Debates
O cinema não pensa mais
Da Redação | 16 de maio de 2019 - 01:21
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Ao assistir a um filme, você já teve a impressão de saber o
final? Isso não ocorre somente pela sua capacidade dedutiva, mas porque existem
determinados padrões de produção de roteiros que inundam os grandes estúdios
com a finalidade de garantir os seus lucros. Ou seja, os enredos simples e os
personagens com os quais o espectador já está habituado garantem grande público
— o que explica porque a franquia Velozes e Furiosos está na produção
do seu 9° filme e a Marvel já lançou mais de duas dezenas de títulos desde
2007.
Os filmes de franquia apresentam-nos os mesmos personagens
em situações análogas, de modo que o maior atrativo para o público não é a
narrativa, mas os efeitos especiais, quer seja a quantidade de explosões, os
tiros ou malabarismos exibidos em tela da forma mais frenética possível. No
entanto, nem sempre foi assim.
Quando o cinematógrafo foi criado pelos irmãos Lumière, os
primeiros filmes registravam pessoas em situações cotidianas, antecedendo os
documentários. As produções encomendadas por Thomas Edison eram filmadas em
estúdios com atores provenientes do teatro, o que culminaria com as premissas
do cinema ficcional, gênero que dominou as telas comercialmente em relação às
obras documentais.
A partir daí, foi necessário aprender a contar histórias
através das câmeras e dos processos de edição. O cineasta Jean Luc Godard
chegou a dizer que “a câmera escreve”, o que torna possível aproximar o cinema
das outras formas de contar histórias, tanto oralmente, como por meio da
literatura. Nesse sentido, é possível apontar uma série de investigações
provenientes das pesquisas literárias ou que dialogam com elas, influenciando
as produções cinematográficas.
O livro O Herói de Mil Faces (por exemplo) do
mitologista Joseph Campbell nos apresenta o conceito de “narratologia”,
referindo-se ao estudo das narrativas de ficção e não ficção. Campbell identifica
um padrão básico na composição das mitologias de diversas culturas, trazendo à
tona a possibilidade de apoiar-se em determinados padrões para se contar uma
história, o que influenciou os trabalhos de diretores como George Lucas e
Francis Ford Copolla.
Syd Field recorreu a ferramentas da narratologia para
escrever livros como o Roteiro – Os Fundamentos do Roteirismo e Manual
do Roteiro, apresentando à indústria fílmica o conceito de “paradigma”, que
oferece certos padrões para se escrever um roteiro e definindo elementos
essenciais, tais como a quantidade de atos e o tempo que o filme deve durar.
Agora sabemos porque somos capazes de saber o que acontecerá
no final dos filmes a que assistimos. Minha crítica não está direcionada à
narratologia, mas à falta de coragem de quem resiste em contar novas histórias
ou contá-las fora dos moldes pré-estabelecidos, como fizeram o Cinema Novo no
Brasil, o Neorrealismo na Itália ou a Nouvelle Vague na França.
Douglas Henrique Antunes Lopes é professor do Centro
Universitário Internacional Uninter. Atua nos cursos de Filosofia, Serviço
Social e Pedagogia, além do Curso de Extensão Cineclube Luz, Filosofia e Ação.