Debates
Primeiro emprego: empresas precisam ‘jogar a corda’ para os jovens do Brasil
Da Redação | 24 de novembro de 2022 - 00:28
Por Alecsandra Neri
Há tempos os jovens brasileiros já entenderam que a
qualificação profissional é o caminho para aumentar a empregabilidade
fundamental para que eles possam continuar a formação universitária. Segundo o
estudo intitulado “Síntese”, organizado pelo Instituto da Oportunidade Social (IOS),
87,4% dos alunos que se formam no ensino médio vêm da rede pública no país,
porém apenas 18% dos jovens com até 25 anos de idade buscam graduação e 74%
deles cursam a graduação no ensino particular.
Os números deixam evidente que sem emprego eles não
conseguem dar continuidade à formação universitária, que as empresas insistem
em exigir na ordem inversa. Primeiro é preciso dar a oportunidade de emprego,
depois exigir a formação.
Os dados apontam ainda que a população jovem do Brasil é,
atualmente, a maior da história - são mais de 47 milhões de pessoas entre 15 e
29 anos. Também é a mais afetada pelo desemprego no Brasil.
O tão sonhado primeiro emprego é a corda que transportará
esses jovens do desalento para uma realidade profissional mais justa e
promissora. Eles precisam de emprego para bancar os estudos.
Os programas de primeiro emprego destinados às juventudes
são cobrados das empresas e devem ser encarados por elas como ação social de
fato. Porque é. O emprego é tudo o que o jovem precisa.
Um ranking divulgado recentemente pela OCDE (Education a
Glace 2022) coloca o Brasil em 2º entre os países onde os jovens de 18 a 24
anos não trabalham e nem estudam, registrando um índice de 35,9%, atrás apenas
da África do Sul com 46,2%. As empresas aqui instaladas ainda resistem em dar
oportunidades aos jovens. A começar pelas exigências curriculares, que quase
nunca condizem com a realidade da maioria da população jovem. As oportunidades
estão mais acessíveis para aqueles com mais privilégios.
Injustamente, os jovens mais distantes das oportunidades,
ainda são acusados de não promoverem seu próprio desenvolvimento, o que não é
verdade. De acordo com dados do IBGE, em 2019, o país registrou 9,3 milhões de
estudantes no ensino médio, dos quais 7,1% frequentavam algum tipo de curso
técnico. A pandemia acelerou esse processo e
procura por qualificação profissionalizante tem aumentado. Eles já entenderam
que os cursos complementares ajudam no aumento das oportunidades de trabalho.
Esses cursos -- muitos deles gratuitos -- são apoiados e
financiados por ONGs em parceria com empresas e se dedicam a qualificar esse
jovem e prepará-lo para o trabalho, trazendo não apenas o ensino técnico, mas
atuando nas soft skills e na extensão de raciocínio lógico e comunicação e
expressão.
Esse é o caminho que as empresas, em especial as do setor de
Tecnologia, tem percorrido para formar em tempo hábil, novos talentos para
ocupar inúmeras vagas que não param de surgir. Até 2025, segundo a Brasscom
(Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação),
serão 800 mil vagas a serem preenchidas e não haverá profissionais o suficiente
para ocupá-las. Isso já está ocorrendo.
Recorrer à formação profissional de jovens pode e deve
ajustar esse quadro e fazer essa conta bater. Muitas empresas têm investido
nesse modelo de formação. Mas é preciso ir além. Somente formar não resolve. É
preciso abrir essa frente do primeiro emprego. É preciso empregar os jovens que
ajudamos a formar, em especial aqueles em situação de vulnerabilidade social.
Essa ‘corda jogada’ é a real contribuição para o
desenvolvimento profissional das juventudes e pode trazer às empresas muito
mais benefícios às empresas do que simplesmente cumprir a obrigatoriedade da
Lei do Aprendiz.
Esse jovem, que passa por uma formação de qualidade,
especializada e técnica, chega às empresas já com conhecimentos da rotina
corporativa. Nos bons cursos de formação profissional, eles aprendem desde
montar apresentações, projetos, até a utilizar as ferramentas digitais mais
atuais que o mercado demanda em tempo hábil.
Outra vantagem é que ao empregá-los as empresas contribuem
de fato na geração de impacto social positivo e, a partir daí, completam as
suas agendas com o foco em ESG. Um estudo do IOS indica que um jovem que está
formado em seus cursos, quando inicia no primeiro emprego consegue incrementar
a sua renda familiar em 54%. Isso é impacto social positivo.
Ainda com relação às demandas ESG, esses jovens, que no
geral, são oriundos de escola públicas, de bairros periféricos e ligados aos
marcadores sociais, contribuem para aumentar a diversidade dentro das empresas.
Soma-se aos benefícios do primeiro emprego a esses jovens
que fizeram os cursos de formação profissional, um custo a menos para as
empresas com qualificação e treinamento. Isso porque eles já chegam treinados
nas companhias, prontos e com soft skills atualizadas e desenvolvidas. É um
jovem que já chega com referência porque foi indicado pela ONG responsável pelo
curso e que vai acompanhá-lo, mesmo após a formação. Tudo para garantir seu
sucesso profissional e ao mesmo tempo atender à necessidade da empresa por
novos talentos.
Além de todos esses benefícios, o principal deles vai bem
além das questões financeiras. Trata-se da gratidão desse jovem por ter uma
porta aberta, uma corda jogada. A primeira oportunidade tem um valor
diferenciado para o jovem periférico. Esse valor é percebido no seu menor
turnover quando ingressa no mundo do trabalho. Por outro lado, a gestão
empresarial carrega mais humanização e práticas de ESG essenciais junto ao seu
capital humano.
Alecsandra Neri é gestora de operações do Instituto da Oportunidade Social - IOS. Graduada em Matemática e pós-graduada em Administração de Empresas e Gestão.