Debates
O medo como portal de abertura para uma consciência coletiva
Da Redação | 25 de março de 2020 - 02:18

Por Simone Fernandes
O corpo emite um sistema
de alerta, o medo. Entretanto este corpo não está separado por espécie
econômica, religiosa, racial ou de gênero, não neste momento histórico em que o
mundo conhece um microorganismo capaz de desestruturar grandes impérios.
O COVID 19 chegou de
botas metendo o pé em toda construção moral que separa a humanidade. Sua
estrutura é semelhante a uma coroa, por isso a metáfora, pois botas são
primeiramente para ser utilizadas em atividades
que demandam gastos de energia mais intensos, como a derrubada de
construções, guerras e aquilo que visa poder e autoridade, mas no viés atual,
dentro da mente humana, a arma mais poderosa do mundo.
Até no mais cético dos
seres que aqui presenciam a peste se alastrando, há a incerteza da continuação
da vida, uma fagulha de medo gerado pela ansiedade e possível estado de pânico
mundial.
Chegou o momento de
levantar as questões acerca de um lar onde temos tudo e nada, este lar é este
Planeta, rico em minerais e informações que colaboram para o bem coletivo, mas que
em alguns momentos da história estes recursos foram segregados e desviados em
sistemas que dividem a única raça existente capaz de gerir igualmente tudo.
Entretanto a discrepância
que encarcera a mente humana com diferenças, fez com que toda riqueza tomasse o
rumo para as mãos de poucos. Surgiu as desigualdades sociais, legitimada por
nós mesmos, seres condicionados por um sistema pervertido, onde os
"achismos" baseados na razoalidade de conformismos, atropelam o
óbvio.
O COVID 19 veio pra
mostrar ao mundo a sua impotência perante a adversidade que coloca todos no
mesmo barco, pra mostrar o quanto somos fracos quando não há coesão, que as
fronteiras são barreiras físicas e ideológicas inexistentes do ponto de vista
universal, mas veio também pra isolar o ser humano em profunda introspecção,
pra tirar o véu que os cega e mostrar que todos somos um e não existe lar fora
daqui.
Há neste momento um
rompante de ideologias globais, sem a firme certeza de uma verdade absoluta
subjetiva, mas levanta um fragmento de verdade objetiva em prol da
sobrevivência da espécie: a solidariedade e compreensão ao qual o mundo vem
reclamando por estar num processo de esgotamento de recursos naturais, por
haver suturas fronteiriças na sua superfície em detrimento do poder.
Talvez este isolamento
mundial esteja nos preparando para a limpeza necessária do nosso lixo mental,
do encarceramento da mente, dos bloqueios impostos pela externalidade negativa
que corrobora para que sejamos algoz da própria espécie.
Um organismo tão pequeno, com estrutura diferenciada e
pouco conhecida foi capaz de frear nossas relações, impor distanciamentos
dentro do nosso próprio lar, ergueu a bandeira do medo e da instabilidade
dentro de todas as dualidades, acendeu o estado de alerta para com todas as
nações do globo.
Um ser invisível aos
nossos olhos trouxe a régua para analisar parâmetros de comportamentos e
desdobrar o leque fechado para tudo que foi construído até agora, seja com a
bondade e solidariedade, seja com a maldade das colonizações impostas aos povos
subjulgados, onde lhes foi decepado a autonomia da mente liberta, condicionando
parte deste planeta à inferioridade humana, através das limitações impostas que
ficaram enraizadas no inconsciente de cada ser que faz parte deste macro organismo
chamado Terra.
Todo este adoecimento
planetário já era previsto através destes comportamentos históricos que
ceifaram a naturalidade de cada ser enquanto indivíduo, que faz parte de um
corpo dentro de um universo que expande e não restringe, que alteraram os
ciclos naturais através do desenfreado consumismo mundial, onde ter significa
muito mais que ser.
Está muito próximo do fim
o status ilusório em ser vip. Pobre e rico se encontram na mesma situação
dentro de hospitais no mais alto temor que abarca a sociedade: a morte!
Não há fuga para lugar
algum fora deste Pálido Ponto Azul e sim, há uma constante universal que para
que algo nasça, algo morre. Se esta não atingir nosso corpo físico, que atinja
nosso ego, nossos preconceitos, nossos muros. Que consigamos olhar com menos
desprezo todas as criaturas que aqui se encontram, todas têm uma função que
colaboram para que a humanidade caminhe por estradas menos pedregosas, para uma
sintonia com algo muito maior que nossos olhos podem ver, mas que podemos
sentir e está registrado no processador informacional íntimo de cada um.
Historicamente falando, o
caos mundial sempre alavancou avanços na área do conhecimento, é como um
gatilho que dispara, mas que diferente das guerras armadas em detrimento de
poderio territorial e econômico, o cenário atual é palco de todos os agentes
que fazem parte deste plano. Como vamos lidar com isso advém da nossa
capacidade de organização em massa, como uma marcha individual e por ora, de
obediência ao que o mundo pede: isolamento, introspecção, busca pelo
conhecimento, respeito como todos os seres, clareza mental sobre o que
realmente precisamos para que todos evoluam sem disparidades.
A maior constante
universal é a mudança, exteriorizada pela nossa visão de mundo e internalizada
por nós mesmos, tendo como eixo nossas relações com o próximo, pois nada nem
ninguém caminha sozinho neste mundo, precisamos das relações sociais para nossa
construção, mas que se desconstrua tudo aquilo que gerenciou até agora nossa
separação.
Neste momento as mãos não podem ser dadas, a separação de corpos é, por ora, necessária. O COVID 19 impôs barreiras que já vínhamos construindo inconscientemente, mas este pequeno organismo levanta a pesada bandeira da unidade fragmentada que deve unir-se para atar laços entre as nações, para um mundo onde tenhamos um estreitamento diplomático sadio e limpo.
Simone Fernandes - Professora e Operadora de
Produção na área industrial