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Prefeitura transfere gestão (e responsabilidade) do Hospital da Criança para UEPG
Da Redação | 05 de junho de 2021 - 03:50
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A Prefeitura de Ponta Grossa faz uma ‘doação’, a pedido (da
reitoria), do Hospital da Criança à UEPG. É isso mesmo que a Câmara Municipal
de Ponta Grossa aprovou, em duas votações na primeira semana de Junho/21, a
partir do projeto de lei da atual administração municipal (PSD/PSDB/PV). O que,
aparentemente, parece uma iniciativa louvável e oportuna precisa, contudo, ser
explicado e, da mesma forma, garantir quem vai segurar o trabalho de
atendimento público à saúde em PG. A falta de debate e esclarecimentos parece
associada à constatação de que basicamente se divulgou, na mídia local,
vantagens e benefícios da transferência, mas pouco sobre recursos humanos,
fundamental no serviço público.
Entre as poucas informações que circularam, para além do
projeto, a Prefeitura de PG espera uma economia de recursos financeiros no
caixa municipal, inclusive com a manutenção do imóvel. Difícil entender os
motivos porque a administração local (anterior e atual) não tomou medidas para
economizar, esperando agora que gestores nomeados pela UEPG o façam!
Necessário esclarecer que não está em pauta o inegável
compromisso da UEPG com a busca de alternativa aos problemas que afetam a
população e tampouco a competência técnica de profissionais que respondem pelo
ensino, pesquisa e extensão em saúde pública na IES. Questiona-se aqui o
estranho silêncio no debate público, seja na mídia ou na votação unânime do
legislativo local, gerando dúvidas sobre as reais condições e os efetivos
desafios que restam aos Trabalhadores que devem assumir as tarefas decorrentes
da ‘doação’.
Mais recursos para manter e ampliar atendimento, espaço para
estágio e práticas em saúde são alguns argumentos que criam expectativas aos
estudantes, servidores e docentes da UEPG. Se ocorrer, logicamente se justifica
a parceria. Agora, se politicamente a expectativa existe, fato é que as
universidades estaduais do Paraná enfrentam redução de investimentos,
congelamento ou redução proporcional de verbas de custeio e ausência de
concurso para contratação de servidores/docentes, como denunciou a reitoria da
UEM na primeira semana de Junho/2021, através da imprensa.
É lógico que a UEPG tem importante contribuição, através da
formação de profissionais da saúde, bem como projetos de extensão, pesquisa e
ensino na área. Mas é preciso olhar à frente, com uma leitura crítica do
passado recente! É oportuno recordar que a Fundação de Apoio ao
Desenvolvimento Institucional, Científico e Tecnológico da UEPG (FAU
UEPG) já tentou administrar a saúde local (Pronto Socorro e UBSs), em
2011, e a experiência, pelos registros e o fim silencioso do contrato, não
deixou boas lembranças aos moradores de PG, ainda que a manutenção,
gestão da estrutura das unidades de saúde e repasse de recursos à fundação
tenham permanecidos com o Município.
O que não se explicou, ao menos até o momento, é se a
UEPG tem garantias do governo estadual para contratação de servidores públicos
efetivos (para não embarcar no aumento da precarização trabalhista, já
existente no Estado/País) para manter e ampliar o prometido atendimento no
Hospital da Criança. Pelo que consta, os tais recursos financeiros que motivam
a transferência são pontuais e não permanentes. E, aqui, vale lembrar o alerta
do Sindicato do Servidores Municipais, em agosto de 2020, quando houve o primeiro
acordo da parceria, sobre situações de desrespeito aos trabalhadores do
Hospital da Criança em PG, diante da repentina transferência de gestão.
E, por fim, é importante ouvir
Servidores/Professores/Estudantes da UEPG sobre a ‘doação’ que vem do Palácio
da Ronda. Isso porque, se uma parceria é fundamental na gestão pública, não se
pode isentar quem foi eleito para assumir responsabilidades, neste caso, pela
administração da Saúde Pública no Município de PG. Agora, também vale
questionar se a ‘doação’ poderia, quem sabe, retomar o debate sobre ampliação
do número de vagas em cursos de saúde que registram demanda profissional na
Região (como Medicina e Enfermagem), que complicou ainda mais com a pandemia do
Coronavírus? Os gestores do Hospital da Criança seriam nomeados em cargos
comissionados ou teria algum outro procedimento?
Gestar a saúde pública é um dos principais problemas das
administrações municipais e, em PG, registra um histórico que supera duas
décadas na busca de soluções ou medidas emergenciais. Mas, não se pode isentar
da tarefa quem efetivamente foi eleito para resolver os problemas. Terceirizar
responsabilidade, ao menos até o momento, não registra experiências
bem-sucedidas em Ponta Grossa. Daí a necessidade de discutir a situação e os compromissos
com os trabalhadores diretamente envolvidos na ‘doação’. Afinal, “quando a
esmola é demais, até o santo desconfia”, sugere um ditado popular. Precaução e
planejamento para garantir e ampliar o atendimento em serviços públicos é um
desafio preocupante, seja em PG, Paraná ou Brasil.
Sérgio Gadini, professor da UEPG, jornalista e participa de
movimentos sociais em defesa dos Direitos Humanos e lutas coletivas. [email protected]