Debates
O olhar mais atento da escola
Da Redação | 09 de agosto de 2018 - 01:04
Por Acedriana Vicente Sandi
O suicídio na adolescência e juventude é algo que
assusta familiares e intriga profissionais que lidam com a questãopor
apresentar um paradoxo: o sofrimento extremo, com um fim trágico,
numa fase da vida associada a descobertas e alegrias, não a tristezas e
morte. Tema tabu, sobre o qual se preferia manter silêncio, o suicídio
sempre foi um problema quase invisível diante da sociedade. O crescimento
lento, porém constante nas últimas décadas, dos índices de suicídios entre
jovens está chamando a atenção de todos. O último levantamento
realizado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, com base em
dados do Ministério da Saúde, mostra que, de 2000 a 2015, os suicídios
aumentaram 65% entre indivíduos de 10 a 14 anos e 45% entre os jovens de 15 a
19 anos.
Não podemos considerar natural, nem permanecer
indiferentes e se conformar com esses números. Temos no Brasil três mil
crianças e jovens que se suicidam por ano. O suicídio nessa fase da
vida é normalmente associado a fatores como depressão, abuso de drogas e
álcool, além das chamadas questões interpessoais - violência sexual, abusos,
violência doméstica e bullying. Se levarmos em conta que esses jovens passam
boa parte do tempo na escola, é inevitável concluir que os educadores têm
um papel fundamental no sentido de ajudar a evitar situações extremas como
essas. Um olhar mais atento, um olhar, de fato, pedagógico,
que tenha a intenção de capturar o que passa no coração desses
estudantes, pode ajudá-los a se encontrar - e, quem sabe, consiga contribuir
para salvar uma vida.
No ambiente escolar há uma série de situações de
relacionamentos que podem ser potenciais mutiladores. Às vezes, um olhar mal
interpretado, uma cobrança desproporcional, ou mesmo um gesto de indiferença.
Precisamos estar atentos: uma criança com comportamento extremo que varia de
timidez silenciosa a agressividade gratuita, deve ser acompanhada, vista mais de
perto. É sim dever da escola - de professores e gestores - se
aproximar um pouco mais desses alunos, que muitas vezes estão pedindo
socorro, para dizer a eles que existe alguém naquele universo que se importa
com eles. E aqui, o sentido da palavra importar nos remete ao ato de
trazer para dentro: eu me importo contigo, eu te trago no coração, por isso eu
sou empático com a tua dor eu me compadeço com ela. Ou seja, estamos
sofrendo nós dois juntos com a tua dor, coração com coração. É com esse
tipo de postura - de compaixão - que a escola pode ajudar a
reduzir esses índices tão tristes. Não podemos atuar apenas de
maneira reativa, quando o pior já aconteceu. Devemos lembrar sempre
que adolescentes e jovens são imediatistas. Océrebro, nesta fase da
vida, ainda não está plenamente maduro. O sistema de freios está
em formação e, por isso, são indivíduos que exigem mais atenção.
Além dos fatores já mencionados acima, existem outras
circunstâncias que podem influenciar negativamente um jovem. A alta
competitividade, a cobrança familiar e da sociedade por bom desempenho, o dilema
da escolha da carreira e ainda, um fenômeno mais recente, a incerteza
sobre o futuro. Tudo isso, jogado sobre os ombros de alguém já
fragilizado por outras questões, pode empurrá-lo para um abismo sem
volta. O estudante de hoje vive uma situação inédita quando se
trata de futuro: ele não sabe se a profissão que ele está sendo
obrigado a escolher agora ainda existirá na sua vida adulta. Toda essa
incerteza gera um vácuo entre o que ele é hoje e o que ele
quer ser amanhã. O mundo atual padece de sentido e a gente só se
engaja numa operação de vida quando a gente vê sentido e significado nas
coisas. Quando não enxergamos horizonte na frente, parece que nos
falta o chão - e isso, na adolescência, é ainda mais intenso.
Precisamos, portanto, estar em constante vigilância. Porque situações pequenas
podem ser somadas a outras tantas pequenas - ou nem tão pequenas assim - e
acabam se transformando numa situação limite e impossível de ser
revertida.
Acedriana Vicente Sandi é diretora pedagógica da Editora Positivo.