Debates
O analfabeto político
Da Redação | 20 de agosto de 2022 - 00:02
Por
Atribui-se a Bertolt Brecht, renomado dramaturgo, poeta e
romancista alemão (1898-1956), o aclamado poema ─ e muitas vezes também
ignorado ─ “O analfabeto político”. Brecht viveu o efervescente período
político e social que incluiu as duas guerras mundiais e a Revolução Russa,
quando se confrontavam convicções monarquistas, republicanas, fascistas,
nazistas, capitalistas e socialistas. O poeta disse de si mesmo: “Sempre fui
politizado, pois só podemos mudar a realidade quando somos instruídos por ela”.
Talvez o poema esteja tantas vezes ausente dos livros do
poeta pela agudeza das palavras, que, sem dúvida, são duras recriminadoras do
pecado que todos nós costumamos cometer, pelo menos em alguns momentos da vida:
o pecado do alheamento e da omissão. Quem não conhece o poema deve procurar
conhecê-lo, ele é facilmente encontrável na web. Um trecho, que não é o mais
pungente e cruel, diz:
“Não sabe o imbecil [o analfabeto político] que da sua
ignorância política
nasce a prostituta, o menor abandonado
e o pior de todos os bandidos,
que é o político vigarista, pilantra,
corrupto e lacaio das empresas
nacionais e multinacionais.”
Por suas convicções e seus contundentes escritos, Brecht foi
obrigado a ter uma vida de refugiado político: Alemanha, Dinamarca, Suécia,
EUA, Suíça e de volta à Alemanha, após o final da Segunda Guerra Mundial e do
regime nazista. Sua peregrinação pelos países que lhe concediam asilo parece
traduzir o conhecido aforismo: “A mentira desgasta relacionamentos; a verdade não,
a verdade devasta”.
Atualmente, no século XXI, estamos vivendo outro momento de
efervescência política e social, agora com recrudescidas sequelas bélicas e
ambientais globais, que muitos entendem que podem pôr em risco a própria
sobrevivência da civilização atual. Neonazismo, neofacismo, extremados
autoritarismos e fundamentalismos, crescente violência, terrorismo, racismo,
xenofobia e intolerâncias de toda ordem, a par de crises econômicas, ambientais
e políticas, indicam que a humanidade encontra-se num drástico momento de
falência dos arranjos vigentes. Anúncio de uma necessária transição para um
novo arranjo civilizatório, que seja capaz de superar a crônica incapacidade de
empatia e de diálogo, que resulta nas imensas desigualdades sociais. É hora de
encarar e corrigir a desumana realidade de injustiças que vivemos, e não dela
se alienar, fazendo de conta que ela não existe.
Só o exercício do bom debate, ainda que no início nossas
arraigadas paixões obnubilem nossa razão e compreensão, há de nos ensinar a
enxergar os caminhos para que a humanidade enfim ultrapasse a era dos
egocêntricos instintos animais e alcance a idade da solidariedade e da
harmonia. O salto que já estamos preparados para dar, mas que ainda tanto
titubeamos.
Autor é Geólogo, professor aposentado do Departamento de Geociências
da UEPG