Debates
Prevenção da gravidez na adolescência
Da Redação | 06 de fevereiro de 2020 - 02:05
Por Mariana Bazzo e Ângela Leite Mendes
Prevista no novo artigo 8.º- A do Estatuto da
Criança e do Adolescente, a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na
Adolescência está ocorrendo em todo o país desde o dia 1.º de fevereiro, com o
objetivo de disseminar informações sobre medidas preventivas e educativas que
contribuam para a redução da incidência da gravidez na adolescência. O Brasil
ocupa o infeliz quarto lugar em uniões precoces num ranking de 20 países.
Segundo a ONG Plan International, “normas e papéis sociais tradicionais e
desiguais de gênero, pobreza e falta de oportunidades, gravidez não planejada,
violência sexual e insuficiência legal e de políticas públicas” são as
possíveis causas para os casamentos e/ou as uniões precoces.
É preciso ressaltar que a prática é considerada
internacionalmente uma violação dos direitos humanos (segundo o ODS 5, da
Agenda 2030 da ONU), está diretamente associada à gravidez precoce e suas
consequências são múltiplos riscos às jovens mães, tais como ausência de
escolaridade e independência financeira, e às crianças por elas geradas, as
quais se encontram no grupo dos mais elevados índices de mortalidade antes dos
5 anos e desnutrição.
Mas quais seriam as medidas preventivas que de fato
contribuem para a redução da incidência de gravidez na adolescência, nos exatos
termos trazidos pela redação da lei? Eventuais orientações sobre abstinência
podem ser uma opção para as adolescentes dentro de sua esfera de decisão, além
de outras políticas públicas para reverterem preocupantes índices brasileiros
de gravidez e casamentos precoces. Além do incremento para abertura de diálogo
sobre o assunto entre pais e filhos, o enfrentamento da gestação na
adolescência deve incluir ações de educação no ambiente escolar, associadas ao
amplo acesso a contraceptivos e ao acolhimento das jovens nos serviços da rede
de saúde.
Em Curitiba, a partir de trabalho intensivo da Secretaria
Municipal de Saúde neste sentido, observou-se uma queda considerável de número
de gestações precoces de mães com menos de 20 anos entre os anos 2000 (5.553
nascimentos) e 2018 (1.851 nascimentos). Inicialmente, realizou-se o mapeamento
dos indicadores contidos em banco de dados epidemiológicos a fim de localizar
áreas de maior vulnerabilidade com altos índices de adolescentes gestantes. Por
meio da estruturação, desenvolvimento e aplicação de oficinas personalizadas de
prevenção e promoção de saúde aos grupos identificados, sensibilização de forma
teórico-vivencial de profissionais da saúde e assistência intersetorial
atuantes nos territórios, houve criação de um ambiente propício à escuta, ao
questionamento e à reflexão. Depois, foi percebida redução de casos de gestação
na adolescência nas áreas trabalhadas, manutenção da metodologia em ações locais
e melhora na abordagem e acolhimento pelos profissionais.
A gravidez na adolescência continua sendo um desafio para
gestores públicos e toda a sociedade. Atuação intersetorial (educação, ação
social, trabalho e emprego, esporte e juventude, cultura, conselhos de
direitos, lideranças comunitárias, Ministério Público, entre outros),
levantamento de aspectos biopsicossociais, observação da existência e
necessidade de intervenção mostram-se eficazes para redução da gravidez na
adolescência sem deixar de se considerarem direitos sexuais/reprodutivos e
autonomia.
Verifica-se grande avanço da legislação protetiva dos
direitos da infância e juventude ao se trazer a temática em tela para o texto
do ECA. Contudo, metas, índices e resultados – ou seja, evidências científicas
e estatísticas, tais como as expostas na capital do Paraná – devem embasar
políticas públicas efetivas para a solução de tão grave problemática.
Mariana Bazzo é Promotora de Justiça do MPPR
Ângela Leite Mendes é Médica ginecologista da Secretaria de Saúde de Curitiba