Debates
Fugir da Presidência da República
Da Redação | 17 de abril de 2018 - 22:15
Por Prof. Gilson Alberto Novaes
Na última sexta-feira, 13 de abril, a presidente do Supremo
Tribunal Federal, ministra Carmem Lúcia assumiu a Presidência da República em
substituição ao presidente Temer que viajou ao Perú para participar da Cúpula
das Américas. Foi a segunda mulher a ocupar a presidência da República.
Discretíssima como sempre, não sentou-se na cadeira de Michel Temer, não
participou de solenidades públicas, apenas tomou água e café, dispensando
serviços à disposição da presidência. Muito diferente de outros que ocuparam a
presidência em substituições rápidas do presidente da República em viagens
externas.
Na linha sucessória, a ocupante da Presidência do STF é a
quarta. O primeiro é sempre o vice. Não temos vice! O segundo é o presidente da
Câmara dos Deputados que também resolveu viajar para o Panamá para participar
do Parlatino, o parlamento latino-americano. O terceiro é o presidente do
Senado que também resolveu dar uma esticadinha até o Japão.
Um presidente do STF assumir a presidência da República não
causa surpresa, é da Constituição. Recentemente isso já ocorreu em 2014 quando
Ricardo Lewandowski assumiu a Presidência em lugar de Dilma Rousseff que fora
ao Estados Unidos. Na ocasião, o vice Michel Temer resolveu sair do país e ir
ao Uruguai, aqui pertinho. Naquela época, o presidente da Câmara era Henrique
Alves (hoje preso) e do Senado era Renan Calheiros, que não assumiram o posto
alegando impossibilidades eleitorais. Certamente pelo mesmo motivo o Vice
resolveu sair também.
Mas porque será que eles "fogem" de sentar-se na
cadeira presidencial em certos períodos? Fácil de explicar: Em anos eleitorais
quem ocupar a cadeira presidencial nos seis meses que antecedem a eleição, fica
inelegível para a eleição daquele ano. Eis a razão pela qual viajam para
qualquer lugar, às custas do erário! Inventam um compromisso e escapam de
assumir o cargo. Uma despesa perfeitamente dispensável e desnecessária.
A nossa Constituição em seu artigo 79, diz: “substituirá o
presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no caso de vaga, o
vice-presidente”. São casos de impeachment, renúncia ou morte. Pelo que se
entende, as saídas do presidente para viagens ao exterior não são casos de
impeachment, de renúncia ou de morte, a que se referiram os constituintes de
1988. Assim, até onde eu entendo não haveria necessidade de substituição. Fica
a pergunta: enquanto o presidente estiver assinando compromissos no exterior,
seu substituto em solo brasileiro estaria aqui assinando decretos e leis!
Teríamos então dois presidentes?
Em meados de 2017, num mesmo dia, o país teve três
presidentes da República! Segundo foi noticiado à época, o
"Broadcast", serviço de notícias eletrônicas da Agência Estado,
calculou que entre as 11 horas e as 14:15 horas daquele dia, o presidente foi
Eunício Oliveira, presidente do Senado. Temer tinha ido à Alemanha e Rodrigo
Maia (presidente da Câmara) tinha ido à Argentina. O presidente da Câmara
embarcou as 11:15 horas na Argentina e virou presidente quando ingressou no
espaço aéreo brasileiro, (na linha sucessória seu cargo antecede o do
presidente do Senado) tendo sido possivelmente o primeiro presidente que
exerceu o cargo dentro de um avião, pois o presidente Temer cruzou o espaço
aéreo brasileiro as 14:15 horas, quando Maia, ainda dentro do outro avião,
deixou de ser presidente! Hilário, não fosse ridículo!
Tem sido uma festa as substituições dos presidentes da
República no Brasil, nesses casos.
Estamos na era da revolução digital, onde os recursos da
comunicação instantânea de dados, voz e imagem nos asseguram que não há
justificativa para essa absurda norma de substituição do presidente em suas
ausências do país.
Já vimos coisas do "arco da velha" nessas
substituições!
Tivemos um caso no início de 1989 quando o Deputado Federal Paes de Andrade substituiu o Presidente José Sarney. Ele lotou um avião com amigos, deputados e parentes e voou na condição de Presidente da República para sua terra, Mombaça no Ceará, onde desembarcou como presidente e despachou normalmente. Entre tantas coisas que precisam de mudanças, essa é uma.
*Gilson Alberto Novaes é Professor de Direito Eleitoral no Curso de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie – campus Campinas, onde é Diretor do Centro de Ciências e Tecnologia.