Debates
Liberdade e progresso
Da Redação | 02 de abril de 2019 - 01:46
Por José Pio Martins
A liberdade política, econômica e social provou ser condição
necessária para atingir quatro objetivos: o respeito ao ser humano, o
desenvolvimento das potencialidades individuais, a prosperidade material e a
justiça social. A definição de liberdade da qual mais gosto é de Friedrich von
Hayek: “A liberdade é a ausência de coerção de indivíduos ou de grupos de
indivíduos sobre indivíduos”. Entende-se por “coerção” a imposição que obriga
os indivíduos a agirem em função de interesses alheios e, portanto, em detrimento
de seus próprios interesses. A coerção é má porque anula o indivíduo como ser
que pensa, avalia e decide, já que o transforma em mero instrumento dos
interesses e fins de outrem.
A vida somente pode ser autêntica se for autônoma. Hegel, o
filósofo que mais influenciou Karl Marx, dizia: “A filosofia nos ensina que
todas as qualidades do espírito subsistem apenas pela liberdade”. Por óbvio,
cada um deve respeitar, nos outros, a mesma liberdade que quer para si, logo,
ninguém tem o direito de agredir a vida, a segurança, a liberdade e a
propriedade de seus semelhantes. As leis e os códigos jurídicos existem para
garantir os direitos individuais e punir seus transgressores. É a liberdade sob
a lei.
O governo é um aparato de coerção e punição, por isso a
organização política nacional deve pautar-se por determinados preceitos: o
Estado de direito (império das leis), a limitação dos poderes do governo, a
democracia política, a economia de mercado, o direito de propriedade e a
liberdade de escolha. Um princípio essencial é que o primeiro patrimônio do ser
humano é seu corpo, e o segundo é o direito de apropriar-se livremente dos
frutos de seu trabalho, que se realiza pelo direito de propriedade e pela
liberdade de escolha.
Quanto à democracia, ela está longe de ser perfeita, mas, em
comparação com as outras opções, sua superioridade reside em seis atributos: a
liberdade de opinião, o voto secreto, a existência de oposição, o mandato
definido, o rodízio de lideranças e a separação dos poderes. O mandato limitado
e as eleições periódicas são a alternativa às armas e representam o meio para
substituir um governante por via civilizada, sem violência. Há ditaduras que
usam o verniz de eleições periódicas, mas sem limitação do número de mandatos,
e mantêm seus governantes no poder indefinidamente. Em geral, terminam mal, com
deposição violenta. O caso da Venezuela caminha para esse desfecho.
A liberdade provou ser o melhor instrumento de prosperidade
material e desenvolvimento social. A vida moderna tornou-se complexa, e o nível
de bem-estar depende de enorme gama de bens e serviços somente obteníveis pelo
avançado estágio da ciência, do conhecimento e da tecnologia. A mais eficiente
máquina de produzir é o capitalismo, sob a propriedade privada e a liberdade
econômica. Porém, a produção por si só não basta para garantir bom padrão de
bem-estar para todos. É necessário também um bom sistema de distribuição, capaz
de incluir os pobres e os menos favorecidos.
Para a distribuição da renda e a inclusão social do maior
número de pessoas, as sociedades livres têm a tributação. No Brasil, mais de um
terço da produção nacional é entregue ao Estado, nas três esferas federativas,
e representa a tributação efetivamente arrecadada pelo governo. Até mesmo
importantes pensadores socialistas perceberam que a economia totalmente
estatizada, sem direito de propriedade e sem mercado livre, não funciona. Sem a
liberdade de trocas não há formação de preços, sem preço não há cálculo
econômico, e sem cálculo não há sistema produtivo.
Antonio Gramsci, ideólogo da esquerda, dizia que os
comunistas deviam abandonar a ideia de destruir o capitalismo, a economia
deveria ser deixada a cargo do setor privado, e o governo tomaria parte da
riqueza produzida pela via da tributação. Ele sabia que um governo que tome 40%
da renda nacional pode controlar a sociedade, controlando a educação, a
cultura, a saúde, a segurança, a justiça e os costumes.
Mas a história mostra que, mesmo com cargas tributárias
elevadas, os governos não foram eficientes na redução da desigualdade. Pelo
contrário: o Estado em muitos casos tornou-se concentrador de renda, conforma
provam estudos feitos pelas próprias instituições governamentais. O Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão do governo federal brasileiro, já
publicou estudos mostrando isso. Os que pregam mais governo, mais estatização e
mais controles sobre a economia e a sociedade, com redução da liberdade em nome
da distribuição de renda, não percebem que estão receitando doses maiores do
veneno causador do mal que pretender combater.
José Pio Martins, economista e reitor da Universidade
Positivo.