Paulo Coelho
Grandes escritores
Administrador | 22 de outubro de 2016 - 03:22
A seguir, textos adaptados de escritores que marcaram a história da literatura.
Kafka: a porta da lei
Um homem que procura a justiça caminha até
o Palácio da Lei. Diante da porta do palácio, um soldado monta a guarda.
Como o sentinela não lhe dirige uma
palavra, o homem resolve esperar. Espera um dia, mas o guarda continua
mudo.
“Se eu ficar por aqui, ele perceberá que eu
quero entrar” pensa o homem. E ali permanece.
Passam-se dias, semanas, e anos inteiros. O
homem continua diante da porta, e o sentinela continua montando guarda.
As
décadas passam, o homem envelhece, e já não consegue mover-se. Finalmente, quando nota que a morte se
aproxima, reúne suas últimas forças e pergunta ao guarda:
- Eu vim até aqui em busca de justiça. Por
que você não me deixou entrar?
- Eu não lhe deixei? – responde surpreso, o sentinela. - Você nunca me disse o que estava fazendo aí! A porta estava aberta, bastava empurrá-la. Por que você não entrou?
Jorge Luis Borges: o grande mapa
Certo rei encomendou aos geógrafos um mapa
do país. Mas exigiu que tal mapa fosse perfeito, com todos os detalhes.
Os geógrafos mediram todos os locais, e
fizeram um rascunho. Um deles comentou que ainda faltavam detalhes de rios.
Resolveram refazer o desenho numa escala bem
maior. Quando ficou pronto, o mapa estava do tamanho do primeiro andar de um
edifício; mesmo assim, alguns conselheiros do rei argumentaram:
- Não dá para ver os caminhos nos bosques.
E os sábios geógrafos foram desenhando
mapas cada vez maiores, com detalhes e mais detalhes do país.
Quando, finalmente, conseguiram o mapa
perfeito, chamaram o rei e o levaram a um imenso deserto. Ali chegando,
mostraram uma estranha tenda, que se estendia até o horizonte.
- O que é isso?
- O mapa do país – responderam os
geógrafos. – Como quisemos fazê-lo o mais próximo da realidade, ele ficou tão
grande que ocupa o deserto inteiro.
- O medo de errar, na maior parte das
vezes, termina nos conduzindo ao próprio erro – comentou o rei. – O mapa é tão
detalhado, que não serve para nada.
E mandou enforcar os geógrafos.
Machado de Assis: a linha e a agulha
A agulha passa por vários estágios de
sofrimento até aprender sua função: o forno abrasador da metalúrgica, o frio
intenso da água em que é temperada, o peso esmagador da prensa que a faz
atingir sua forma ideal.
A partir daí, precisa estar sempre dura,
brilhante, e afiada. Depois de todo este aprendizado, ela encontra sua razão de
viver: a linha.
E faz o possível para ajudá-la: enfrenta os
tecidos mais resistentes, abre os buracos nos locais certos. Mas, quando
termina seu trabalho, a misteriosa mão da costureira torna a colocá-la em uma
caixa escura; depois de tanto esforço, sua recompensa é a solidão.
Com a linha, entretanto, a história é
diferente: a partir deste momento, passa a ir a todos os bailes e festas.