Debates
O Coringa que te habita
Da Redação | 16 de janeiro de 2020 - 01:48
Por Leonardo Torres
Não é surpresa que o filme “Coringa", de Joaquim
Phoenix e Todd Phillips, tenha obtido 11 indicações ao Oscar. Este é um dos
filmes que, no mínimo, gostando ou não, intrigam cada um de nós. Assim que o
filme foi lançado, seu impacto causou tanta estranheza que muitos se
perguntaram: quem é e onde está o Coringa da vida real? Consequentemente,
muitos dedos foram apontados: aos políticos, aos marginalizados, etc.. A
resposta mais convincente foi dada por um colega da Psicologia, José
Balestrini, que pontou que o Coringa é, simplesmente, o coringa: ou seja, uma
máscara que cabe em todos nós.
A outra face do Coringa é o palhaço Happy, traduzindo para o
português: o Feliz. Ele quer trabalhar, é dedicado, tenta ganhar o seu
dinheiro, sonha em ser um astro, ou melhor, ter reconhecimento, isto é, como
sinônimo disso tudo: ser feliz. Esta descrição corresponde à grande parte da
sociedade atual. A busca da felicidade como sinônimo de sucesso, dinheiro e
poder é um imperativo no mundo.
Porém, a busca da felicidade gera uma expectativa tão grande
na sociedade, que muitos indivíduos, hoje, ao não conseguirem alcançá-la, fazem
uso equivocado de medicamentos, como o clonazepam, para suportar a frustração
de suas vidas. A questão é que felicidade não é sinônimo de dinheiro, sucesso
ou poder. A Psicologia Analítica entende que não é possível estar em um estado
de felicidade sem, frequentemente, enfrentarmos um estado depressivo. E, quem
nega as próprias tristezas, frustrações, entre outros sentimentos que julgamos
negativos, acaba por torná-los mais frequentes e maiores. O clonazepam ajuda a
anestesiá-los, mas não os elimina.
Quando a negação destes sentimentos já não é mais suportada,
eles nos tomam de uma vez só. Por isso, é muito comum vermos popstars que
conquistam uma rápida fama enfrentarem um quadro depressivo logo em seguida. Se
aceitássemos nossas tristezas em pequenas doses diárias, conseguiríamos também
ser felizes em doses diárias.
Quando Happy veste a máscara do Coringa, ele não aceita em si todas suas dúvidas, frustrações e tristezas, o que seria o caminho certo, psicologicamente falando. Ele rompe com o próprio Happy em si, ele cinde, e é engolido por todos estes sentimentos sombrios. Isso faz nascer o Coringa. Nós não somos diferentes: todos temos tristezas, frustrações e dúvidas. Resta-nos entender as nossas e não apontar dedos para as do indivíduo ao lado. O lado sombrio e negativo da vida é inevitável. A única coisa possível de se fazer é escolher o que fazer com elas.
Leonardo Torres, Professor e Palestrante, Doutorando em
Comunicação e Pós-graduando em Psicologia Junguiana