Debates
Gestão dos resíduos sólidos é oportunidade de transformar o futuro
Da Redação | 08 de janeiro de 2021 - 02:54
Por Aylla Kipper
Quando falamos em gestão de resíduos sólidos surge a dúvida
sobre o que são. Por isso, antes de tratar diretamente sobre a gestão, vale
salientar que resíduos sólidos são materiais ou substâncias produzidas por
diversas atividades humanas que, após o uso, podem ser direcionados a processos
de transformação. Por isso, são diferenciados de rejeitos, conforme definição
apresentada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
Esses resíduos podem ser domiciliares, industriais ou de
limpeza urbana. Cada tipo de resíduo determina como ele deve ser tratado e
reaproveitado. Para que a destinação correta desse resíduo seja aplicada e os
setores econômicos desenvolvam alternativas para a coleta e o tratamento de
resíduos pós consumo, existe a PNRS, lei que completou dez anos em 2020. Mas,
mesmo após esse tempo, há ainda dificuldades para implementação das regras.
Instituída pela lei 12.305/2010, a PNRS estabelece os
instrumentos para avanços na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos no
território nacional, mediante articulação entre as diferentes esferas do poder
público com o setor empresarial, com o propósito de cooperação para atender o
objetivo da lei, que de uma forma geral é garantir a proteção da saúde pública
e da qualidade ambiental. Mas para atingir essa meta, são diversos os pilares
necessários, como a não geração, redução, reutilização e reciclagem e
tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente
adequada dos rejeitos.
A PNRS estabelece ainda, entre os objetivos, o estímulo à
adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços, a
adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de
minimizar impactos ambientais; e o incentivo ao desenvolvimento de
sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos
processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos.
O caminho é longo, entretanto. Para se ter uma ideia, a
média de reciclagem no Brasil não passou de 3,7% em 2019, segundo o Índice de
Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU). De acordo com o índice, as regiões
que menos reciclam são Nordeste, Norte e Centro-Oeste, onde os índices não
ultrapassam os 2%.
Há diversas regras para a coleta e o descarte legal dos
resíduos, principalmente para que sejam estudadas formas de transformação.
Assim, possibilitam que o resíduo volte ao uso, com o que chamamos de valor
agregado, ou seja, reinserido para uma nova função, criando a cadeia de
economia circular. A ideia é valorizar os processos de reciclagem, gerando o
mínimo de lixo. Entretanto, um dos grandes problemas encontrados está
justamente no início dessa operação, isto é, na separação e destinação adequada
pela sociedade.
Dando foco no papel das pequenas, médias e grandes
indústrias, que são geradoras de resíduos sólidos em alta quantidade, estudos
indicam que, como muitas empresas estão em regiões distantes, principalmente do
interior, o custo para solicitar a coleta de resíduos é alto, já que se analisa
o peso e a quilometragem para esse cálculo.
Por isso, infelizmente, algumas empresas optam pelo formato
mais fácil, que acaba sendo prejudicial ao meio ambiente. Descartam esses
resíduos como forma de rejeito, o que faz com que muitos materiais que podem
ser transformados em novos produtos não sejam. Além disso, há as coletas
clandestinas, que impedem que os resíduos gerem economia circular e tenham uma
nova vida útil, pois acabam sendo descartados diretamente no meio ambiente ou
em lixões, o que pode causar grandes impactos ambientais.
Ou seja, para que haja uma gestão de resíduos sólidos
segura, o ponto principal é agir para que os consumidores separem adequadamente
os resíduos pós consumo e que a coleta chegue aos locais geradores dos
resíduos. Para a coleta dois fatores são importantes: primeiro que os geradores
se atentem em certificar se o resíduo terá o destino ideal. Uma das formas de
identificar isso é por meio do Certificado de Coleta, que possibilita a
rastreabilidade da cadeia de custódia e certidões de destinação correta.
O outro fator parte dos poderes de fiscalização. O
Ministério Público tem em sua estrutura órgãos capazes de auxiliar nas demandas
de implementação e fiscalização ambiental e sanitária. Entretanto, é evidente
que há uma defasagem nessa questão, já que, infelizmente, notamos a existência
do mercado ilegal que envolve desde a coleta, até pontos de lixões e aterros
irregulares pelo país.
Para que essas ações sejam colocadas em prática e,
principalmente, qualificar a fiscalização, os Estados precisam agir em
conformidade com a PNRS. O Estado de São Paulo, por exemplo, desde 2006 conta
com a Política Estadual de Resíduos Sólidos (PERS), Lei nº 12.200/2006, que
mantém um conjunto de princípios e diretrizes para a gestão dos resíduos
sólidos gerados no território. E entre os agentes fiscalizadores tem a
Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), que atua no monitoramento
das atividades geradoras de poluição.
Já em 2014 foi lançado o Plano de Resíduos Sólidos do
Estado. O documento une ações em conformidade com a lei para aplicação pública
e privada. Inclusive, estava em consulta pública até novembro desse ano. Dessa
forma, tanto a sociedade civil quanto as empresas que atuam no setor poderiam
se manifestar por meio de questionamentos e sugestões de ações.
Diante do cenário atual e das discussões acerca da gestão de
resíduos do país, sabemos que ainda temos um longo caminho para atingir os
níveis esperados de coleta, recuperação e reciclagem desses resíduos sólidos,
considerados pós-consumo. Mas é importante estarmos alinhados com as novas
tecnologias e possibilidades de transformações desses itens para, assim,
garantirmos que essa gestão de resíduos atinja os resultados de
sustentabilidade que precisamos para um futuro melhor.
Aylla Kipper é gerente de relações institucionais e
sustentabilidade da Lwart Soluções Ambientais e vice-presidente da AMBIOLUC,
entidade que representa a logística reversa do setor de rerrefino de óleo
lubrificante usado no País.