Jacir Venturi
Autor é professor e diretor da Educação
Básica e do Ensino Superior, é autor dos livros Álgebra Vetorial e Geometria Analítica
Dois grandes problemas clássicos da Geometria
Orenomado escritor argentino Ernesto Sábato (1911-2011) descreveu, de maneira bastante lírica, que sentiu enlevo, até mesmo uma espécie de vertigem quando ainda jovenzinho, aos 12 anos, assistiu ao professor de Matemática demonstrar um teorema da Geometria que o fez se curvar “a um mundo de infinita harmonia, pois acabara de descobrir o universo platônico, com sua ordem e objetos eternos, de uma beleza perfeita.”
A história da Geometria é fascinante: os primeiros registros vêm de civilizações antigas, como os babilônios e os egípcios, por volta de 3.000 anos a.C., e atribuem o surgimento da Geometria à necessidade prática de medir terras, daí a etimologia grega geo (terra) + metron (medição).
Euclides, cognominado merecidamente como o “pai da Geometria”, escreveu Os Elementos há cerca de 300 a.C., considerado o livro de maior influência na história, depois da Bíblia, tendo sido efusivamente replicado na forma de manuscritos pelos monges copistas. Mais tarde, com a invenção da imprensa de Gutenberg, passou de mil edições (a publicação de 1482, em Veneza, foi considerada a primeira delas). Escrito originalmente em grego, é uma compilação metódica e ordenada de 465 proposições, tendo como característica marcante a didática na exposição.
Quem trouxe Euclides de Atenas para ser professor da Biblioteca de Alexandria foi o General Ptolomeu I, imperador do Egito, um dos sucessores de Alexandre Magno. Um exemplar de Os Elementos, na época escrito em rolos de papiro, foi apresentado a Ptolomeu I. Ao “desenrolar” o volumen (termo em latim), na expectativa de bem compreender os teoremas, axiomas e postulados, perguntou a Euclides se havia uma maneira mais fácil de aprender Geometria. Lacônico, porém reverente, Euclides respondeu: “Majestade, não há uma estrada real para a Geometria”. Ou seja, o caminho da aprendizagem matemática não é florido nem pavimentado; ao contrário, requer disciplina pessoal e esforço intelectual.
Platão acreditava que a Geometria ajudava a treinar a mente para pensar de maneira abstrata e lógica, razão pela qual supostamente estaria escrito no frontão de sua Academia em Atenas (advertências eram comuns nas entradas de templos antigos): “Que nenhum desconhecedor da Geometria entre aqui.”
Ao longo da história, a Geometria glorificou dois problemas que se tornaram clássicos: quadratura do círculo e duplicação do cubo. O primeiro foi proposto por Anaxágoras (c.495-429 a.C.) enquanto aprisionado em Atenas por suas ideias muito avançadas para a época e que contrariavam a mitologia grega: sugeriu a existência de uma mente onisciente, responsável pela ordem e constância do Cosmo; afirmou que o Sol tinha luz própria e iluminava a lua; deu explicações sobre a ocorrência dos eclipses solares. Mesmo assim, como teria sido professor de Péricles, este o libertou da prisão. Ademais, exerceu forte influência em Sócrates, o primeiro dos três grandes filósofos, seguidos de Platão e Aristóteles.