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Seria um domingo qualquer se não fosse agosto

Imagem ilustrativa da imagem Seria um domingo qualquer se não fosse agosto

Por Giovani Marino Favero

                Refletindo sobre as características próprias do mês corrente, deitei novamente a colher de sorvete sobre o criado-mudo. Neste domingo o ar está tão especialmente carregado que ao levantar peguei a colher e comecei a fazer bolotas com a atmosfera que me cercava. Em pouco tempo tinha uma piscina de bolinhas ao meu redor.

                Geralmente quando inicio um texto já tenho seu final em mente. Desta vez não e não estou preocupado com isso. Afinal, a leitura anda pouco interessante para a maioria das pessoas nos dias atuais e os poucos amigos que lerão esse texto farão unicamente por amizade.

                Instalei o spot fy, (não sei se é assim que se escreve) no celular. Na verdade foi minha esposa quem instalou. Resolvi dar algum direcionamento musical no aplicativo e com surpresa percebi que o “robô” me conhece. Talvez até melhor do que eu mesmo, já que estou a mais de quatro horas sem escolher as músicas e a sequência parece feita especialmente para meu gosto.

                Nesse domingo aparentemente ordinário uma avalanche de pensamentos me vem a mente. Chuva quer vir, mas não vem. Bebo. Gosto de beber aos domingos por que me lembra a turma dos velhos na casa de minha avó e como era bom beber o dia todo e filosofar com um pitaco de deboche característico da italianada. A vida é como uma nuvem passageira. Meu pai adorava essa música e eu pouco a escuto, me deixa deprimido. Meus cabelos quase não existem mais, e daí? Meu filho está montando o álbum do Flamengo, acabou de pegar uma figurinha do Zico no final da carreira, está mais forte, bem diferente do Galinho do final dos anos setenta, mas é o mesmo herói de uma nação em um país carente. No futebol de sábado um amigo recente tenta esconder a queda frenética de cabelo puxando as madeixas que lhe resta para frente, já fiz isso, talvez ainda faça. Quem se importa com quem? Enquanto escuto Blind Melon, uma banda injustiçada pelo mercado, penso em cabelos, idade e sonoridade musical. Repentinamente um colega de universidade me envia mensagens. Não queremos trabalhar aos finais de semana, mas não conseguimos nos desligar de um ideal. Nunca achei que teria cargo administrativo no sistema público, mas nunca me imaginei alheio ao que acredito. Havendo um ideal e uma mudança de mais de quarenta anos, conte comigo.

                Queria controlar minha hiperatividade, mas desde que me conheço tento isso. Gostaria de dormir sem remorso. Lembro sempre da história do Dr.Willian Stewart Halsted, o cirurgião que desenvolveu a técnica da mastectomia radical. Ele acreditava que dormir era besteria e queria ficar acordado o tempo todo, fez muito, mas acabou louco. Sorte minha que agosto só dura 31 dias.

                Nesse ano, dia 01 fez 4 anos da morte de meu pai. No dia 02, minha filha primogênita fez 12 anos e está cada vez mais parecida fisicamente com minha esposa e me surpreende positivamente pelo gosto de ter a família próximo dela como uma verdadeira italianinha do papai. Dia 3,4,5,6... assim vai. Não sei o que há historicamente, mas sei que são dias de um mês que me perturba.

                Tiro uma foto no estilo “self”, não para publicar. Não tenho devotos e não quero ter nesse momento, mas imagino a cena que realmente vejo: um jovem senhor bebendo, escrevendo e escutando música dos anos noventa. Esse sou eu, forte como o Zico da figurinha no final de carreira, fraco como todos que sabem que não há força ou forma de vencer o tempo.

Giovani Marino Favero é Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduação da UEPG, possui vários artigos, livros e crônicas publicados.

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