Debates
O rendimento escolar para além do Pisa
Da Redação | 11 de dezembro de 2019 - 02:33
Por Luiz Claudio Romanelli
"Não basta ensinar ao homem uma especialidade, porque se tornará assim uma máquina utilizável e não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, senso prático daquilo que vale a pena ser empreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto” (Albert Einstein)
Semana passada o país novamente foi sacudido pelos
resultados nada animadores divulgados pela OCDE, o famoso clube dos países
ricos que tanto o Brasil quer entrar.
A divulgação do ranking do Pisa (Programa Internacional de
Avaliação de Estudantes) mostrou o Brasil entre as 20 piores colocações no
ranking das três áreas (ciências, matemática e leitura) analisadas na principal
avaliação da educação básica no mundo. É fato que o Pisa só avalia a educação
pública, como de resto também todos os outros indicadores, com exceção do Enem,
o que nos impede de uma radiografia mais profunda em nosso país, inclusive
sobre as causas da desigualdade, que só aumenta.
Quando falamos em Educação e nas ferramentas utilizadas para
se medir o resultado do processo de ensino aprendizagem, deve-se relativizar a
importância dada às avaliações como o Pisa. Esse método traz consigo dados que
são, em essência, genéricos quanto aos alunos e pontuais naquilo que concerne o
currículo escolar.
Na contramão desse viés universalista, a atenção do gestor
público deve ser o mais individualizado quanto possível, uma vez que os
problemas educacionais são essencialmente regionais ou, ainda, locais.
Alguém duvida que há diferenças gritantes nas realidades
educacionais de um estudante que vive nos grandes centros urbanos e outro do
que vive nos pequenos municípios nas áreas rurais? Para além dos espaços,
infraestrutura e condições físicas, as construções intelectuais são diferentes,
mesmo com avanço tecnológico e de acesso à informação.
Abro um parêntese aqui para explicitar a que me refiro
quando falo de infraestrutura e condições físicas – um estudante nas áreas
rurais, parte das vezes, convive a precarização da escola, longas distâncias a
percorrer, a má ou falta de alimentação adequada, ausência de tecnologias e
demais recursos pedagógicas que podem apoiar o aprendizado, dentre tantos
outros fatores que promovem o que denomino de desigualdade educacional.
Do ponto de vista pedagógico, em um estado que tem mais de
quatro mil escolas públicas, com as mais diferentes realidades entre os mais
quase três de milhões de alunos (incluindo a rede privada), há que se pensar em
sair do discurso bonito e partir para prática do tratamento diferente a quem é
diferente. O desenvolvimento dos mais diversos tipos de ferramentas e
metodologias, talvez seja o passo mais importante para a melhoria que a
educação pública precisa para mudar de patamar no estado e no país.
O processo de avaliação proposto pelas entidades
internacionais é extremamente precário em relação às idiossincrasias de cada
região e as vicissitudes da vida de cada estudante. Tais avaliações tendem a
isolar um determinado conhecimento, escanteando as diferenças sociais,
territoriais, culturais e econômicas para uma posterior aferição de rendimento.
Ocorre que o aprendizado tende a ser cada vez mais global, a educação deve ser menos
pontual e mais abrangente, respeitando as características próprias do estudante
na sua totalidade e realidade social.
A busca por soluções para a educação deve ser feita em um
amplo debate e protagonizado pelos próprios estudantes, professores, comunidade
escolar, sociedade civil em geral que, por vezes, historicamente foram alijados
do processo decisório de políticas e programas voltados à sua própria
realidade.
As dificuldades são conhecidas. As forças políticas, a
complexidade administrativa, a inter-relação entre diferentes culturas,
certamente a educação como qualquer outra área pública de grande espectro sofre
diante dessas demandas. Somente o professor e o estudante, além dos
profissionais da área (pedagogos, corpo diretivo das escolas) sabem o que
acontece dentro da sala de aula. A administração pública, parte das vezes,
desconhece essa realidade.
Se maior parte da administração não conhece as
particularidades desse universo, imaginem o olhar global que tem a Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – mesmo sem diminuir, é
claro, a respeitabilidade e a importância dessa instituição.
Pois bem, como melhorar a qualidade da educação no Brasil em
um Território de porte continental, onde apenas 54,3% dos estudantes concluem o
ensino médio?
Do ponto de vista de quem acompanha de perto as discussões
aqui no Paraná, entendi que podemos implantar mecanismos legítimos de avaliação
educacional – não para finalidade de ranqueamento, mas de melhoria, sendo que
além avaliar os estudantes, avalie também as condições de trabalho do
professor, a qualidade dos equipamentos em sala de aula, os investimento e efetivação
das políticas públicas.
Essa estrutura de avaliação deve nortear a busca por
lacunas, falhas que podem derivar da precariedade das escolas públicas, da
formação do professor, de questões relativas ao estudante, em suas mais variadas
formas de apresentação.
A gestão da educação deve ser repensada. Precisamos de uma
nova educação, apoiada no desenvolvimento de competências, em novas estratégias
para o processo ensino aprendizagem, e acima de tudo, de gestores preparados.
Precisamos repensar a missão da escola para este século.
É preciso que a escola seja um espaço acolhedor, de
aproximação entre estudantes e professores, tornando o processo educacional
mais atrativo, com novos métodos pedagógicos – que visem um olhar ao estudante
por meio da sua história, da sua realidade. Uma escola propositiva e
compromissada com a educação, certamente deverá romper com os muros que as dividem
da sociedade.
A proposição de ideias, melhorias e mudanças para a educação
deve ser amplamente discutida, e a participação social é de extrema importância
nesse processo. Projetos aprovados no Congresso Nacional e nos legislativos
estaduais e municipais apontam para a importância de um sistema educacional
mais reforçado.
Para além de todo conteúdo, tonar-se urgente que se criem
algumas premissas a serem seguidas para que nosso processo educacional avance e
consiga formar estudantes de maneira mais efetiva nas escolas públicas
brasileiras.
A ferramenta essencial desta melhoria reside, portanto, não
apenas nas mãos dos professores, mas de todo o arsenal que gira em torno da
educação, do planejamento à infraestrutura.
O desenvolvimento educacional deve, então, passar por uma
relação – muito precária no Brasil – que está no envolvimento simbiótico entre
as escolas de ensino básico e as instituições de ensino e pesquisa no ensino
superior. A integração universidade – educação básica é, também, um passo
fundamental, visto que precisamos formas educadores que possam entender as necessidades
do chão da escola.
As formações inicial e continuada devem estar alinhadas com
as necessidades diárias a que os professores estão submetidos todos os dias,
possibilitando para além da formação em sua específica, acesso a um universo
cultural mais amplo, que o torne um intelectual produtivo e orgânico, com
acesso à lazer, à literatura, à música, ao cinema e ao esporte, podendo depois,
compartilhar as vivências em sala de aula.
Sou favorável que o poder público, ao invés da crítica aos
números obtidos pelo desempenho nas provas, promova o urgente debate do que é
necessário para que tenhamos de fato, os olhares voltados ao processo de ensino
aprendizagem, e não à mensuração estanque de notas específicas, que devem
servir de alerta, mas jamais de guia.
Concluo com um paradoxo que deve servir de reflexão para
todos: no Paraná a excelência da qualidade de ensino superior está nas
universidades públicas, já na educação básica está na rede privada, como
superar essa dicotomia?
Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana,
é deputado estadual e vice-presidente do PSB do Paraná.