Debates
Lockdown e liberdade de locomoção
Da Redação | 01 de julho de 2020 - 02:31
Por Débora Veneral e Karla Knihs
Palavras repetidas à exaustão e fora de contexto
perdem seu significado. A palavra da moda agora – e que muitas vezes
tem sido empregada erroneamente e esvaziada de seu sentido original
– é lockdown. O termo pode ser traduzido como
“confinamento” e tem sentido diferente dos conceitos de “isolamento
social” e de “quarentena”.
Quarentena, segundo a Lei 13.979/2020, é restrição
de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que
não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte
ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível
propagação de doenças. É, portanto, medida de prevenção de contágio. Após
exposição a COVID-19 recomenda-se 14 dias de quarentena, pois esse é prazo
máximo de incubação do vírus.
Isolamento social, por sua vez, é a separação de
pessoas doentes ou já contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte,
mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a
contaminação ou a propagação do coronavírus. Pode ser feito em casa, ou, em
casos mais graves, no hospital.
Por fim, o lockdown deve ser hoje traduzido como o
confinamento forçado pelo Estado, da população em casa, um isolamento social
rígido, em que há o cerceamento da liberdade de locomoção dos
indivíduos, sendo permitido deslocamento, via de regra, apenas para desempenho
de atividades essenciais ou compra de itens básicos. Assim, o lockdown se
trata de cercear o direito de ir e vir, Direito Fundamental protegido
pela Constituição Federal que, em seu art. 5º afirma ser livre a locomoção no
território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da
lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.
É possível que haja restrição a Direitos Fundamentais
em duas hipóteses, segundo a Constituição: decretação de estado de defesa ou de
estado de sítio. Frise-se que, no Brasil, se decretou apenas estado de
calamidade pública. Assim, em princípio, atos dos Poderes Executivos de
Estados e municípios cerceando a locomoção são inconstitucionais. O
STF, contudo, decidiu recentemente que Estados e Municípios podem
restringir a locomoção das pessoas – ou seja, decretar lockdown – sem
o aval do Governo Federal. Trata-se, portanto, de uma discussão que envolve o
embate entre direitos fundamentais: direito à saúde, direito de
ir e vir e, principalmente, direito à liberdade.
No entanto, em tempos de pandemia é de se lembrar
que o interesse coletivo deve prevalecer ao individual, afinal o
Estado é o maior responsável pela vida, que uma vez perdida, não
há lockdown, quarentena ou isolamento que possa restabelecê-la.
Autoras:
Débora Veneral é advogada e diretora da
Escola Superior de Gestão Pública, Política, Jurídica e Segurança do
Centro Universitário Internacional Uninter.
Karla Knihs é advogada e professora do
Curso de Direito do Centro Universitário Internacional Uninter.