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Alles blau, tudo azul?

Imagem ilustrativa da imagem Alles blau, tudo azul?

Por Giovani Marino Favero

No ano de 1997 escutei pela primeira vez a expressão: "alles blau". Era meu primeiro ano em Ponta Grossa e, em Maringá, de onde eu vinha, nunca havia escutado. Essa expressão, que significa "tudo azul" em alemão, é utilizada como uma forma de perguntar e responder se está tudo bem. Curiosamente, muita gente acredita que "alles blau" seja amplamente usada na Alemanha, mas na verdade essa saudação foi criada pelos imigrantes alemães que se estabeleceram no Brasil.              

Essa expressão ganhou popularidade entre os descendentes de alemão no Brasil devido a uma adaptação cultural dos imigrantes, que mesclaram sua língua materna com o novo contexto em que viviam. Assim, "alles blau" acabou substituindo expressões como "guten Tag" (bom dia), "alles klar" (tudo claro) e "wie geht’s" (como vai?). A expressão se encaixa perfeitamente no cotidiano e reflete a mistura de culturas que caracteriza a região sul do Brasil, funcionando tanto como uma pergunta quanto uma resposta amigável e informal.          No Brasil, tudo azul é sinônimo de coisa boa de alegria.

Desde essa época (1997) eu me questionava sobre o azul ter um significado diferente para os habitantes do hemisfério norte e para os do sul. Nos EUA expressões como “I feel blue” está relacionada a um sentimento negativo, de tristeza, para baixo. O próprio estilo musical “Blues” tem essa conotação melancólica.

Pesquisando sobre o assunto me deparei com alguns trabalhos científicos sobre a percepção da cor azul. Há uma relação enigmática com a humanidade, marcada pela sua ausência em textos antigos e sua recente inclusão na colorimetria moderna. Antigos registros de várias civilizações, como os épicos gregos e escrituras hebraicas, não mencionam o azul. Até mesmo em obras detalhadas, como a Odisseia de Homero, o mar e o céu são descritos com termos como "semelhantes a vinho" e metáforas relacionadas a metais, sem referências à cor azul. Essa ausência levou estudiosos, como William Gladstone, a questionar se o azul existia na percepção das antigas culturas.

A investigação sobre a presença do azul revelou que em diversas literaturas antigas, desde as histórias chinesas até as sagas islandesas, a cor não era mencionada. Esta omissão estende-se às primeiras versões hebraicas da Bíblia e aos hinos védicos hindu. Até hoje, certos grupos, como os Himba da Namíbia, não têm uma palavra específica para o azul e não distinguem esta cor do verde, demonstrando como a percepção das cores pode variar culturalmente. Estudos modernos confirmam que os Himba conseguem distinguir mais tons de verde do que outros povos ocidentais, mas falham ao tentar diferenciar o azul do verde.

Curiosamente, muitos elementos que percebemos como azuis, como o céu e o mar, não possuem pigmentos dessa cor. A cor azul que vemos é resultado de fenômenos como a dispersão de Rayleigh, que também explica a aparência azul do céu. Até mesmo mirtilos, que parecem azuis, atingem essa cor devido à dispersão de luz na cera de sua superfície, e não por pigmentos. O olhar científico continua a explorar e descobrir que o azul não está presente da forma que imaginamos, mas é uma ilusão criada pela dispersão da luz.

Talvez o alles blau não exista na realidade. Talvez seja uma ilusão da dispersão de sentimentos criada pelo azul do céu quente dos trópicos ou pelo azul do gelo dos países do hemisfério norte.

Giovani Marino Favero é professor associado do Departamento de Biologia Geral da UEPG.

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