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Aposentadoria abaixo do salário mínimo com capitalização
Além do sistema de capitalização, a nova proposta vai trazer regras mais duras para o atual sistema previdenciário
Da Redação | 16 de janeiro de 2019 - 00:07
João Badari*
A nova proposta da reforma da Previdência brasileira deverá
ser mais rígida. E a aposentadoria poderá ficar abaixo do salário mínimo, com
as novas regras da capitalização. O atual
ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o novo texto a ser enviado
ao Congresso Nacional em fevereiro vai incluir um regime de capitalização. O
novo modelo prevê que cada pessoa é responsável por acumular sua própria
reserva para a aposentadoria e será válido para quem vai entrar no mercado de
trabalho. Hoje, o regime é de repartição, os mais jovens contribuem para a
aposentadoria das gerações futuras e no qual há um teto para o benefício. Para
quem não conseguir poupar, o governo garantiria uma renda mínima, menor do que
o salário mínimo e maior do que o Bolsa Família.
Este sistema de capitalização é preocupante e utópico, sendo
apenas positivo na doutrina, e não na prática, pois traz prejuízos no curto
prazo, em razão da diminuição das receitas do instituto previdenciário, caindo
sua renda e mantendo as despesas. Em longo prazo, o sistema é ainda pior, como
exemplo citamos o Chile, que adota este sistema e hoje colhe os frutos de suas
primeiras aposentadorias, que não custeiam os gastos do aposentado. Os
trabalhadores chilenos são obrigados a depositar ao menos 10% do salário por,
no mínimo, 20 anos para se aposentar. A idade mínima para mulheres é 60 e, para
homens, 65. Não há contribuições dos empregadores ou do Estado. Agora, quando o
novo modelo começa a produzir os seus primeiros aposentados, o baixo valor das
aposentadorias assustou o governo: 91% recebem menos de 149.435 pesos, ou seja,
metade do salário mínimo do país.
O modelo chileno criou um verdadeiro colapso do sistema
previdenciário no país e tem gerado um arrocho no valor das pensões e
aposentadorias, que se reflete no aumento do número de suicídios. Segundo o
Estudo Estatísticas Vitais, do Ministério de Saúde e do Instituto Nacional de
Estatísticas (INE) do Chile, entre 2010 e 2015, 936 adultos maiores de 70 anos
tiraram sua própria vida no período. O levantamento aponta que os maiores de 80
anos apresentam as maiores taxas de suicídio – 17,7 por cada 100 mil habitantes
– seguido pelos segmentos de 70 a 79 anos, com uma taxa de 15,4, contra uma
taxa média nacional de 10,2. Conforme o Centro de Estudos de Velhice e
Envelhecimento, são índices mórbidos, que crescem ano e ano, e refletem a “mais
alta taxa de suicídios da América Latina”.
Agora, imagine os efeitos danosos que esse sistema poderia
gerar em um país das dimensões do Brasil, com regiões que possuem
características diferentes, com economias e necessidades diferentes. É desumano
pensar que um brasileiro que trabalhará cerca de 50 anos de sua vida terá que
se aposentar com uma renda menor que um salário mínimo. Seria transformar os
idosos numa geração de miseráveis.
Hoje, a grande maioria dos aposentados recebe um salário
mínimo no Brasil, que é insuficiente para pagar os gastos básicos com
alimentação, medicamentos, vestuário, água, luz, entre outros. Plano de saúde é
artigo de luxo, muitos aposentados necessitam de uma ajuda mensal da família
para custear seus gastos. Esse novo sistema de capitalização é desumano.
Além do sistema de capitalização, a nova proposta vai trazer
regras mais duras para o atual sistema previdenciário. Bolsonaro mencionou, por
exemplo, que a idade mínima para a aposentadoria poderia ser de 62 anos para
homens e 57 anos para mulheres. O texto do governo Michel Temer, aprovado em
comissão especial na Câmara, porém, estabelece 65 anos para os homens e 62 para
as mulheres. E a reforma deverá trazer um prazo de transição aos trabalhadores
que já contribuem no atual modelo previdenciário menor do que era pensado pela
equipe de Temer.
Trata-se de mais uma proposta de reforma da Previdência para
o mercado financeiro e não pensando na justiça social.
*João Badari é especialista em Direito Previdenciário e
sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados