Debates
As ondas eleitorais
Da Redação | 08 de maio de 2018 - 03:11
Por Gaudêncio Torquato |
O campo eleitoral costuma ser movimentado por ondas. Que
circulam de cima para baixo e de baixo para cima, absorvendo climas,
circunstâncias, discursos e canalizando esse conjunto de inputs na direção de
potenciais perfis, principalmente candidatos a pleitos presidenciais. Em face
da competitividade alcançada pela eleição deste ano, a atenção maior se volta
para aqueles que pleiteiam o assento no Palácio do Planalto, razão porque
figurantes estaduais, a poucos meses antes do pleito, não ganham tanta projeção
quanto os protagonistas presidenciais.
As ondas ganham o empuxo do momento, empurrando para cima
perfis que parecem responder às demandas imediatas da sociedade. As demandas,
por sua vez, reúnem anseios, expectativas, frustrações do povo para com governantes
e suas políticas, e contextos que levam em conta heranças do passado e
esperanças do eleitor em relação ao futuro.
No caso do Brasil, a leitura do momento exibe um país que
afundou na maior recessão econômica da história; a ascensão de um novo governante
sob a decisão congressual de afastar a presidente; reformas – teto de gastos,
trabalho, educação, terceirização etc- não suficientemente explicadas e
entendidas pela sociedade; o maior processo de investigação da corrupção em
todos os tempos, com envolvimento de altos empresários, políticos e
governantes; prisão do líder mais populista do país; tentativa de um partido de
tornar vítima seu líder maior e, dessa forma, retornar ao centro do poder,
depois de 13 anos de comando do país; indignação social contra a classe
política; volta de uma polarização do discurso que tem como lema “nós e eles”;
dispersão do campo político; situação falimentar de Estados e Municípios;
extrema violência que assola os quatro cantos do país; e precarização dos
serviços públicos.
Essa é a moldura que está por trás dos agentes que se
apresentam como pré-candidatos em outubro próximo à Presidência da República.
Sob a influência de alguns traços do cenário, o eleitor faz suas primeiras
escolhas. De um lado, um partido organizado, com militância aguerrida, que
proclama todo tempo ter sido responsável pelo “melhor governo que o Brasil já
teve em todos os tempos”, sem abrir ouvidos ao maior rombo do Tesouro por eles
provocado no governo da presidente impichada. O “Salvador da Pátria”, mesmo
preso, continua sendo elevado aos píncaros da glória, graças ao carisma que
ainda detém. O que explica a margem histórica de 30% que lhe dão pesquisas de
intenção de voto. De outro lado, emerge a figura que faz o papel de
contraponto, um perfil de extrema direita, ex-militar que sustenta o discurso
da ordem contra a bagunça, sob os lemas de “bandido bom é bandido morto”,
“soldado bom é aquele que mata”.
Jair Bolsonaro, pois, é empurrado para o alto pela
temperatura ambiental, enquanto Luiz Inácio está, como esteve antes, sendo
impulsionado pela onda petista, muito forte mesmo contra ventos que levam o
petismo para a profundeza oceânica. Será que ambos sustentariam seus índices
até outubro? Lula está praticamente fora do jogo, eis que, mesmo sendo solto,
deverá entrar na lama do ficha-suja. Tudo indica que será impedido pelo TSE e
seu substituto não levaria seus votos. Bolsonaro representa a sociedade
indignada, mas não o voto mais consciente e racional das maiores parcelas das
classes médias. Terá poucos segundos de TV para fazer sua campanha.
Estamos divisando outras ondas carregando Joaquim Barbosa,
Marina Silva e Ciro Gomes. Ondas revoltas. Quando o mar estiver menos agitado,
será razoável supor que outros perfis poderão ascender na escada eleitoral. A
decisão do eleitor muda segundo as circunstâncias. Por enquanto, os ventos do
outono puxam os perfis. Aguardemos a ventania do inverno e o sopro do verão.
Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter@gaudtorquato