Debates
Uma geração de deprimidos
Da Redação | 03 de agosto de 2022 - 00:15
Por Elaine Ribeiro
A depressão é um tema de preocupação mundial, uma vez que
tem sido considerada a doença que mais gera afastamento do trabalho, e tem
alcançado, mais intensamente, uma faixa etária da população que nos chama a
atenção: nascidos entre 1981 a 2010. São pessoas que hoje têm entre 12 e 41
anos, fase que engloba adolescentes, jovens e adultos em suas fases mais
produtivas, tanto em período escolar, quanto profissional, de expressivo
desenvolvimento humano.
As queixas apresentadas por eles trazem situações como:
"a vida não tem sentido; não tenho mais vontade de fazer nada; nada me
agrada; as roupas não ficam bem em mim; preciso fazer muitas coisas, ou ainda,
ter muitos estímulos para ter vontade de algo." Mas, elas não param por
aí: há um questionamento constante sobre a felicidade e o que fazer para
alcançá-la, e uma dificuldade para compreender o sentido do sacrifício, das
recusas e entregas pelo outro.
Sim, essa é, infelizmente, a realidade que se apresenta
neste momento, uma vez que a busca por acompanhamento psicológico e
psiquiátrico tem aumentado na mesma proporção das crises de ansiedade,
depressão e índices preocupantes de suicídio.
Muitos jovens procuram a psicoterapia, pois estão cientes do
que se passa com eles: estou deprimido, tive crises, surtei, pirei, não aguento
mais, a vida é pesada demais, para quê estou estudando. Muitos questionam o
para quê esforçar-se nos estudos, por exemplo. Há um desejo de sucesso
financeiro rápido, imediato, com baixo esforço ou estudo. Aquilo que para
outras gerações era a consequência natural do crescimento e amadurecimento, ou
seja, assumir responsabilidades, fazer algo pelo outro, ter pequenos
sacrifícios, sofrer em certo grau para obter algo, parece ser intolerável para
essa geração. Tanto que ela tem sido nomeada como uma "geração
infeliz".
Claro que não temos uma totalidade assim, mas são esses
números expressivos que nos preocupam. Alguns aspectos podem intensificar esse
quadro, dentre eles a pandemia da Covid-19, que deixou muitos jovens e adultos
em casa, reclusos, fixados às redes sociais e, com isto, deixando de usar o que
chamamos de habilidades sociais e emocionais, que passam pelo relacionar-se com
o outro, pensar as consequências dos seus atos, agradecer, colocar-se no lugar
do outro.
Há um isolamento que parece, por muitas vezes, ignorar a
existência do outro no mundo, o que leva-os a ter maior dificuldade de perceber
que a vida é feita para o outro, na relação com o outro, e não de uma forma
autocentrada e egoísta, que gera as principais crises existenciais.
Os perfis de rede social têm sido potencializadores de uma
falta de senso crítico e uma visão extremamente limitada do mundo. E o que se
vê é uma busca constante por influenciadores como fonte de relacionamento,
formação de opinião e discernimento, o que está longe de ser uma forma segura e
eficaz de estruturação do conhecimento.
A tristeza por si só é uma emoção normal ao ser humano, seja
por uma perda, uma dificuldade, adoecimento, transição de vida. Mas, quando se
estende por meses, altera a disposição, a vontade, o interesse pelas coisas, a
concentração e a qualidade de vida de forma geral, pensamos sim, num quadro
depressivo. E parte dos diagnósticos se dá porque a informação sobre doenças
emocionais está mais divulgada.
Um julgamento popular que apenas diz: “na minha época não
era assim”, ou, “isso é falta de ocupação”, não resolve o problema. Temos um
novo tempo, uma nova realidade, um outro cenário. Para jovens e adultos que têm
coragem de identificar o problema precisamos ter a receptividade, compreensão,
além de fazermos com que cada vez mais essa realidade possa ser tratada em
rodas de conversa nas escolas, nas empresas, em casa, na família, nas igrejas e
nas próprias redes sociais.
Elaine Ribeiro é psicóloga clínica e organizacional da
Fundação João Paulo II / Canção Nova.