Debates
Cresce a vergonha de assumir apoio a Bolsonaro
Da Redação | 07 de agosto de 2020 - 01:50
Por Ben-Hur Demeneck
Em Ponta Grossa um
outdoor declara de modo anônimo apoio ao presidente Jair Bolsonaro. A peça
publicitária instalada na rua Ermelino de Leão, em prédio das antigas
indústrias Klüppel, abre um debate interessante sobre a responsabilidade das
agências publicitárias em tempos de pandemia ao mesmo tempo em que escancara
uma tendência política – o apoio a Bolsonaro se encontra em fase de
derretimento. Quando ele se dá, se dá às escondidas.
Às 18h25 da
sexta-feira passada (31), A Rede replicou em seu portal foto e texto meus
que havia postado em redes sociais a respeito da obscura peça publicitária.
Para colaborar com o debate público, compartilho algumas reflexões. Desde já,
agradeço ao Jornal da Manhã e ao portal A Rede pelo uso deste espaço
democrático de manifestação.
Depois de
ler tudo o que se publicou sobre o outdoor, permanece a dúvida: quem pagou pela
publicidade? Qual foi o constrangimento da agência de comunicação para divulgar
uma produção anônima ao público ponta-grossense? Afinal, é desejável que
um anunciante mostre sua cara ao público. Sobretudo quando exibe cumplicidade
com políticos, a ausência de assinatura deixa sua credibilidade abaixo de zero.
Quem disse que “o agro está com Bolsonaro?” Absolutamente ninguém disse. E qual
é a vantagem de jogar no anonimato? O recurso é simplório, porém bem funcional:
quem fica nas sombras arvora ter uma liderança que, na prática, seria
questionada no setor. É evidente que estar “fechado com Bolsonaro” não combina
com precisar se esconder. Por fim, o sujeito (ou associação) paga caro para
ostentar a crescente vergonha de ser bolsonarista.
Há várias
hipóteses para não se assinar tal outdoor: 1) O “agro” NÃO está assim tão
“#FechadocomBolsonaro”; 2) Não se identificar permite criticar Bolsonaro caso
ele prejudique as exportações agropecuárias para a China; 3) Porque Bolsonaro
pode ficar mais tóxico do que já é, principalmente se o Brasil receber
sanções internacionais por conta da política ambiental; 4) Porque nem Sérgio
Moro aguentou Bolsonaro; 5) Porque 45% da população considera o governo ruim ou
péssimo (pesquisa XP/Ipespe divulgada em 20 de julho no Valor Econômico).
Este artigo
não questiona a questão ideológica. Qualquer um pode declarar seu apoio ou
protesto a Bolsonaro. Ainda vivemos num país livre. Contudo, não é porque
Bolsonaro teve uma votação maciça em PG que a fila não andou. Aliás, a erosão
da popularidade de Bolsonaro se mostra em numerosas sondagens de opinião. Uma
delas indica que 46% dos brasileiros nunca confia no que Jair Bolsonaro diz
(DataFolha, final de junho).
A dúvida,
porém, persiste: quem pagou o outdoor de apoio a Bolsonaro em Ponta Grossa em
plena pandemia? Tal indivíduo (ou grupo) fica oculto ao passageiro do ônibus
“Pronto Socorro” que olhar ao cartaz gigante enquanto ajeita sua máscara e o
condutor do coletivo espera o semáforo abrir.
Qualquer um dos milhares de cidadãos que circulam por aquele ponto do Centro da
cidade apenas enxerga uma peça vaga, anônima e feia que se comunica dentro do
espírito das fake news – é assertiva, mas não se baseia em evidências nem
assume autoria. Para azar desse tipo de comunicação, “a verdade é filha
do tempo, não da autoridade”, como ensina a peça “A vida de Galileu”. Está cada
vez dia mais caro e vexaminoso apoiar o “Capitão Corona”.
Ben-Hur Demeneck é jornalista e doutor em Ciências da Comunicação (ECA-USP).
Integra o Grupo de Pesquisa Jornalismo, Direito e Liberdade (JDL-USP).