Debates
O avanço da diversidade no agronegócio do Brasil
Da Redação | 30 de dezembro de 2021 - 01:03
Por João Guilherme Sabino Ometto
A Covid-19, dentre as duras lições impostas à humanidade,
deixou muito claro não ser mais possível postergar os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Quando instituídos, em
2012, na Conferência Rio+20, seu propósito era substituir os Objetivos do
Milênio, criados em 2000, que expiraram com inexpressivos resultados. Os novos
prazos estabelecidos para os avanços na erradicação da miséria, harmonia
internacional, sustentabilidade ambiental, redução das disparidades,
universalização do ensino e mais saúde terminam em 2030. Restam nove anos,
portanto, para se fazer tudo o que não se conseguiu realizar nas duas primeiras
décadas deste século.
No cumprimento dessa agenda determinante para a economia e o
futuro da Terra, um dos fatores condicionantes é a diversidade, indutora da
justiça social, distribuição de renda, inclusão e combate às desigualdades e
discriminação. Felizmente, o tema tem avançado no Brasil, inclusive no campo.
Segundo o Censo Agro 2017 do IBGE, cerca de 47,9% dos estabelecimentos
agropecuários tinham produtores declarados como brancos e 52,9%, pretos,
indígenas, amarelos e pardos, com predominância destes últimos (42,6%).
Também se nota aumento, ainda que moderado, das lideranças
femininas. As propriedades rurais dirigidas por mulheres representavam 10% das
áreas totais das 5,3 milhões existentes no País. Porém, em número de
estabelecimentos, as dirigentes já eram 18% do total. Na sucessão
familiar, as filhas começam a conquistar mais espaços. A pesquisa
"Governança e gestão do patrimônio das famílias do agronegócio",
divulgada pela Fundação Dom Cabral (FDC) e a J. Valério Gestão e
Desenvolvimento, mostra que 80% dos empreendimentos ainda são comandados pelos
fundadores ou segunda geração. Apenas 16% fazem parte da terceira geração e só
1% são da quarta adiante.
O estudo também apontou que 40% dos negócios possuem um
plano de sucessão e que a transição no comando deve acontecer dos pais aos
filhos e filhas. Apenas 5% dos participantes avaliam a contratação de um executivo
fora do núcleo familiar para gerir o negócio. É interessante notar como ainda é
recente, do ponto de vista histórico, a organização empresarial das atuais
propriedades agrícolas. É óbvio, à medida que os herdeiros vão estudando,
cursando universidades, especialização e pós-graduação, somam conhecimento às
experiências dos antecessores, avançando na agenda da diversidade.
Nesse contexto, também cabe enfatizar o significado das
pequenas propriedades, em especial a agricultura familiar, que continua representando
o maior contingente (77%) dos estabelecimentos agrícolas brasileiros, segundo o
Censo Agro. O segmento é decisivo para a produção de alimentos. Nas culturas
permanentes, responde por 48% do valor da produção de café e banana; nas
temporárias, 80% da mandioca, 69% do abacaxi e 42% do feijão.
Cabe um alerta: o número de propriedades da agricultura
familiar caiu 9,5% no Censo 2017 em relação ao de 2006. Uma das causas disso é
que os filhos dos agricultores estudaram e acabaram deixando seus pequenos
negócios, passando a trabalhar em estabelecimentos rurais maiores ou em outras
atividades. Há, ainda, a reclassificação das unidades e o fato de que algumas
cresceram e mudaram de categoria. Há concretos esforços governamentais,
notadamente da Embrapa, no sentido de apoiar os pequenos e médios negócios
rurais. Porém, é pertinente ponderar que o segmento carece de políticas
públicas cada vez mais adequadas e eficazes, principalmente quanto ao crédito e
ao seguro rural, pois é decisivo para o agronegócio, a economia e a segurança
alimentar.
O meio rural evoluiu em diversidade neste século muito mais
do que nos 100 anos anteriores. Precisa e deverá continuar avançando nessa
agenda, conforme se observa na atitude atual dos produtores e produtoras. A
terra é feminina! Mulher, acolhe e supre todas e todos com imensa generosidade
e inspira a civilização à prática da igualdade de gênero, direitos e deveres
isonômicos e repúdio a todo tipo de discriminação.
*João Guilherme Sabino Ometto é engenheiro (Escola de
Engenharia de São Carlos - EESC/USP), empresário e membro da Academia Nacional
de Agricultura (ANA).