Cotidiano
Restauro de livros na UEPG traz trabalho a presos
O trabalho no Hospital de Livros garantiu a remissão de parte da pena em regime fechado
Da Redação | 17 de agosto de 2019 - 00:22
O trabalho no Hospital de Livros garantiu a remissão de
parte da pena em regime fechado
"Trabalhar com livros me traz liberdade". É com
brilho nos olhos que William fala sobre livros, arte e ilustrações. Ele é um
dos detentos que trabalha na UEPG para remição de pena, a partir de uma
parceria com o Departamento Penitenciário do Estado do Paraná.
Na biblioteca da UEPG, William está aprendendo um ofício que
une o que ele já gostava de fazer com uma possível atuação profissional depois
de cumprir sua pena: a restauração de livros. Com a orientação de Benjamin dos
Santos Rego, servidor da UEPG que já atuou no restauro de livros, ele está
aprendendo a recuperar capas, fazer costuras, encadernações e outros reparos. E
presta atenção em cada lição: o caderno de anotações já é um manual de
restauração, com desenhos caprichados e descrições detalhadas do passo-a-passo
de cada procedimento. Além da biblioteca, ele também trabalha três dias por
semana no Museu Campos Gerais, onde aprende a conservar o acervo de livros,
documentos, fotografias e negativos.
"Os livros mudaram minha vida. Chegou um dia em que
entrei na cela e percebi que não me encaixava mais naquele ambiente. Minha
cabeça era outra", conta o detento, que cumpre pena por tráfico de drogas.
"Quero que minha filha pense em mim como o pai que desenha, que restaura
livros".
Quando ainda estava no regime fechado, William já
participava, desde 2016, do "Hospital de Livros", projeto do
Instituto Pegaí na Penitenciária Estadual de Ponta Grossa (PEPG). O espaço é
uma espécie de oficina, em que os detentos recuperam livros danificados para
retornar à circulação gratuita. "Quando não dava para aproveitar a capa, a
gente colocava uma capa branca, de cartolina. E eu achava que ficava sem vida,
sem graça. Quem ia pegar um livro sem capa para ler?", conta William.
Foi aí que ele resolveu unir a ilustração, dom que já tinha,
com os livros, com os quais ainda não tinha tido muito contato. "Peguei um
livro e virei a noite lendo, até terminar. Queria entender a história para
poder fazer uma capa que contasse mesmo sobre o que é o livro", diz o
ilustrador.
O trabalho no Hospital de Livros garantiu a remissão de
parte da pena em regime fechado. Neste ano, William foi transferido para a
Unidade de Progressão da PEPG, que é uma unidade penal em que os detentos têm a
oportunidade de retornar ao convívio social por meio do estudo e do trabalho.
Como conta o professor Rauli Gross Junior, chefe de gabinete
da reitoria da UEPG e idealizador da parceria entre a universidade e o Depen,
são dez detentos contratados pela universidade neste ano. Ele ressalta que a
parceria vai além da utilização da mão de obra dos detentos: a UEPG busca
capacitar para o mercado de trabalho e para a reinserção na comunidade. "O
detento que trabalha na universidade consegue ter um contato próximo com a
comunidade, que facilita a ressocialização, além de poder se capacitar em áreas
específicas de acordo com suas aptidões, como é o caso do William", aponta
Rauli.
A oportunidade de aprender é um ponto destacado por Eunice
Novaes, diretora da Biblioteca Central Professor Faris Michaele (Bicen).
"O trabalho de acolhida é muito importante. Procuramos dar oportunidade
para que ele desenvolva suas aptidões e aprenda cada vez mais para o retorno ao
convívio social", conta.
A demanda pela restauração é constante nas bibliotecas da
universidade, conta Eunice. São milhares de livros que circulam e,
consequentemente, precisam de reparos frequentes. Mais trabalho para o William
- ou, melhor dizer, mais liberdade.