Debates
Das falsas comorbidades em busca da prioridade na vacinação
Da Redação | 26 de maio de 2021 - 01:17
Por Marcelo Válio
Multiplicando-se geometricamente nas redes sociais, reuniões
online e órgãos estatais denúncias sobre pessoas solicitando à médicos particulares,
atestados e pedidos falsos para
comprovação de comorbidades inexistentes, com o intuito de serem vacinadas
prioritariamente.
As atitudes devem ser analisadas sob dois prismas de
responsabilidade, sendo a do beneficiário e a da figura do médico.
As regras para emissão de atestados médicos no Brasil são
regulamentadas pela resolução 1851/08 do Conselho Federal de Medicina.
Além da responsabilidade penal dos envolvidos, possível a
responsabilização administrativa do médico junto ao seu órgão de classe, sendo
possível abertura de sindicância individual frente ao profissional, e
confirmada a ilegalidade, o médico em processo ético profissional poderá ser
condenado a penalidades, que são da advertência até possível cassação.
Ademais, poderá o médico responder criminalmente, pois
praticará ato tipificado no art. 302 do Código Penal:
"Art. 302. Dar o médico, no exercício da sua profissão,
atestado falso:
Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano.
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de lucro,
aplica-se também multa.
Interessante apontar também que o beneficiário cometerá ato
de ilícito penal, previsto no art. 304 do mesmo diploma legal:
"Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis
falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.
Além disso, se a pessoa tentar se passar por outra com
atestado verdadeiro, praticará o crime de falsa identidade:
"Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa
identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar
dano a outrem:
Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa, se
o fato não constitui elemento de crime mais grave."
Caso o médico infrator seja vinculado ao SUS, é considerado
funcionário público, e se aplica outro dispositivo penal, respondendo o médico
pelo crime de certidão ou atestado ideologicamente falso, previsto no artigo
301 do Código Penal:
" Art. 301 - Atestar ou certificar falsamente, em razão de função pública, fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem: Pena - detenção, de dois meses a um ano"
Além disso, se o médico fornece um atestado verdadeiro, mas
o paciente adultera o atestado, a
falsidade será material, e o infrator responde pelo crime previsto no art. 304
do Código Penal.
A pena será a do crime de Falsificação de Documento Público,
se o atestado falso for de um médico vinculado ao SUS
"Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento
público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a
seis anos, e multa.
Já a pena será a do crime de Falsificação de Documento
Particular, se o atestado falso for de um médico privado:
"Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento
particular ou alterar documento particular verdadeiro: Pena - reclusão, de um a
cinco anos, e multa".
Assim, que o respeito aos pares prevaleça e, em caso de ilícito penal ou administrativo, os responsáveis sejam punidos de forma paradigma e com efeito didático.
Sobre o professor pós doutor Marcelo Válio: graduado em 2001
PUC/SP, Marcelo Válio é especialista em direito constitucional pela ESDC,
especialista em direito público pela EPD/SP, mestre em direito do trabalho pela
PUC/SP, doutor em filosofia do direito pela UBA (Argentina), doutor em direito
pela FADISP, pós doutor em direito pelo Universidade de Messina (Itália) e pós
doutorando em direito pela Universidade de Salamanca (Espanha), e é referência
nacional na área do direito dos vulneráveis (pessoas com deficiência, autistas,
síndrome de down, doenças raras, burnout, idosos e doentes).