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TECNOLOGIA E MUDANÇAS NA SOCIEDADE

Redução de cursos e vagas em instituições de ensino superior de Direito, adaptação às tecnologias e redução dos escritórios. Essas são algumas das transformações e dos desafios vividos pelo profissional da área jurídica de acordo com José Augusto de Araújo Noronha, que deixa a presidência da Seccional do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil ao fim de 2018. O advogado avalia as mudanças que o Direito presenciou nos últimos anos e traça um panorama de como deve ser o futuro da profissão e das atividades da OAB/PR para auxiliar os advogados a se adequarem a essas mutações.

Na visão da OAB-PR, quais são as maiores transformações vividas pela área do Direito nos últimos anos?

NORONHA: A maior transformação que nós podemos atribuir hoje é o processo eletrônico. A partir do momento em que houve essa virada do processo físico para o eletrônico, houve uma grande modificação nas práticas e nas próximas ações dos profissionais. Hoje o advogado vai muito menos ao fórum, só vai quando tem alguma audiência, e antigamente ele era obrigado a ir todos os dias fazer seu acompanhamento processual. Tudo é mais rápido e dinâmico. Os próprios magistrados às vezes despacham aos sábados e domingos, o advogado ainda no fim de semana vê o despacho, dá-se por intimidado e cumpre o prazo, então há uma dinâmica maior no processo. A segunda situação que a gente vê que a tecnologia ajudou: as fontes de consulta ficaram muito mais fáceis. Hoje, diminuíram-se as bibliotecas, as pessoas com um simples clique no mouse têm uma fonte interminável de informação e de consulta. Com isso, possibilitou ter escritórios diferentes, menores, porque não há necessidade de grande espaço para guardar papel dos processos. A própria inteligência artificial está vindo também para o Direito. Já existem mecanismos que estão sendo agregados a tecnologias de grandes escritórios, onde reconhecem algumas situações e inclusive encaminham para soluções internas ou externas para aqueles problemas do dia a dia do advogado. A tecnologia está sendo utilizada em alguma medida para mudar a relação entre os próprios escritórios com os advogados.

E o que isso reflete para o Direito?

NORONHA: Hoje há a necessidade de o advogado estar muito mais preparado, mais especializado. Ele precisa ter um domínio maior da matéria, do processo eletrônico, se não ele tem dificuldade muito grande na atuação. Eu sempre digo que se o profissional ficou dez anos fora do Brasil e voltou agora, ele praticamente não consegue advogar, porque hoje com o processo eletrônico, a mudança no Código de Processo Civil, diversas outras legislações, existe praticamente uma nova forma de se conhecer o Direito. Isso também acontece por causa da tecnologia, que veio em benefício, mas também exige mais do advogado. Antigamente, você apresentava uma petição e cabia ao cartório carimbar, furar, nomear, autuar, enfim, todos os atos necessários à movimentação. Hoje, quando você distribui uma ação, é o advogado que escaneou as peças, ele que nomeou cada documento, emitiu a guia, pagou a guia, e entrega o processo praticamente pronto apenas para que o juiz faça seu despacho inicial. As relações do advogado com o processo mudaram, exige-se muito mais do profissional hoje no mundo tecnológico.

Em que medida o exercício da advocacia se transforma com as mudanças da sociedade?

NORONHA: A tecnologia e as mudanças na sociedade tendem a acabar com alguns ramos do Direito e criar outros num futuro muito próximo, e isso a gente sempre fala para os advogados, que tenham essa noção para que eles acompanhem essas mudanças. Há algumas situações hoje em que não há mais necessidade do profissional do Direito, e outras que surgiram há menos tempo. Quando iríamos imaginar há tempos atrás que teríamos advogado especialista em compliance, em Direito Sistêmico, Advocacia Colaborativa, mediação, arbitragem, propriedade intelectual, direito esportivo? São novas áreas que surgiram, enquanto outras tendem a diminuir ou desaparecer.

Quais seriam os maiores desafios para os advogados nos próximos anos, pensando nas transformações da sociedade, no inchaço do Poder Judiciário e no advento de tecnologias?

NORONHA: Ele precisa saber como utilizar as ferramentas eletrônicas a seu favor. Hoje verificamos advogados excluídos de seu meio de trabalho porque ele não conhece e não consegue entender o que é o Java, uma certificação digital ou até um PDF. Isso é muito difícil para alguns entenderem, e se não conseguem fazer essa análise, estarão fora do mercado de trabalho. Mas no futuro, o que nós vamos verificar é a diminuição dos espaços de trabalho, com mais espaços compartilhados, mais advogados fazendo serviços em colaboração. A tendência é que aquele advogado que faz advocacia de massa seja substituído por outras ferramentas eletrônicas, porque a atividade mais braçal tende a desaparecer do mundo do Direito. Temos convicção de que temos que estar muito atentos a essas mudanças para orientar nossos colegas. Uma das questões mais importantes é diminuir o número de faculdades de Direito e o número de vagas. A tecnologia veio de forma muito forte ajudar o advogado, hoje o profissional é mais produtivo e consegue trabalhar em mais casos porque o tempo dele fica mais focado na solução daquele processo e não necessariamente nos atos ordinatórios. Então há necessidade de se olhar para o mercado da advocacia como um mercado em mutação e que também não terá crescimento na mesma medida em que cresce o número de bacharéis em Direito.

E com relação à OAB-PR, como a instituição se prepara para encarar estes desafios e para ajudar os advogados? NORONHA: Há necessidade de ações efetivas, como nós temos feito. Por exemplo, criamos o Centro de Inclusão Digital, onde os advogados que têm dificuldade no processo de análise, podem ir até este local que está em quase todas as subseções, e receber treinamento de pessoas gabaritadas de como manusear essas ferramentas. Isso tem ajudado muitos colegas a não serem excluídos da advocacia, principalmente os mais antigos. Também montamos os escritórios compartilhados que a OAB está disponibilizando aos advogados, àqueles que começam na profissão. Isso colabora muito porque são escritórios com total estrutura e que dão dignidade no início da carreira.

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