Debates
PEC 6X1: oportunidade para o debate franco acerca da legislação trabalhista
Da Redação | 15 de novembro de 2024 - 00:54
Por André Naves
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6X1, de autoria da
deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), tem como objetivo a redução da jornada
de trabalho de 44 para 36 horas semanais, mantendo os salários e reorganizando
a carga semanal em até quatro dias. Essa proposta vem ao encontro de tendências
globais, onde o debate sobre a jornada de trabalho e sua adaptação aos novos
tempos — especialmente com o avanço da tecnologia e da inteligência artificial
— tem ganhado força.
A PEC 6x1, inspirada pelo Movimento Vida Além do Trabalho
(VAT), idealizado pelo vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ), pode ser vista como um
ponto de partida para uma análise mais profunda sobre o sistema trabalhista
brasileiro e suas limitações, tanto para trabalhadores quanto para
empregadores.
A questão da jornada de trabalho reduzida é sustentada por
um contexto de aumento da produtividade, impulsionado pelas inovações
tecnológicas. Essas inovações permitiram que, em alguns setores, menos horas de
trabalho resultassem em níveis de produção iguais ou superiores aos modelos
tradicionais. No entanto, a discussão sobre a redução da jornada de trabalho
não se limita aos ganhos de produtividade. Ela também envolve uma série de
outros fatores, como qualidade de vida, saúde mental, e até mesmo a busca por
um equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
Em termos práticos, a PEC 6X1 procura responder à demanda
por uma jornada de trabalho que promova o bem-estar dos trabalhadores sem
sacrificar o desempenho econômico. Entretanto, há obstáculos no que diz
respeito à aplicabilidade da medida no contexto brasileiro. O arcabouço
jurídico trabalhista do país, com regulamentações amplas, visa proteger o
trabalhador, mas frequentemente é apontado como um fator que engessa a
iniciativa privada e dificulta a criação de empregos.
A complexidade e os custos associados ao cumprimento das leis trabalhistas
brasileiras muitas vezes desestimulam empresários, especialmente os pequenos e
médios, de contratar formalmente. O excesso regulatório pode ser, em parte,
responsável pela baixa produtividade e pela informalidade ainda presente no
mercado de trabalho brasileiro.
Além disso, o Brasil já enfrenta desafios específicos em
relação ao mercado de trabalho, como a escassez de mão de obra em algumas
regiões e o aumento da informalidade. Há também uma pressão social crescente
para ajustar programas de assistência, como o Bolsa Família, para que realmente
sirvam como apoio temporário, incentivando a entrada no mercado de trabalho.
Isso alinha-se à célebre frase do ex-presidente americano Ronald Reagan, para
quem “o melhor programa social é o emprego”. Nesse sentido, um mercado de
trabalho desburocratizado e uma política de assistência social orientada para a
autonomia individual poderiam ser fundamentais para garantir uma economia mais
forte e inclusiva.
A baixa produtividade nacional está também associada a uma
qualidade educacional deficiente, fator que dificulta a implementação de uma
jornada reduzida sem impacto negativo na produção. O recente relatório da
McKinsey sobre o futuro do trabalho destaca que, para competir em um mercado
global, é necessário cultivar habilidades de criatividade, autoaprendizado e
flexibilidade. O Brasil, com uma educação pública ainda deficiente, precisaria
investir significativamente nesses aspectos para que seus trabalhadores
pudessem se beneficiar plenamente de uma jornada reduzida e competir em uma
economia mundial em transformação.
A PEC 6X1, assim, abre uma oportunidade rara para rever os princípios que sustentam o sistema trabalhista brasileiro e questionar se esse modelo atende às necessidades contemporâneas de um mundo em rápida mudança. Trata-se de uma chance para empreender uma reforma que, ao mesmo tempo que preserva a dignidade dos trabalhadores, valorize a iniciativa privada e encoraje a criação de empregos de qualidade. Como se diz, "quando o cavalo selado passa, é hora de pular e aproveitar a chance".
* André Naves é Defensor Público Federal formado em
Direito pela USP; especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social; mestre em
Economia Política pela PUC/SP; cientista político pela Hillsdale College;
doutor em Economia pela Princeton University; escritor e professor (Instagram:
@andrenaves.def).