhas em todo litoral do Rio de Janeiro e São Paulo, no mar e em terra,
talvez você vai achar que estou exagerando, mas foi exatamente isso que
aconteceu. Essa foi a Confederação dos Tamoios, na segunda metade do século
XVI, bem no começo da invasão pelos portugueses da América.
Mas o que houve exatamente?
Os portugueses se instalaram na capital em Santos e logo
conseguiram fazer aliança com caciques da região do Planalto de Piratininga. O
principal deles era o cacique Tibiriçá, da aldeia Inhapuambuçu, que ficava bem
onde é hoje o centro da cidade de São Paulo. Por sinal, foi com autorização do
cacique Tibiriçá que os jesuítas instalaram o colégio que existe até hoje e é
considerado o marco zero da atual metrópole.
O negócio na época, quer dizer, o que dava dinheiro para os
fidalgos portugueses era, junto com seus caciques aliados, capturar outros
povos indígenas e vendê-los como escravos para os senhores Pernambuco que
começavam a plantar cana caiana. Não à toa, o Porto de Santos, na época, era
chamado de Porto dos Escravos.
Acontece que quando essa avalanche escravista chegou à atual
região do estado do Rio de Janeiro, numa época em que nenhuma cidade ou vila
portuguesa havia sido fundada ali, os nativos da região decidiram lutar contra
a escravidão. Toda a baía de Guanabara era pontilhada por muitas e muitas
aldeias, em grande parte inimigas entre si desde tempos imemoriais. E foi aí
que aconteceu algo inédito entre os nativos do nosso país. Antes inimigos
viscerais, eles se uniram para lutar contra o inimigo em comum que vinha de São
Paulo.
De diversas etnias, eles se autointitularam tamoios, que em
tupi significa aqueles que estiveram aqui antes. Ou seja, uma maneira de se
diferenciar dos que chegaram depois, os brancos. Os nativos entenderam que,
mesmo de diferentes povos, possuíam uma história e um destino em comum, o que
passava pela resistência contra os invasores brancos e seus aliados locais.
Essa ideia, de união entre os indígenas, correu as trilhas e navegou os rios.
Povos distantes gostaram dela.
O Dia Nacional da Luta dos Povos Indígenas, celebrado esta
semana, relembra o 7 de fevereiro de 1756, quando morreu Sepé Tiaruju, uma
liderança dos Sete Povos das Missões. Unidos, eles lutaram contra a divisão das
suas terras ancestrais entre portugueses e espanhóis, que cortavam o continente
ao seu gosto.
Essa ideia, de que os povos nativos americanos possuem uma
identidade em comum, segue até o dia de hoje, depois de séculos, e é base para
a luta desses povos por direitos, seja para manter as suas terras, preservar a
sua cultura e ir ao encontro dos seus sonhos, como todos os humanos.
Um viva ao Dia Nacional da Luta dos Povos Indígenas.
Nós, brasileiros que não somos indígenas, temos a obrigação moral de conhecer a nossa história e apoiar a luta dos nossos irmãos nativos.
Víktor Waewell, autor de ficção histórica, inclusive o livro
Guerra dos Mil Povos, uma história de amor e guerra durante a nossa maior
revolta indígena.