Paulo Coelho
Nasrudin sempre escolhe errado
Nasrudin sempre escolhe errado
Da Redação | 24 de fevereiro de 2018 - 01:23
O mullah Nasrudin é considerado o grande mestre do sufismo, por justamente ter o perfil de um louco, embora sempre ensine – com sua pretensa loucura - os verdadeiros segredos da vida. Eis uma de suas histórias:
Todo o dia Nasrudin ia esmolar na feira, e as pessoas adoravam vê-lo fazendo o papel de tolo, com o seguinte truque: mostravam duas moedas, uma valendo dez vezes mais que a outra. Nasrudin sempre escolhia a menor.
A história correu pelo condado. Dia após dia, grupos de homens e mulheres mostravam as duas moedas, e Nasrudin sempre ficava com a menor.
Até que apareceu um senhor generoso, cansado de ver Nasrudin sendo ridicularizado daquela maneira. Chamando-o num canto da praça, disse:
- Sempre que lhe oferecerem duas moedas, escolha a maior. Assim terá mais dinheiro, e não será considerado idiota pelos outros.
- O senhor parece ter razão - respondeu Nasrudin. - Mas se eu escolher a moeda maior, as pessoas vão deixar de me oferecer dinheiro, para provar que sou mais idiota que elas. O senhor não sabe quanto dinheiro já ganhei, usando este truque.
“Não há nada de errado em se passar por tolo, se na verdade o que você está fazendo é inteligente".
O que mais se preocupava
O autor Leo Buscaglia foi certa vez convidado a ser jurado de um concurso numa escola, cujo tema era: “a criança que mais se preocupa com os outros”.
O vencedor foi um menino cujo vizinho – um senhor de mais de oitenta anos – acabara de ficar viúvo. Ao notar o velhinho no seu quintal, em lágrimas, o garoto pulou a cerca, sentou-se no seu colo, e ali ficou por muito tempo.
Quando voltou para sua casa, a mãe lhe perguntou o que dissera ao pobre homem.
- Nada – disse o menino. – Ele tinha perdido a sua mulher, e isso deve ter doído muito. Eu fui apenas ajudá-lo a chorar.
Reflexão
Fragmento de um poema de Facundo Cabra:
“E me chamas estrangeiro, porque cheguei aqui por um caminho que não conhecias, porque nasci em outra cidade, e conheci outros mares”.
Chamas-me estrangeiro porque não estás acostumado comigo, já que eu zarpei de um porto distante, e tu pensas que as despedidas existem apenas para que se agitem lenços e se encham de lágrimas os olhos, e acreditas que, quando se vai para longe, todos pensam apenas no dia do regresso, e nas orações que os entes queridos ficam repetindo, dia após dia, anos a fio.
Mas eu não sou estrangeiro. Porque despertei em minha alma o que antes não conhecia, e descobri que todos os homens são iguais, que houve uma época em que o mundo não tinha fronteiras.
Todos nós trazemos o mesmo grito, as mesmas perguntas, o mesmo cansaço das viagens muito longas.
Os que dividem, os que dominam, os que roubam, os que mentem, os que compram e vendem nossos sonhos, são eles que inventaram esta palavra: Estrangeiro.
Olha-me no fundo de meus olhos, além do teu ódio, do teu egoísmo, do teu medo, e verás que sou apenas um homem, que precisa de tua ajuda. Não posso ser, nunca fui um Estrangeiro.