Debates
O sonho de Brasília
Da Redação | 22 de abril de 2020 - 15:45
Por Carlos Mendes Fontes Neto
Às vésperas dos 59 anos de Brasília, um ano atrás, em um
anfiteatro lotado da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto,
Portugal, realizou-se uma aula aberta denominada “O sonho de Brasília”.
Brasília sempre despertou interesse em todo mundo desde que se concretizou a
construção da nova capital do Brasil. E podemos dizer que esse sonho começou quando
aconteceu a Semana de Arte Moderna de 1922.
Uma nova identidade surgiu para a cultura no Brasil com
Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Menoti Del Pichia,
Anita Mafalti e outros, com a procura das nossas raízes e que acabou num
movimento modernista que reinventou o país.
Com o Manifesto Antropofágico procurou-se traduzir o que
ocorreu. Foi uma ação de engolir o
modernismo centro-europeu que nos influenciava e devolver como cultura
brasileira.
Com a chegada do Zepelim no Rio em 1936, fato que espantava
a humanidade na época, também chega Le Corbusier, convidado por Lucio Costa
para uma consultoria em um projeto. Fato que se reveste de importância por
nascer nessa ocasião uma grande empatia dele com Oscar Niemeyer. Mesmo sem se
perceber, Brasília começou a ser gerada e sonhada aí. Um encontro que se
traduziu na mais perfeita compreensão da nova estética e necessidade que
surgia. E uma ironia, pois de um sonho de origem e concepção socialista até o
poder de devolver alma à face de resposta da dimensão humana que se projetou
nela. E com a concretização de Brasília se traduziu também o paradoxo do ideal
que a norteou em face do período que o país passou a viver nos anos subsequentes. Criatividade, arte, cultura, o livre
pensamento, passam a ser inimigas da nação e sociedade. O falso realismo da
mentalidade imobiliária destrói a concepção democrática da cidade. A cidade da
contradição. A distância entre o traço do projetista e o gosto do habitante.
Assim numa noite de revelações e constatações, com
acompanhamento de intervenções de Adriana Calcanhoto, também professora
visitante da Universidade de Coimbra, ao som de “Sinfonia da Alvorada” de Tom e
Vinicius, se comemorou o encontro de dois arquitetos que se revelou na coroação
da arquitetura e urbanismo brasileiro. Na procura e no ideal da cidade justa.
E em 2020, Brasília com 60 anos, continua sendo um ícone
modernista, mesmo com os senões, mantendo ainda no plano piloto a concepção idealizada
para uma urbanização inovadora.
Carlos Mendes Fontes Neto é Engenheiro civil e mestrando em Planeamento e Projecto
Urbano na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, Portugal.