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Yago Medeiros Vieira

Advogado criminalista, graduado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa e pós-graduado em Processo Penal e Prática Forense Penal pela mesma instituição de ensino. Atualmente, exerce a presidência da Comissão da Advocacia Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção Ponta Grossa.

O Black Mirror da vida real

Hodiernamente, tem-se falado exaustivamente sobre a tecnologia na profissão do advogado, principalmente se meios tecnológicos podem usurpar áreas do direito onde o profissional capacitado atua nos dias de hoje. Neste ano, diversos artigos e inovações tem sido apresentadas, como robôs que analisam contratos e acordos extremamente extensos de maneira fácil e, em tese, correta.

Ainda, serviços online que facilitam o entendimento de ações com valores menores, onde não é obrigatória a atuação do advogado no processo, mas que atualmente é um ramo saturado (inscrição indevida, dano moral, patrimonial, abalroamentos). Nas áreas mais tradicionais do direito, como tributário, onde a inteligência artificial determina meios de quitar dívidas intermináveis; na área trabalhista, com cálculos feitos em minutos por muitas vezes, retirando das mãos do profissional capacitado a possibilidade de angariar determinada ação; nas relações consumeristas, solucionando dúvidas em tese simples – quais desde já digo que nunca são – com a simples assinatura de determinado serviço ou custo muito abaixo do praticado pelo profissional da advocacia. Enfim, inúmeras áreas do direito estão sendo marteladas pela tecnologia, gerando um debate interminável entre advogados e as novas start ups dispostas a prestar serviços na área jurídica, burlando por muitas vezes as prerrogativas e atribuições inerentes ao advogado. Não é atoa que a Constituição da República Federativa do Brasil determina em seu artigo 133 que o advogado é indispensável à administração da justiça, pois com seus anos e horas de estudo intenso, são responsáveis por lutar pelos direitos de todos os cidadãos. Mas a pergunta que fica é: e na advocacia criminal? Até que ponto a tecnologia poderá tomar posse de demanda de mercado? Acredito que é uma resposta simples e objetiva: nunca. Nesta área tão apaixonante e cheia de preconceitos – inclusive por profissionais do direito – a tecnologia não usurpará a atuação do advogado. Talvez em tal vertente do direito estejamos trabalhando com um dos direitos mais inerentes e importante do ser humano: sua liberdade.

Estaria pasmo em ver, ao menos na sociedade que atualmente pertencemos, uma inteligência artificial, diante de sete jurados, tentando convencê-los, com todo amor, paixão e conhecimento técnico, das mais bem fundamentadas teses defensivas de seu cliente. E mais: qual cidadão colocaria sua liberdade nas mãos de alguém que não tem empatia com sua situação? Que não o vê como pessoa, com a possibilidade de ter sua liberdade ceifada e apodrecer nos inúmeros cárceres dignos da idade média que temos em nosso país? Ou mesmo o apenado, aquele que já está condenado, que cumpre sua pena de forma escorreita, mas precisa de um acalento, de saber que tem um profissional atuando em seu caso, tentando de todas as formas eventuais benefícios? Penso não fazer parte dessa modernidade a área criminal.

Diante de tais fatos simplórios – podendo imaginar-se milhares de outros exemplos, dos mais diversos - sopesemos que as novas tecnologias estão para auxiliar em todas as áreas e que não devemos ter receio de utilizá-las, visto que a atuação humana, seja na área criminal ou não, sempre será capaz de, ao lidar com os obstáculos de nossa sociedade, com suas ânsias e contratempos, seus direitos violados, estará no fim do túnel, aquele indivíduo disposto a abrir mão de seu bem mais valioso – o tempo – para lutar pelo seu semelhante: o advogado.

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