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Promotora de Justiça esclarece dados sobre CNH

Suzane Maria Carvalho do Prado promove esclarecimento sobre informações em notícia do Portal aRede

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Da Redação

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Suzane Maria Carvalho do Prado promove esclarecimento sobre informações em notícia do Portal aRede

Na última quinta-feira (21), o Portal aRede publicou matéria com o título Dirigir com CNH suspensa ou cassada não é mais crime. A Promotora de Justiça, Suzane Maria Carvalho do Prado, entrou em contato com equipe do Portal para esclarecer algumas informações presentes na notícia. Segue texto na íntegra:

NOTA AO “PORTAL aREDE” 

A propósito de matéria veiculada na quinta-feira passada, 21 de março de 2019, no portal “aRede”, com o título “Dirigir com CNH suspensa ou cassada não é mais crime”, algumas considerações necessitam ser feitas.

O artigo 307 da Lei 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro, o CTB – prevê pena de “detenção de seis meses a um ano e multa, com nova imposição adicional de idêntico prazo de suspensão ou proibição” para aquele que “violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor imposta com fundamento neste Código”. Vamos nos ater aqui só à primeira figura, de violar a suspensão do direito de dirigir.,

Duas são as formas de imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir veículo automotor: administrativa ou judicial.

No primeiro caso, a suspensão está prevista no artigo 256, III, do CTB e compete à autoridade de trânsito aplicá-la, em processo administrativo, assegurada a ampla defesa (art. 265, CTB). Isto pode se dar: (a) quando o condutor atingir vinte pontos, no período de doze meses, por conta de multas aplicadas ou (b) quando transgredir as normas desta Lei, que prevejam, de forma específica a penalidade de suspensão do direito de dirigir. Como exemplo de infração de trânsito que determina imediata suspensão do direito de dirigir está a condução de veículo automotor sob a influência de álcool ou outra substância psicoativa (art. 165, CTB). 

Dirigir veículo estando com este direito suspenso, nos termos do artigo 162, II, do CTB, importa em “infração de trânsito gravíssima”, passível de multa e retenção do veículo.

Será judicial a suspensão do direito de dirigir sempre que a penalidade for imposta pelo juiz, em um processo judicial, seja em caráter liminar (art. 294, CTB), seja, ao final, em sentença condenatória. Por exemplo, aquele que praticar homicídio culposo no trânsito (art. 302, CTB), além de ficar sujeito à pena de detenção, de dois a quatro anos, terá ainda suspenso o direito de dirigir. Esta suspensão terá duração de dois meses a cinco anos (art. 293, CTB); transitada em julgado a sentença a imposição da penalidade é comunicada ao Contran (art. 295, CTB) e o condenado deve entregar a CNH em juízo (art. 293, § 1º, CTB). 

Dito que duas são as formas de se ter por suspenso o direito de dirigir e ambas estão previstas no Código, violar qualquer destas ordens de suspensão, em tese, configura o crime do artigo 307 do CTB. Deste modo, não é possível dizer em  título de matéria que “dirigir com CNH suspensa ou cassada não é mais crime”, pois, salvo engano, trata-se de generalização. 

Enquanto o artigo 307 estiver na Lei 9.503/97, não for revogado, continua sendo crime praticar a conduta ali descrita de violar a suspensão do direito de dirigir. 

Houve sim, pela jurisprudência, uma redução do alcance do art. 307 do CTB. Num primeiro momento, com julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, depois São Paulo, espalhou-se pelo Brasil, no sentido de que só a penalidade imposta judicialmente, ou seja, em decisão penal, se não cumprida,  importaria na prática do crime. Sendo a suspensão imposta via administrativa, por haver previsão de multa para a violação desta suspensão, a multa seria bastante e afastaria a incidência do direito penal (anote-se que a multa prevista no artigo 162, II, do CTB, não faz diferença entre a suspensão administrativa ou judicial. Ela deve ser aplicada sempre que flagrado o agente conduzindo o veículo com este direito suspenso). Ou seja, ignorou-se a parte final do artigo 307 do CTB, que diz ser crime a violação da suspensão do direito de dirigir aplicada com fundamento neste Código, sem fazer divisão entre a parte administrativa e a judicial.

Assim foi que, dividida a jurisprudência – que não é lei, mas forma de pacificar a aplicação da lei –, a questão chegou no Superior Tribunal de Justiça, no habeas corpus 427472 de São Paulo, em que foi relatora a ministra Maria Thereza de Assis Moura. Ela e outros três ministros da 6a Turma consideraram que não é crime a conduta, é atípica, se a penalidade violada for imposta em seara administrativa. O ministro Néfi Cordeiro, ao contrário, votou por considerar crime, independente da origem da ordem, a conduta de quem dirige com este direito suspenso. Quer dizer, a matéria não está pacificada – a 5a turma do STJ também julga crime e nada falou a respeito –, o julgamento foi por maioria e o artigo continua intacto na Lei. O julgado está disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=CRIME+E+TR%C2NSITO+E+VIOLAR+E+SUSPENS%C3O+E+HABILITA%C7%C3O&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true; 

Continua sendo crime dirigir estando com este direito suspenso, apenas se discute a abrangência da conduta por questão de política criminal. A propósito, do voto vencido do ministro Néfi Cordeiro: “o Código previu hipóteses de suspensão, hipóteses de proibição de habilitação aplicada administrativamente e, depois, vem no art. 307 a dizer que quem isso desrespeita pratica um tipo penal específico, diverso do crime de desobediência, não me parece possível daí pretender trazer   os argumentos do crime de desobediência para este tipo penal. Além do que, como argumentação de política criminal, parece-me um gravíssimo incentivo a que pessoas que tenham suspensa a habilitação continuem dirigindo, porque, ainda que isso seja uma infração administrativa, não possui as mesmas consequências do tipo penal que prevê a pena de detenção no  art.  307. Então, com o máximo  respeito, parece-me que as elementares do art. 307 estão preenchidas quando há o desrespeito à punição administrativa” (sem grifo no original).

A decisão foi tomada por maioria e pode ser revista. Exemplo (quase) recente de virada de entendimento foi com o artigo 307 do Código Penal – atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem – por um tempo foi considerado atípico, com fundamento de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si próprio. Veio o STF e pôs uma pá de cal no assunto dizendo: é crime sim. “O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intento de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente (art. 307 do CP). O tema possui densidade constitucional e extrapola os limites subjetivos das partes” (RE 640139-RG – DF, Relator Min Dias Toffoli).

Somente se sumulada a questão no sentido da atipicidade da conduta em caso de penalidade imposta administrativamente – o que se dá com a reunião das turmas do STJ com atribuição criminal para dizer do alcance do artigo da lei na parte penal – poderá se afirmar, como feito no título da matéria que se comenta, se dirigir com a CNH cassada por via administrativa é ou não crime.

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