Debates
“Férias” pneumáticas – parte 2
Da Redação | 20 de junho de 2018 - 03:08
Prof. Antônio Queiroz Barbosa
De outro lado, o trem, além de não pagar pedágio, exige
pouca manutenção, tanto da “estrada” por onde circula quanto dele próprio, o
que não acontece com os caminhões que, além de esbrugarem as rodovias pelo
excesso de peso, circulam em velocidades incompatíveis com trechos perigosos
das estradas, e estão se envolvendo, cada vez mais, em acidentes assassinos,
seja por desrespeito às normas de tráfego, seja pela sua manutenção deficitária
em vista do preço da mesma.
O custo-benefício ferroviário é muito inferior ao
rodoviário. Um trem, numa linha bem feita, pode se compor até de várias dezenas
de vagões, fracionando o custo por quilo/passageiro conduzido, sem contar o
conforto no transporte de pessoas, já que os ônibus, assim como os aviões,
encaixotam seus usuários em espaços cada vez mais restritos. Quanto mais
usuários no mesmo espaço, mais capciosamente têm preços competitivos e/ou
lucram mais.
Um sistema ferroviário pujante não excluiria os caminhões,
mesmo porque os trens, como posto, têm menos mobilidade. Sobrar-lhes-ia a
distribuição urbana e as milhares de áreas cobertas por cidades e lugarejos sem
trilhos. Caminhões e trens podem ser meios de transporte complementares, como
acontece em países da Europa e nos Estados Unidos, por exemplo. Os motoristas teriam
jornadas menos estressantes, com a enorme vantagem de não passarem semanas, até
meses, longe das esposas e filhos, em longas e perigosas jornadas, por estradas
muitas vezes deficitárias.
Não somos contra o transporte rodoviário, apenas não
podemos, cidadãos, concordar com a relegação de um sistema mais eficiente e
menos oneroso em prol dele. Pregamos por governantes ciosos de suas obrigações
para com sua terra e seu povo, que apoiem a malha rodoviária sem, contudo,
postergar o crescimento também da rede ferroviária que, por suas
características específicas, como velocidade e dimensão das composições, não
cobre todo o território de uma nação. Restaria ao transporte mais maleável
muitos caminhos, mais fáceis de conseguir e menos castigantes para os motoristas,
que retirariam a produção de suas origens, entregariam nas ferrovias,
distribuindo-a, a seguir, nos seus destinos.
O que não podemos, como povo, é ficarmos à mercê dos interesses, quiçá legítimos, de apenas uma categoria profissional (caminhoneiros e/ou transportadoras?), ou de parte dela, colocando em xeque toda a rede econômica da pátria, com enormes danos a toda a cadeia produtiva, negocial e de serviços, além de transtornar a vida de todos os demais cidadãos que, como ocorre na maioria das greves, ficam submissos ao querer egoísta de verdadeiros déspotas, baderneiros e danosos, já que cerceiam um dos direitos básicos de todos os cidadãos, tal seja a liberdade de ir e vir. Resumindo, nas palavras de Dalmo R. V. Marques, “Getúlio Vargas puxou o tapete, JK empurrou para o buraco e os militares assistiram de braços cruzados o desmonte das ferrovias.” FHC pegou o barco soçobrando e suas preocupações prementes só poderiam ser a de salvar, em primeiro lugar, a economia do país. Hoje, há algumas ferrovias sendo implantadas pelos interiores de nossa ferida terra. Do apartamento onde assisto, ouço, pelas escuridões da noite ou pelos alvores do amanhecer, os telectecs das rodas nos trilhos, mesclados aos longos, tristonhos e saudosos apitos de raras locomotivas resfolegando à frente de dezenas de vagões, arrastando mercadorias de diversos teores. As pessoas, ficamos apenas na saudade...
Antônio Queiroz Barbosa é professor aposentado e colaborador do Jornal da Manhã