Debates
A pandemia nos fez mais solidários?
Da Redação | 14 de janeiro de 2022 - 01:51
Por Carolina Piva
Crises costumam ser impulsionadoras da solidariedade. Ao
longo dos últimos meses, muitas pessoas se mostraram abertas a olhar para o
próximo e, principalmente, despertaram para as necessidades das engrenagens que
fazem um sistema de saúde público funcionar. Em meio a tantas
dificuldades, se descobriram caminhos possíveis para captar recursos
financeiros, e as ações de filantropia tomaram corpo para ajudar a fortalecer a
saúde do Brasil.
Desde a chegada do coronavírus, empresas, ONGs e a sociedade
civil doaram cerca de R$ 7 bilhões para causas ligadas à covid-19, de acordo
com dados do Monitor de Doações da Associação Brasileira de Captadores de
Recursos. Mas o volume de doações não acompanhou o avanço da doença no Brasil.
O aprofundamento da crise econômica no país atingiu com força o repasse de
recursos pelas empresas, que recuaram com a incerteza que tomou conta dos
mercados. Nesse cenário, os movimentos sociais lutam para colocar mais elos na
corrente solidária formada em 2020.
Adaptações e aprendizados diários são o caminho para
estabelecer novas estratégias. Dentro de um hospital com atendimento 100%
do Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, a busca por recursos é um
trabalho extremamente desafiador. Os hospitais filantrópicos padecem com a
gestão de seus orçamentos devido à tabela deficitária de pagamentos do SUS. A
captação se torna uma necessidade urgente, que começa no relacionamento
com parlamentares em busca da destinação de emendas, passa pelo contato com
empresas para conseguir patrocínio e chega até as pessoas físicas, que podem
destinar uma parte do seu imposto de renda ou simplesmente doar notas fiscais.
A principal ferramenta é sempre a sinceridade. Expor a
realidade é importante para o início de qualquer conversa. Contar como
funcionam os bastidores do atendimento universal de uma instituição
filantrópica e como existem pessoas que se dedicam para a construção desse
ideal é uma forma de gerar um despertar altruísta. Mas, apesar das diversas
metodologias disponíveis, nem sempre é fácil sensibilizar os decisores da
importância que as doações têm para a manutenção de um hospital. Porém, estamos
sentindo que a cada dia, sobretudo o setor empresarial, que ainda é o maior
desafio, está olhando para a filantropia e entendendo que, quando uma sociedade
cresce de forma igualitária, quem ganha somos todos nós.
Não é possível prever o futuro, mas, mesmo assim, é possível
traçar táticas para se reinventar e se adequar ao que o novo normal reserva e,
dessa forma, garantir sobrevivência no momento atual e também depois. O ano de
2021 foi difícil, mas, ainda assim, foi possível somar várias conquistas.
Agora, para 2022, a palavra é esperança de uma recuperação na economia que
possibilite um aumento nas doações, melhora na saúde geral da população para
desafogar as operações e retomada das atividades presenciais. A quarentena
tirou das entidades recursos geralmente obtidos em eventos presenciais, como
bazares e brechós. Coube então aos gestores recorrer às vendas por lojas
on-line próprias ou de parceiros, para repor parte dessas perdas.
Enfrentar os desafios e expandir o alcance do investimento
filantrópico também significa ampliar a disponibilidade de recursos para ações
de desenvolvimento de diferentes setores. Essa expansão não é só urgente, como
fundamental. A filantropia vai muito além do assistencialismo ou da caridade.
Ela realiza mudanças estratégicas e efetivas, servindo como pontapé para
alavancar projetos de impacto para a sociedade. Da gripe espanhola à covid-19,
as ações filantrópicas tiveram papel importante na promoção da saúde e
continuarão a ter. Independentemente das novas doenças que virão, o sistema de
saúde precisa ser, acima de tudo, humano.
O ato de doar faz tão bem para quem doa quanto para quem recebe. O sentimento de pertencimento ao grupo que efetivamente está fazendo algo para construir uma sociedade melhor nos torna pessoas mais empáticas, com uma visão de mundo mais abrangente. O resultado disso é vivermos em um mundo mais aberto ao novo e pacífico, porque, quanto melhor estiver o nosso entorno, melhor todos estaremos. Juntos, podemos cobrar e agir para que nenhum brasileiro perca a vida e deixe seus sonhos e familiares por falta de leito, equipamentos ou empatia.
Carolina Piva, gerente de Marketing e Mobilização de
Recursos da Saúde do Grupo Marista